Ricardo Lacerda de Melo
O ano de 2020 foi guiado
pelos impactos da pandemia do Covid-19 sobre a produção e circulação de bens e
serviços e pelas respostas dos governos nacionais a fim de atenuar os efeitos
de desestruturação econômica e social causada pela disseminação do vírus entre
a população global. A Organização Mundial de Saúde reconheceu em 11 março de
2020 a situação de pandemia da doença do Covid- 19. Até o início do dia 25 de fevereiro
de 2021, a instituição registrava 111.999.954 casos confirmados de pessoas
infectadas pelo vírus da covid-19, com 2.486.679 mortes, distribuídas por todos
os continentes.
O Brasil é o terceiro
país em número de pessoas com casos confirmados, 10.257.875, abaixo apenas dos
EUA e da Índia, mas até a 1ª quinzena de abril o número de casos confirmados no
nosso país deverá superar o do Índia, galgando a 2ª posição. Haviam sido
registradas no Brasil, até aquela data, 248.529 pessoas mortas pelo Covid-19,
número inferior apenas às 499.019 pessoas mortas nos EUA. Desde o início de
novembro de 2020, a doença enfrenta uma segunda onda de contaminação no país,
voltando a se expandir em ritmo acelerado em parte expressiva do território
nacional, atingindo média semanal superior a mil casos diários em meados de
fevereiro, sem perspectivas de refluir.
Nos países centrais, a
vacinação ampla contra a doença do Covid-19 ganhou impulso a partir do final de
2020, mas não deverá lograr a imunização de parcela significativa da população
mundial antes do segundo semestre de 2021. A consequência desse fato é que os
impactos da pandemia continuarão marcando a evolução da economia em escala
global ao longo do corrente ano e, possivelmente, do ano de 2022. No Brasil, o início da vacinação foi
postergado para o mês de janeiro de 2021, com o agravante de que a o ritmo de
vacinação se mantém muito insatisfatório, por conta da falta de uma política
clara de aquisição dos insumos no exterior, que persiste até o momento. Salta
aos olhos a descoordenação que impera na implementação do programa de
vacinação.
Impactos econômicos e
sociais
Os impactos econômicos e
sociais da pandemia têm sido terríveis. Em meados de dezembro de 2020, o
balanço preliminar da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL),
órgão integrante das Nações Unidas, estimou contração média de 7,7% do PIB do
subcontinente latino-americano em 2020, queda sem paralelo desde que as
estatísticas começaram a ser registradas. Para aquela instituição, o
encerramento temporário de muitas atividades e a perda de rendimentos das
pessoas provocaram uma contração acentuada do nível de ocupação em todos os
países da região. Em uma estimativa para o segundo trimestre de 2020,
abrangendo catorze países da América Latina e Caribe, a Organização Internacional
do Trabalho (OIT) indicou queda de 10 pontos percentuais na taxa de ocupação,
na comparação com igual período do 2019, correspondentes a uma perda de 47
milhões de postos de trabalho.
No início de janeiro de
2021, o relatório Panorama Econômico Mundial, do Banco Mundial, estimou em 6,9%
a retração do PIB na América Latina e Caribe e projetou para 2021uma retomada
parcial do crescimento na região, com elevação de 3,7% no seu PIB.
O Relatório de Inflação
do Banco Central do Brasil assinalou no início de dezembro que a recuperação da
economia mundial dependerá principalmente da evolução do Covid-19. O relatório
alerta que a ressurgência da pandemia entre algumas das principais economias
mundiais poderia interromper ou mesmo reverter, por algum tempo, a recuperação
parcial do nível da atividade econômica mundial registrada no terceiro
trimestre de 2020, o que veio a se confirmar no início de 2021.
As políticas
contracíclicas
As respostas dadas pelos
governos nacionais para atenuar os impactos da pandemia sobre a ocupação e os
rendimentos das famílias, e assim se contraporem à espiral descendente do poder
de compra, assumiram grandes proporções. As medidas implementadas envolveram um
leque variado de instrumentos, contemplando políticas monetárias agressivas de
adoção de taxas de juros negativas, montantes inéditos de transferência de
renda para as famílias que, de uma hora para outra, perderam suas fontes de
ganhos e políticas creditícias e de suplementação de salários dos empregados
para as empresas em dificuldades, configurando uma das mais abrangentes
experiências históricas de políticas anticíclicas e de caráter humanitário.
No Brasil, as medidas
contracíclicas alcançaram grande monta, abrangendo, além dos instrumentos
citados acima, volumosas transferências federais para os entes subnacionais
(estados e municípios), a fim de compensar as abruptas perdas na arrecadação,
sem as quais os serviços públicos mantidos por essas esferas de governo teriam
entrado em colapso.
Indefinição angustiante
Os governos dos países
centrais e as agências multilaterais de desenvolvimento têm expressado
enfaticamente a necessidade da continuidade dos estímulos de renda, tanto do
ponto de vista humanitário, quanto do ponto de vista da retomada da economia. O
recém empossado presidente Biden, dos EUA, anunciou um robusto pacote de
estímulo que deve alcançar entre US$ 1,4 e US$ 1,9 trilhão.
O Brasil inicia o ano de
2021 em um ambiente de profunda incerteza, diante do encerramento do período
estipulado para a vigência dos diversos programas contracíclicos. Com mais de
50 dias de interregno, o governo federal ainda não foi capaz de aprovar um
programa robusto de amparo à população desassistida e que venha se contrapor ao
refluxo da demanda. Apegadas a uma retórica de austeridade desconectada com a
gravidade da situação econômica e social, as autoridades econômicas retardam a
definição das novas medidas de socorro à população sem renda, que venham suprir
o vazio de políticas que vige desde o final do ano passado. É importante
destacar que, depois da modesta retomada verificada no 3º trimestre de 2020,
graças ao vigor dos estímulos concedidos, a economia brasileira já vem perdendo
fôlego nos últimos meses.
O citado Relatório da
Inflação, do Banco Central constatava em dezembro que as perspectivas sobre o
ritmo de crescimento da economia brasileira continuavam muito incertas, diante
da redução do volume de transferências de rendas para as famílias (auxílios
emergenciais) já nos últimos meses de 2020.
Para 2021, reina a
indefinição e as medidas atualmente em discussão são completamente
insuficientes. Do ponto de vista social, a proposta do novo auxílio emergencial
encaminhada ao congresso nacional, em quatro parcelas de R$ 250, não atende
minimamente as necessidades de sobrevivência das famílias empobrecidas pela
pandemia e chega a ser inexpressiva do ponto de vista de impulso da demanda. Ao
fim e ao cabo, famílias empobrecidas, empresas fragilizadas e entes
subnacionais iniciam o ano de 2021 sem perspectivas definidas em relação ao
futuro imediato.
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