Ricardo Lacerda
A retração na aquisição de importados tem
sido expressiva e não vem se dando apenas por conta da recessão interna. O
processo de substituição de bens e serviços importados pela produção interna já
se encontra em pleno andamento e deverá se acentuar nos próximos meses, movido
pelo encarecimento dos itens importados em relação aos produzidos internamente.
A substituição pela produção doméstica se dá tanto nos bens e serviços
adquiridos pelas empresas, quanto nos que são consumidos pelas famílias.
Essa troca de importados pela produção doméstica
não vem acontecendo em um ritmo ainda mais intenso por conta da destruição de
capacidade produtiva interna decorrente do longo período em que o real
permaneceu artificialmente valorizado.
Tanto nos anos noventa (notadamente entre
1994 e 1998) como na maior parte dos últimos quinze anos, a política cambial brasileira
favoreceu o consumo e penalizou a produção interna, principalmente as
atividades industriais mas atingiu também algumas atividades do setor de
serviços como aquelas que integram a cadeia do turismo. Se a ascensão da
chamada Classe C propiciou nos últimos dez anos a incorporação de milhões de
pessoas ao mercado turístico interno, a valorização da nossa moeda tornou o Brasil
um destino muito caro para os estrangeiros e subsidiou as viagens
internacionais das classes A e B e até de uma pequena fração da Classe C.
A intensa depreciação de nossa moeda desde o
final de 2014 causou mudanças acentuadas nos preços relativos da economia
brasileira, dessa vez em favor da produção interna e, como não poderia deixar
de ser, em desfavor não apenas da importação como do consumo em geral, pelo
menos no período de transição, quando o poder de compra interno se contrai.
Câmbio
Na comparação entre o trimestre completado em
janeiro de 2016 e o finalizado em janeiro de 2015, a paridade do real frente à
cesta relevante de moedas depreciou-se 30%, já descontada a inflação do período
medida pelo IPCA. Se os valores forem descontados por um índice de preços de
atacado de bens e serviços ofertados no mercado interno, como o IPA-DI, a perda
de valor do real frente à cesta de moedas é de 20%.
Isso significa, grosso modo, que os bens e serviços
produzidos no país, ou pelo menos as etapas realizadas internamente da produção
desses bens e serviços, na média, tornaram-se cerca de 20% mais baratos quando
vendidos para o mercado exterior. Em outras palavras, os bens e serviços
brasileiros comercializados no mercado externos tornaram-se mais competitivo
nesse percentual e provavelmente mais do que isso quando vendidos no mercado
brasileiro.
Substituindo importados
Infelizmente, os últimos resultados
publicados do coeficiente de penetração de importações da indústria
(CNI-FUNCEX) referem-se ao terceiro trimestre de 2015, não captando o movimento
mais
recente. Ainda assim, o índicador na série a preços constantes já refletia
uma inversão tendência desde o segundo trimestre de 2015, quando começou a cair
a participação dos produtos importados no mercado interno, no acumulado em
quatro trimestres.
O gráfico a seguir apresenta as evoluções das
quantidades físicas das importações de manufaturados e segundo categorias de
uso e da produção física da indústria segundo categoria de uso, na comparação
entre o trimestre nov2014-jan2015 e trimestre nov2015- jan2016. Há importante
limitações nessa comparação, é importante que seja alertado. Entre outras
coisas porque as categorias não são equivalentes e as metodologias de
ponderação dos setores são distintas. Ainda assim, é possível inferir algumas
tendências interessantes.
As importações de produtos industrializados,
medidas em toneladas, recuaram 30,6% entre o trimestre encerrado em janeiro de
2016 e o trimestre de janeiro de 2015, enquanto a produção física da indústria
geral caiu 12,8%, indicando que a produção interna ocupou espaço dos importados.
As importações de bens duráveis recuaram 44,3% nessa comparação, enquanto a produção
industrial interna desses bens apresentou queda também muito expressiva, mas
bem menor (22,7%). As importações de bens intermediários recuaram 22,5%,
enquanto a produção interna caiu 11,3%. No caso dos bens de capital, as
retrações nas importações e na produção são mais aproximadas.
É importante assinalar, também, que a aceleração
da queda no volume físico das importações tem se dado em ritmo bem mais
acentuado do que na retração da produção, embora esta também tenha sido
importante. Assim, a taxa de recuo na importações de duráveis no trimestre encerrado
em janeiro de 2016, em relação ao mesmo trimestre do ano anterior, multiplicou
por cinco, enquanto a taxa da queda da produção física não chegou a dobrar.
Há indícios relativamente consistentes de que
um importante processo de substituição de importações está em curso na economia
brasileira, favorecendo um grande número de atividades industriais. É razoável
esperar que esse movimento em direção à aquisição de parcelas crescentes de
bens (e de alguns serviços) no mercado interno deverá se acentuar nos próximos
meses, devendo fechar o ano de 2016 com um perfil bem distinto do que
apresentou em 2015.
Fonte: PIM-IBGE para a produção industrial e
SECEX-MDIC para as importações.
Publicado no Jornal da Cidade, em 20/03/2016
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