Praça São Francisco, São Cristovão- SE

Praça São Francisco, São Cristovão- SE
Praça São Francisco, São Cristovão-SE. Patrimônio da Humanidade

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Mercado de trabalho entra 2019 em desaceleração


Ricardo Lacerda

O mercado de trabalho brasileiro vem desacelerando a geração de novas ocupações ao longo dos últimos trimestres. Depois de encerrar o ano de 2017 com as ocupações totais registrando crescimento de 2,05%, o último trimestre de 2018 mostrou incremento de apenas 0,97% nas ocupações totais, sempre na comparação com o mesmo período do ano anterior.
Em termos absolutos, foram criadas 1,89 milhão de novas ocupações na comparação entre os últimos trimestres de 2016 e 2017, e 890 mil novas ocupações na comparação dos mesmos períodos entre 2017 e 2018, menos da metade.
O fato é que em todos os principais tipos de inserção no mercado de trabalho os resultados mais recentes vêm apresentando melhorias mais lentamente do que há um ano atrás, refletindo a desaceleração no ritmo de crescimento econômico. A grande interrogação é se as fortes elevações dos índices de confiança nos últimos meses terão ou não o condão de estimular a retomada do crescimento econômico e, assim, impulsionar a criação de empregos em 2019.
Precarização
Após sete semestres subsequentes de crescimento do PIB, a taxa de desocupação na economia brasileira se mantém muito elevada. No trimestre móvel outubro-dezembro de 2018 a taxa de desocupação se situou em 11,6%, apenas 0,2 pontos percentuais abaixo do resultado do mesmo período do ano anterior. Em relação a quatro anos antes, trimestre outubro-dezembro de 2014, a taxa mais recente se posicionou 5,1 pontos percentuais acima (ver Gráfico 1).

Além da lentidão na queda da taxa de desocupação, chama a atenção a qualidade ruim das novas inserções no mercado de trabalho. O emprego formal no setor privado continuou declinando em 2018, registrando retração de novas 324 mil ocupações com carteira de trabalho. As novas ocupações, por sua vez, revelam inserções precárias: em 2018, a ocupação por conta própria respondeu por quase 50% do total criado e quase 1/3 das novas ocupações correspondem a empregos sem carteira assinada no setor privado.
Em termos de grupamentos de atividades no trabalho principal, chama a atenção a concentração das ocupações criadas nos segmentos de serviços sociais e outros serviços. Permanece grave a situação da ocupação na construção civil, que ainda não estabilizou o contingente de trabalhadores empregados; o setor vem apresentando sucessivas quedas na série que compara com mesmo período do ano anterior desde o trimestre móvel junho-agosto de 2016.



Fonte: IBGE, PNADC

Desaceleração

Além dos fatos relatados acima, relativamente bem conhecidos pelo público, há um dado novo e preocupante: a desaceleração na geração de novas ocupações nos últimos trimestres entre as ocupações consideradas mais precárias.
O Gráfico 2 apresenta as taxas de crescimento da ocupação total e do número de pessoas nos tipos de ocupações de maior de peso no mercado de trabalho, na comparação com iguais trimestres móveis do ano anterior. Observando-se a ocupação total indica-se que depois de crescerem 2,05% no último trimestre móvel de 2017, em relação a igual período de 2016, no trimestre móvel janeiro-março de 2018 essa taxa recuou para 1,84%; no segundo trimestre móvel (abril-junho de 2018), refletindo os efeitos da paralisação dos caminhoneiros, a taxa recuou ainda mais célere, para 1,11%. Na segunda metade do ano, apesar de alguma retomada no incremento na geração de ocupação no trimestre julho-setembro, a linha de tendência é claramente declinante, registrando-se nova forte desaceleração no último trimestre móvel de 2018.
Observando-se as evoluções dos principais tipos de ocupação, contata-se que a desaceleração foi generalizada entre os vínculos precários que vinham sustentando a retomada da ocupação, enquanto a ocupação formal no setor privado não mostrou sinal de animação maior, continuando a apresentar quedas sucessivas e ainda expressivas no número de pessoas ocupadas.
Assim, os empregos sem carteira de trabalho assinada que finalizaram o ano de 2017 apresentando taxa de crescimento de 5,69%, no último trimestre de 2018 registraram incremento de 3,84%; a taxa de crescimento dos empregadores, que cresceu 6,34% no final de 2017, no último trimestre de 2018 revelava forte desaceleração para 2,79%. Mesmo as ocupações por conta própria, último reduto de sobrevivência das famílias empobrecidas pela crise, já não cresciam em 2018 na mesma intensidade de 2017.
A desaceleração da retomada do mercado de trabalho a partir do segundo trimestre de 2018 pode ser atribuída, no primeiro momento, à paralisação dos caminhoneiros e, no segundo semestre, à instabilidade política interna e à piora relativa do cenário internacional. A expectativa para 2019 é de certa retomada no ritmo na geração de ocupações, apesar de todas as incertezas reinantes. 


