Praça São Francisco, São Cristovão- SE

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Praça São Francisco, São Cristovão-SE. Patrimônio da Humanidade

segunda-feira, 18 de abril de 2016

A gestão da economia sob um governo sitiado

Publicado em 17 de abril de 2016


Ricardo Lacerda
Vivemos tempos extraordinários. Desde as mobilizações de rua de junho de 2013, o Brasil experimenta um processo de ebulição social que vai exigir o transcorrer de muito tempo para ser compreendido em sua inteireza. Muito mais insondáveis são os desdobramentos da crise atual em termos de desenvolvimento econômico e social em um horizonte de 20 ou 30 anos.
Já foi dito que a história é escrita pelos vencedores mas é impossível antecipar qual vai ser a narrativa predominante nas décadas de 2030 e 2040 sobre a crise atual.
Escrevo no calor dos acontecimentos, mais com o intuito de fazer um registro para a posteridade do que com a pretensão de interferir no debate corrente sobre as causas da crise econômica que paralisa o crescimento e joga o país em uma conflagração entre blocos de poder das mais acirradas do seu período republicano. Não tenho a veleidade de estar certo e de que outros estão errados. Faço meramente um registro de minha percepção sobre a crise atual.
O cerco político
A votação do impedimento da presidente Dilma Rousseff pela câmara federal no dia de hoje culmina o sítio que foi formado em torno ao seu governo desde o dia seguinte à eleição para o segundo mandato em outubro de 2014. O agravamento da crise econômica deu o lastro para a disseminação da insatisfação popular.
A questão que se coloca é como a situação política e o quadro econômico foram se deteriorando, em um processo de alimentação mútua, até chegar ao cenário do dia de hoje.
Diria que há duas ordens de questões, uma decorrente da insatisfação gerada pela crise econômica que se estende e outra atinente ao ressentimento que foi se acumulando em segmentos sociais tradicionalmente privilegiados como reação às massivas políticas de inclusão social adotadas pelo bloco político liderado pelo Partido dos Trabalhadores.
Irresignados com o resultado das eleições de 2014, muitos segmentos do empresariado, da classe política, do sistema judiciário e a totalidade da grande mídia, formaram um bloco de ataque ao poder que não deu trégua um só dia, desde antes mesmo de a Presidente tomar posse do seu segundo mandato consagrado pelas urnas.
O cerco formado no parlamento impediu na prática a gestão da economia. Além de não colocar em votação as medidas de ajuste necessárias à retomada da confiança em relação à gestão fiscal, o parlamento acenava a todo momento com a adoção de medidas de uma “pauta bomba”, e outras manobras, com o propósito explícito de erodir a já reduzida capacidade do poder executivo de governar.
Nas semanas mais recentes, a atuação de setores do sistema judiciário atingiu as raias do deboche, com a interdição da possibilidade de uma presidente legitimamente constituída nomear seu ministro da justiça. Frente a um cerco dessa força e abrangência, o governo restou sitiado, sem recursos políticos para se contrapor à maré montante de insatisfação instigada pela mídia, em que escândalos de corrupção eram seletivamente vazados com o claro intuito de atingí-lo.    
Foram desferidos pelo bloco de poder antagônico ataques impensáveis, incompatíveis com o regime democrático e o estado de direito, até o ponto de serem instaladas “escutas oficiais” nas dependências do gabinete presidencial. Nessa quadra, as forças de oposição, apesar de derrotadas nas urnas, estavam prontas para a tentativa do assalto final ao poder. Para tanto, recorreram a artifícios para dar ares de legalidade à derrubada do governo.
Os desequilíbros econômicos
A resposta expansionista da política econômica interna, após a crise financeira internacional atingir fortemente os países emergentes a partir de 2013, acionou uma série de desequilíbrios macroeconômicos, dentre os quais, aqueles de mais graves consequências foram a deterioração da situação fiscal e a fragilização do balanço de pagamentos.
O maior equívoco da gestão da economia, em sua ânsia de amortecer os efeitos recessivos, foi não dar transparência aos desequilíbrios que foram se formando, inclusive pela adoção de uma série de mecanismos ad hoc de estímulos setoriais que concorreram para a fragilização da situação fiscal.
As medidas de ajustes, postergadas para 2015, agudizaram a insatisfação popular na medida que corroeram o poder de compra e atingiram fortemente o mercado de trabalho, enquanto a situação fiscal se agravou muito com a queda da arrecadação.
Por mais graves que tenham sido os descontroles, a crise econômica per si não teria sido causa suficiente para inviabilizar a reorganização das finanças e promover uma retomada moderada do crescimento, não fosse a acelerada deterioração do quadro político. Relativamente ao cenário de 1999, a situação estritamente econômica no início de 2015 poderia ser enfrentada com sacrifícios infinitamente menores, não fosse o ataque sistemático do bloco de oposição, que recorrentemente fez uso de instrumentos inaceitáveis em um regime democrático.
Foi o cerco político que progressivamente asfixiou a capacidade do governo gerir a economia.
Perspectivas
Seja qual for o desfecho do processo impedimento da Presidente, não vai ser fácil reverter a realimentação mútua entre a crise política e a deterioração do quadro econômico. O fosso que foi aberto na sociedade e o esgarçamento do aparato institucional apontam para um cenário ainda nebuloso de como reconstruir a confiança nas instituições.
A construção de uma nação solidária exige, é fato, responsabilidade na condução de assuntos de natureza fiscal. Tampouco prescinde da observação do princípio da soberania popular.


