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Praça São Francisco, São Cristovão-SE. Patrimônio da Humanidade

segunda-feira, 21 de março de 2016

Câmbio e substituição de importações


Ricardo Lacerda

A retração na aquisição de importados tem sido expressiva e não vem se dando apenas por conta da recessão interna. O processo de substituição de bens e serviços importados pela produção interna já se encontra em pleno andamento e deverá se acentuar nos próximos meses, movido pelo encarecimento dos itens importados em relação aos produzidos internamente. A substituição pela produção doméstica se dá tanto nos bens e serviços adquiridos pelas empresas, quanto nos que são consumidos pelas famílias.
Essa troca de importados pela produção doméstica não vem acontecendo em um ritmo ainda mais intenso por conta da destruição de capacidade produtiva interna decorrente do longo período em que o real permaneceu artificialmente valorizado.
Tanto nos anos noventa (notadamente entre 1994 e 1998) como na maior parte dos últimos quinze anos, a política cambial brasileira favoreceu o consumo e penalizou a produção interna, principalmente as atividades industriais mas atingiu também algumas atividades do setor de serviços como aquelas que integram a cadeia do turismo. Se a ascensão da chamada Classe C propiciou nos últimos dez anos a incorporação de milhões de pessoas ao mercado turístico interno, a valorização da nossa moeda tornou o Brasil um destino muito caro para os estrangeiros e subsidiou as viagens internacionais das classes A e B e até de uma pequena fração da Classe C.
A intensa depreciação de nossa moeda desde o final de 2014 causou mudanças acentuadas nos preços relativos da economia brasileira, dessa vez em favor da produção interna e, como não poderia deixar de ser, em desfavor não apenas da importação como do consumo em geral, pelo menos no período de transição, quando o poder de compra interno se contrai.
Câmbio
Na comparação entre o trimestre completado em janeiro de 2016 e o finalizado em janeiro de 2015, a paridade do real frente à cesta relevante de moedas depreciou-se 30%, já descontada a inflação do período medida pelo IPCA. Se os valores forem descontados por um índice de preços de atacado de bens e serviços ofertados no mercado interno, como o IPA-DI, a perda de valor do real frente à cesta de moedas é de 20%.
Isso significa, grosso modo, que os bens e serviços produzidos no país, ou pelo menos as etapas realizadas internamente da produção desses bens e serviços, na média, tornaram-se cerca de 20% mais baratos quando vendidos para o mercado exterior. Em outras palavras, os bens e serviços brasileiros comercializados no mercado externos tornaram-se mais competitivo nesse percentual e provavelmente mais do que isso quando vendidos no mercado brasileiro.


Substituindo importados

Infelizmente, os últimos resultados publicados do coeficiente de penetração de importações da indústria (CNI-FUNCEX) referem-se ao terceiro trimestre de 2015, não captando o movimento mais 
recente. Ainda assim, o índicador na série a preços constantes já refletia uma inversão tendência desde o segundo trimestre de 2015, quando começou a cair a participação dos produtos importados no mercado interno, no acumulado em quatro trimestres.  
O gráfico a seguir apresenta as evoluções das quantidades físicas das importações de manufaturados e segundo categorias de uso e da produção física da indústria segundo categoria de uso, na comparação entre o trimestre nov2014-jan2015 e trimestre nov2015- jan2016. Há importante limitações nessa comparação, é importante que seja alertado. Entre outras coisas porque as categorias não são equivalentes e as metodologias de ponderação dos setores são distintas. Ainda assim, é possível inferir algumas tendências interessantes.
As importações de produtos industrializados, medidas em toneladas, recuaram 30,6% entre o trimestre encerrado em janeiro de 2016 e o trimestre de janeiro de 2015, enquanto a produção física da indústria geral caiu 12,8%, indicando que a produção interna ocupou espaço dos importados. As importações de bens duráveis recuaram 44,3% nessa comparação, enquanto a produção industrial interna desses bens apresentou queda também muito expressiva, mas bem menor (22,7%). As importações de bens intermediários recuaram 22,5%, enquanto a produção interna caiu 11,3%. No caso dos bens de capital, as retrações nas importações e na produção são mais aproximadas.
É importante assinalar, também, que a aceleração da queda no volume físico das importações tem se dado em ritmo bem mais acentuado do que na retração da produção, embora esta também tenha sido importante. Assim, a taxa de recuo na importações de duráveis no trimestre encerrado em janeiro de 2016, em relação ao mesmo trimestre do ano anterior, multiplicou por cinco, enquanto a taxa da queda da produção física não chegou a dobrar.
Há indícios relativamente consistentes de que um importante processo de substituição de importações está em curso na economia brasileira, favorecendo um grande número de atividades industriais. É razoável esperar que esse movimento em direção à aquisição de parcelas crescentes de bens (e de alguns serviços) no mercado interno deverá se acentuar nos próximos meses, devendo fechar o ano de 2016 com um perfil bem distinto do que apresentou em 2015.


Fonte: PIM-IBGE para a produção industrial e SECEX-MDIC para as importações.



Publicado no Jornal da Cidade, em 20/03/2016

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