Fonte: IBGE, PNADC

Publicado no Jornal da Cidade, em 03 de fevereiro de 2019

quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

Nuvens no cenário externo


Ricardo Lacerda
Depois de um período, entre 2017 e parte de 2018, de aceleração e de sincronização de crescimento entre as maiores economias mundiais, o ano de 2018 se encerrou com moderação e assincronia no ritmo de crescimento entre os países líderes, limitando a retomada da atividade econômica nos mercados emergentes e países em desenvolvimento. 
Em 2019, China, Estados Unidos e Zona Europeia deverão registrar reduções na taxa de incremento do PIB, enquanto o Japão deverá manter o desempenho já rebaixado de 2018. A moderação no crescimento nas grandes economias, as novas rodadas de elevação nos juros básicos nos Estados Unidos e o recrudescimento das disputas comerciais são as principais ameaças à retomada do crescimento das economias em desenvolvimento, notadamente entre aquelas exportadoras de commodities, como são os casos dos países latino-americanos.
Exportadores de commodities
A edição de janeiro de 2019 do relatório Perspectivas Econômicas Globais, do Banco Mundial, aponta o aparecimento de horizonte nublado no cenário econômico em 2019, como resultado da combinação de certa moderação no ritmo de crescimento e condições financeiras menos favoráveis no cenário internacional. Os riscos afetariam especialmente Mercados Emergentes e Economias em Desenvolvimento (EMDEs, na sigla em inglês).
Alguns dos principais EMDEs já estariam se ressentindo de substanciais pressões do mercado financeiro, como são os casos da Argentina e da Turquia. A situação externa menos favorável vem afetando o crescimento dessas economias, retirando impulso na retomada do crescimento dos países exportadores de commodities, enquanto as economias emergentes importadoras desses bens apresentam desaceleração nos seus ritmos de crescimento. O relatório do Banco Mundial é seco nas suas conclusões sobre as perspectivas da economia mundial: o céu está escurecendo e a retomada dos Mercados Emergentes e das Economias em Desenvolvimento simplesmente parou.
O PIB argentino, depois de crescer 2,9%, em 2017, deve ter recuado 2,8%, em 2018, e, em 2019, deverá apresentar nova forte retração, projetada em 1,7%. No caso do Brasil, o relatório reviu para metade a projeção feita no meio do ano, de crescimento de 2,4% para 2018; a nova estimativa de crescimento para 2018 é de 1,2%, adição de apenas de 0,1 ponto percentual em relação ao PIB de 2017 (Ver Quadro).

Quadro. Taxa de crescimento do Produto Interno Bruto no Mundo e algumas áreas selecionadas, 2016-2020 (%)
Áreas
2016
2017
2018
2019
2020
Mundo
2,4
3,1
3
2,9
2,8
Economias Avançadas
1,7
2,3
2,2
2
1,6
EUA
1,6
2,3
2,9
2,5
1,7
Zona do Euro
1,9
2,4
1,9
1,6
1,5
Japão
0,6
1,9
0,8
0,9
0,7
China
6,7
6,9
5,8
5,5
5,6
América Latina e Caribe
-1,5
0,8
0,6
1,7
2,4
Brasil
-3,3
1,1
1,2
2,2
2,4
Argentina
-1,8
2,9
-2,8
-1,7
2,7
Índia
7,1
6,7
7,3
7,5
7,5
Fonte: Banco Mundial, GEP janeiro de 2019
Ameaças
Dois tipos de ameaças podem ter maiores impactos sobre as economias dos países em desenvolvimento: o acirramento e a difusão das disputas comerciais e o fim do impulso causado pelo miniciclo de valorização das commodities, sem que os EMDEs tenham aproveitado o período favorável para sanear a situação fiscal de suas economias e realizarem esforços para torná-las mais competitivas. A desaceleração no crescimento de algumas maiores economias do mundo, em especial da China, já se reflete nos preços das commodities, fechando uma janela de oportunidade para os EMDEs. Em outras palavras, a moderação no crescimento global restringe a retomada no crescimento desses países.
O relatório destaca que o aperto mais acentuado do que esperado anteriormente nas condições de financiamento poderá impactar desfavoravelmente a atividade econômica dos EMDEs e assinala que a escalada das tensões comerciais é outra grande ameaça para a perspectiva global. Os gráficos 1 e 2 apresentam a evolução do PIB de algumas das principais economias entre 2016 e 2018 e as projeções do Banco Mundial para 2019 e 2020.