Fonte: Divulgação/Portal Planalto


 Publicado no Jornal da Cidade, em 17/04/2016

segunda-feira, 11 de abril de 2016

De onde virá o ajuste?

Ricardo Lacerda
Depois de uma retração de 3,8% em 2015, o nível de atividade da economia brasileira deverá enfrentar queda de tamanho similar em 2016. No acumulado dos dois anos, o PIB terá caído 7,7% e o PIB per capita se apresentará algo em torno de 10% menor.
O corte no emprego formal atingiu 1,5 milhão de trabalhadores no ano passado. Em 2016, a economia continua desempregando, de tal forma que no acumulado de doze meses encerrados em fevereiro (março 2015-fevereiro 2016), o contingente de pessoas que perderam o emprego saltou para 1.706.695, equivalentes a 4,14% do estoque de emprego formal. Os números são terríveis.
Há muito deixou de ser razoável atribuir tal desempenho a causas estritamente econômicas. A crise é de natureza política, apesar de que foi a fragilização da economia a partir de 2013, entre outros fatores, que propiciou a oportunidade para o levante contra o governo da presidente Dilma Rousseff.
Crise política
A crise é essencialmente política não apenas porque a situação de fragilidade da base parlamentar do governo impede a aprovação pelo congresso nacional das medidas de ajuste nas finanças públicas. Ela assim se caracteriza, principalmente, porque a conflagração aberta das forças políticas concorrentes e a incerteza sobre o desfecho da iniciativa de uma ampla aliança para afastar a Presidente provocaram uma crise de confiança que empurra a economia mais e mais para baixo.
No estágio atual, não se trata mais de saber se vai ser atingida a meta de inflação ou qual vai ser o resultado primário do governo central e sim se a Presidente vai se manter no cargo ou quando vai ser deposta pela ação do parlamento ou do judiciário e qual o tamanho do fosso que será aberto na sociedade brasileira pela instalação de um novo governo sem a legitimidade das urnas.
Frente a incertezas tão cruciais nem o governo tem capacidade política para fazer a gestão macroeconômica, nem as forças de oposição apresentam uma alternativa sustentável de poder. E o país segue ladeira a baixo.
O ajuste
Em sessão na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal, no dia 29 de março, o ministro Nelson Barbosa apresentou a sua visão sobre o o ajuste por que passa a economia brasileira (ver Quadro com a lâmina inicial de sua apresentação).
Em 2016, a economia colhe algumas das medidas adotadas em 2015. O setor externo já mostra os primeiros frutos do intenso ajuste decorrente da depreciação do real, com melhorias importantes na balança comercial e na relação saldo de transações correntes/PIB, promovendo simultaneamente um importante impulso sobre a demanda e uma redução significativa da vulnerabilidade externa.
Um outro aspecto fundamental é o fim do ciclo de inflação acima de 10% ao ano. Em março, a inflação começou a declinar depois do salto de patamar causado pela combinação da depreciação da moeda e do corte nos subsídios ao consumo de energia elétrica e derivados de petróleo, e deverá a partir de agora apresentar taxas fortemente declinantes. Enquanto em 2015, o IPCA mensal se posicionou acima do resultado do mesmo período do ano anterior em praticamente todos os meses, a partir de março 2016 ocorrerá exatamente o contrário (ver Gráfico)
A situação fiscal, todavia, se encontra em uma sinuca de bico. O tamanho da queda no nível de atividade desde o início de 2015, muito além do que havia sido projetado, jogou por terra qualquer perspectiva de ajuste nas finanças públicas, diante de uma retração de 4,8% da receita federal, excluídas as receitas previdenciárias.
Diante de tal quadro, o ministro Nelson Barbosa entendeu que a tarefa mais imediata da gestão macroeconômica é impedir que o nível de atividade (e o emprego e a renda) continue despencando, enquanto adota uma série de medidas pontuais de corte de despesas e propõe outras de caráter mais estrutural para desengessar o orçamento público, entre as quais, mas não apenas, a reforma previdenciária.

Quadro: O ajuste da economia brasileira em 2016

Fonte: Extraído da apresentação do ministro Nelson Barbosa na Comissão
 Econômica do Senado no dia 29/03/2016.

Fundo do poço
Em condições políticas menos ruins, a queda da inflação e os impactos positivos do comércio exterior, mesmo que restringidos pela crise internacional, ao lado de um programa de retomada dos leilões de concessão de infraestrutura se constituiriam em fatores importantes de impulso à demanda que, ao lado de uma proposta crível de ajuste fiscal no médio e longo prazo, poderiam reconquistar a confiança dos agentes econômicos na gestão fiscal e soerguer a economia da recessão.
Nesse momento, todavia, mesmo os segmentos políticos e empresariais (e suas bases de apoio nos aparelhos de estado) que apostaram na derrubada do governo como o único caminho para reconquistar a confiança do mercado já entendem que não vai ter solução indolor para a crise política.



Fonte: IBGE.

Publicado no Jornal da Cidade, em 10/04/2016

segunda-feira, 4 de abril de 2016

As exportações sergipanas de suco de frutas


Ricardo Lacerda

O impacto da depreciação do real sobre as exportações já é percebido em muitos setores econômicos. As atividades que apresentam perfil exportador tendem a apresentar um grande impulso quando a desvalorização de nossa moeda eleva sua rentabilidade. Evidentemente, quando os preços internacionais se encontram deprimidos o impacto positivo da depreciação é atenuado ou até mesmo pode ser mais do que compensado.
Aqui em Sergipe, as exportações tiveram um grande impulso em 2015 e nos dois primeiros meses de 2016. O valor das exportações do Estado aumentou de US$ 78 milhões, em 2014, para US$ 95,6 milhões, em 2015, uma expansão de 22,7%.
O incremento das exportações do estado se deveu quase que exclusivamente ao desempenho das vendas externas dos suco de frutas, que apresentaram o notável crescimento de 43,5% no valor e 102,7% na quantidade. Dois foram os produtos que se destacaram, o suco de laranja concentrado, historicamente  nosso principal produto de exportação,  e o suco de abacaxi, um item novo na nossa pauta mas que respondeu em 2015 por 22% do valor exportado.
As exportações de suco de laranja concentrado apresentaram forte recuperação em 2015, tendo apresentado crescimento de 83,4% em relação ao ano anterior (ver Tabela). Em termos de quantidade, as exportações do produto mais do que dobraram, crescimento de 101,6% (ver Tabela). Os sucos de fruta, em conjunto, responderam por 71% das exportações sergipanas em 2015.

Nos dois primeiros meses de 2016, o valor das exportações de Sergipe teve um incremento de 43,8%, na comparação com o mesmo período de 2015. O nosso principal produto de exportação, o suco concentrado de laranja, apresentou crescimento de 94,3% no valor exportado.
Tabela: Sergipe: os dez produtos mais importantes na pauta de exportações de 2015

Descrição (NCM)
 2015 (JAN - DEZ)
 2014 (JAN - DEZ)
Taxa de Crescimento Valor (%)
Taxa de Crescimento Peso (%)
 US$ FOB
 Kg
 US$ FOB
 Kg
Total geral
95.641.858
59.404.010
77.974.723
42.578.100
22,7
39,5
Sucos de laranjas congelados,nao fermentados
47.343.571
33.244.221
25.817.029
16.491.832
83,4
101,6
Outros sucos de abacaxi
13.314.896
5.455.045
636.720
361.080
1.991,2
1.410,8
Outros oleos essenciais,de laranja
4.626.183
969.024
2.065.505
617.366
124,0
57,0
Outs.acucares de cana,beterraba,sacarose quim.pura,sol.
4.465.466
12.636.000
4.088.674
10.665.000
9,2
18,5
Outs.calç.cobr.tornoz.part.sup.borr.,plást.
4.176.059
179.582
6.386.534
233.771
-34,6
-23,2
Outs.sucos de outs.citricos
4.053.979
839.670
19.695.492
2.949.571
-79,4
-71,5
Outros recipientes tubulares,de aluminio,c<=300l
3.840.444
514.494
3.673.909
577.066
4,5
-10,8
Outs.calçads.sol.ext.borr./plást.couro/nat.
2.826.652
115.099
3.695.377
143.126
-23,5
-19,6
Essenciais
1.538.230
312.156
569.481
191.052
170,1
63,4
Fonte: MDIC-SECEX

Cotação e quantidade
As exportações de suco de frutas de Sergipe são, em geral, muito sensíveis às variações das cotações internacionais. A quantidade exportada de nossos sucos responde, com alguma defasagem temporal, às oscilações do preço do produto. O Gráfico apresentado mostra a evolução da quantidade exportada anualmente de suco concentrado de laranja e a cotação média da tonelada exportada no período.
Pode acontecer como, em 2006 e 2010, que a quantidade exportada caia quando os preços médios estão subindo no mercado internacional, mas isso reflete apenas o tempo necessário para que as exportações possam reagir, o que geralmente acontece no ano seguinte. No caso de 2015, todavia, essa relação se inverteu, porquanto a quantidade exportada teve incremento mesmo com a cotação média tendo declinado, certamente em função do ganho de rentabilidade proporcionado pela depreciação de nossa moeda.
A depreciação do real já vem afetando positivamente o desempenho de algumas importantes cadeias produtivas nacionais. Se a crise perdura em muitos desses segmentos é porque o mercado interno continua despencando por conta da crise política.
O crescimento das exportações deverá se constituir uma das principais forças de nossa recuperação econômica, quando e se a conflagração política ficar para trás. O crescimento das exportações de suco de frutas é muito importante para a região Sul de Sergipe. A expansão do setor injeta renda e promove a geração de empregos na economia local.


Fonte: MDIC-SECEX


Publicado no Jornal da Cidade, em 03/04/2016