Fonte: Banco Mundial, GEP janeiro de 2019



Fonte: Banco Mundial, GEP janeiro de 2019



Publicado no Jornal da Cidade, em 20/01/2019

segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

2019: condicionantes e possibilidades



Ricardo Lacerda

Levantamento recente do Instituto Datafolha estimou que 65% dos brasileiros estão otimistas em relação ao governo Bolsonaro, entre aqueles que acreditam que o governo iniciado no dia 1º de janeiro deverá ser bom ou ótimo.

O clima otimista que se instalou pós-eleição não é suficiente para mascarar o estado anêmico em que se encontra a economia brasileira.  Não devemos nos iludir; viemos de um ano duro e 2019, ainda que deva apresentar alguma melhoria em relação ao ano anterior, deverá apresentar resultados limitados no que se refere a finanças públicas, geração de emprego e elevação da renda dos brasileiros. E são esses os indicadores que, ao fim e ao cabo, de fato interessam no momento em que o empobrecimento da população e a crise nas políticas públicas são os sentimentos predominantes: repetindo, melhoria nas finanças públicas, geração de emprego e elevação de renda.  

Letargia

A verdade é que em 2018 o ritmo de retomada do nível de atividade da economia brasileira desacelerou intensamente, revelando o grau de dificuldade de darmos partida a um novo de ciclo de crescimento vigoroso que permita a elevação expressiva da renda e do emprego. Enquanto entre 2016 e 2017 saímos de uma retração de 3,3% do PIB para um incremento de 1,1%, registrando, portanto, um ganho de 4,4 pontos percentuais no ritmo de crescimento, entre esse último ano e 2018 o PIB agregou apenas 0,3 pp na taxa de incremento, para se situar em torno de 1,4%, se tanto (ver Gráfico). Ou seja, quando consideramos o ritmo de retomada da economia depois da recessão, andamos de lado ao longo de 2018. É pouco, muito pouco diante da devastação econômica e social dos últimos anos.

Cabe não esquecer que iniciamos o ano de 2018 com a expectativa de que o PIB apresentaria incremento de 2,7%, taxa que, se não é espetacular, indicaria possibilidades de retomada substantiva do crescimento econômico.

Muito do que se apresenta hoje como indicadores econômicos favoráveis, como a inflação comportada, juros básicos rebaixados e o saldo favorável da balança comercial, são na verdade reflexos irrefutáveis de como a economia brasileira permanece letárgica. Adicione-se que a recuperação anêmica do nível de atividade tem sido muito desigual em termos regionais: enquanto o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-BR) apresentou incremento de 1,4%, na comparação entre os dez primeiros meses de 2018 e o mesmo período de 2017, no caso da região Nordeste o crescimento do Índice de Atividade Econômica Regional (IBC-R) no período se limitou a 0,2%.



Perspectivas

Os dados duros a respeito da atividade econômica em 2018 não escondem o fato de que o crescimento do PIB deverá acelerar em 2019. As projeções podem variar entre 2,4%, do Relatório de Inflação do Banco Central, de dezembro de 2018, até 2,8%, de instituições financeiras mais otimistas. Sabemos, todavia, que, nos últimos anos, as expectativas formuladas de recuperação mais vigorosa têm se revelado seguidamente frustradas, por fatores de diversas naturezas.

A principal força que deverá impulsionar o crescimento do PIB em 2019, pouco se fala disso, tem um caráter quase que “automático”, no sentido de que desde o 1º trimestre de 2017 a economia superou a etapa declinante do ciclo econômico e iniciou a de retomada e, ainda que a recuperação venha se revelando muito vacilante, os mecanismos cíclicos da atividade econômica devem continuar impulsionando alguma aceleração de crescimento.

A melhoria da confiança empresarial, em vários segmentos econômicos, e das famílias, associada ao resultado eleitoral e às expectativas em relação à implementação das reformas prometidas, pode sim constituir fator favorável à aceleração do crescimento, mas o impacto, a duração e os desdobramentos que terá são muito incertos e seus efeitos devem ser cotejados com as limitações e as incertezas persistentes, no cenário interno e no quadro internacional.

O ponto central, determinante para a intensidade da retomada do crescimento, é que não estão claras as forças de demanda que o impulsionarão em 2019 e anos seguintes. Por mais que os fatores relacionados à melhoria da confiança dos chamados agentes econômicos (empresas e famílias) possam atuar favoravelmente persistem fortes restrições ao incremento dos gastos empresariais e do consumo das famílias, sem falar nas limitações fiscais e legais para a expansão dos gastos públicos.

A situação do mercado de trabalho é ainda muito precária e o grau de endividamento das famílias permanece muito elevado para se contar com uma retomada firme da demanda por consumo, enquanto o grau de endividamento das empresas, a elevada ociosidade de recursos nos diversos segmentos produtivos e, sobretudo, a falta de um equacionamento para a crise da construção civil, não autorizam expectativas muito otimistas para a retomada dos investimentos.

 Publicado no Jornal da Cidade em 06/01/2019