Praça São Francisco, São Cristovão- SE

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Praça São Francisco, São Cristovão-SE. Patrimônio da Humanidade

sábado, 24 de abril de 2021

O plano dos EUA para retomarem a liderança industrial

 Ricardo Lacerda*

Uma das definições centrais do governo Biden é o entendimento de que é imperativo para os EUA retomarem a liderança dos investimentos nos setores estratégicos, aqueles de elevados conteúdos tecnológicos e que deverão nortear a expansão da economia mundial nas próximas décadas. Dois segmentos de atividades receberam atenção especial no American Job Plan, o plano de desenvolvimento econômico e social para os próximos oito anos: a produção de veículos elétricos, atividade em que o país teria acumulado defasagem significativa em relação à indústria chinesa; e, aquilo que o documento chama de tecnologias críticas para competitividade futura e para a segurança nacional, abrangendo as novas tecnologias de inteligência artificial, a biotecnologia e a computação, mais especificamente a produção de semicondutores e as tecnologias de comunicação avançada (5G e 6G) que constituirão as estradas futuras do tráfego de informações em todo mundo.

Made in América

O American Job Plan almeja não apenas que os EUA liderem o desenvolvimento dessas novas tecnologias como entende ser necessário manufaturar no território norte americano, ou no máximo em países que são tradicionais parceiros da aliança ocidental, aqueles bens que formam os elos essenciais das cadeias de suprimento dessas atividades.

A atenção dada no plano para a fabricação interna, o recorrente apelo para o Made in America, assume papel central na estratégia de desenvolvimento e significa uma importante virada na compreensão sobre o papel crucial da indústria manufatureira, tanto para impulsionar o crescimento econômico de longo prazo, quanto para gerar internamente os empregos de qualidade que foram perdidos com a migração da atividade manufatureira para o leste asiático, desde os anos noventa do século passado.

Retomada do Estado de Bem-Estar Social

Está explícito no American Job Plan o objetivo de retomar, ainda que em versão atualizada, a economia do bem-estar social dos trinta anos gloriosos (1945-1975), que foi desmontada ao longo das décadas de globalização desregulada e da hegemonia da ideologia neoliberal. Disseminou-se em amplos setores da sociedade norte americana a percepção de que a economia neoliberal fracassou rotundamente em promover crescimento econômico relativamente estável, sustentável em termos ambientais e inclusivo em termos sociais. Pelo contrário, de forma célere, as desigualdades de renda se ampliaram nos anos de hegemonia neoliberal e os mecanismos de solidariedade social foram fragilizados.

A versão contemporânea do estado de bem social é apresentada como o Green New Deal, um novo contrato social em que as questões ambientais assumem papel central, mas que é herdeira inequívoca dos programas sociais da era Roosevelt (New Deal) -Eisenhower e da Great Society, de Lyndon Johnson.

Perda da liderança industrial

Desde os anos noventa do século passado, a China vem ganhando participação em ritmo acelerado na produção mundial da indústria manufatureira. Segundo estimativa da UNIDO- Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial, a participação da China no valor adicionado da indústria manufatureira saltou de 4%, em 1990, para 31,7%, em 2020, enquanto a indústria manufatureira dos EUA viu sua participação se retrair no período de 21,8% para 16% (Ver Gráfico).

A perda de participação norte americana na produção mundial de manufaturas, em processo similar ao que se verificou nas maiores economias ocidentais, não decorreu tão somente do crescimento mais acelerado do PIB da China e de outros países do leste asiático. Refletiu também a perda da participação da indústria manufatureira na própria economia norte americana, recuando, segundo estimativa da OCDE, de 16,7% do valor adicionado, em 1997, para 11,3%, em 2019. Ou seja, nos trinta e dois anos que separam 1997 e 2019, a indústria manufatureira norte americana perdeu cerca de 1/3 de sua participação na riqueza nacional.

 

                                    Fonte: UNIDO- Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial

 

O incentivo à retomada da produção interna da indústria manufatureira é componente fundamental na estratégia do Governo Biden para construir o novo estado de bem-estar social. O ponto central parece ser refazer os vínculos, que foram debilitados nos anos de hegemonia de economia desregulada, entre crescimento da produtividade econômica, geração de bons empregos, aumento da arrecadação tributária e ampliação do estado de bem-estar social. O desafio se situa em compatibilizar tais objetivos com o papel disruptivo das novas tecnologias de informação e comunicação.

A aposta parece estar em mais e não em menos regulamentação das relações de trabalho e na organização da produção por parte do estado. Os anos de supremacia das finanças em relação à produção parecem ter ensinado que a atividade industrial importa e que ela cumpre papel central na articulação entre o incremento da produtividade, geração de bons empregos e fortalecimento do estado de bem-estar.

 

Professor do programa de mestrado de economia da UFS e integrante da ABED- Associação Brasileira de Economistas pela Democracia

sábado, 17 de abril de 2021

Lições do plano de retomada do crescimento do Governo Biden

Ricardo Lacerda

 

Os analistas econômicos ao redor do mundo acompanham com enormes expectativas os desdobramentos do plano de investimentos de longo prazo submetido pelo governo do presidente Biden ao congresso dos EUA. Intitulado American Job Plan, caso aprovado integralmente pelo parlamento daquele país, vai adicionar em oito anos cerca de US$ 2,3 trilhões em investimentos de caráter estruturante ao já aprovado pacote emergencial de US$ 1,9 bilhões, o American Rescue Plan. As expectativas do mundo em relação ao plano proposto decorrem em parte da magnitude dos recursos envolvidos, mas sua importância é ainda maior por conta da mudança de rota a que se propõe em termos da concepção da atuação que o estado deve ter na economia e da centralidade que a questão ambiental assume, particularmente da mitigação dos efeitos das mudanças climáticas, na estratégia de desenvolvimento que foi elaborada.

O American Job Plan é apresentado como sendo uma oportunidade de reimaginar e reconstruir uma nova economia, em que o investimento público retomaria parcialmente o espaço perdido enquanto parcela do PIB, desde o apogeu da era keynesiana de bem-estar social nos anos sessenta do século passado. O plano se fundamenta na constatação de que a economia norte americana, a maior do mundo, vê sua liderança ameaçada por décadas de desinvestimentos em infraestrutura econômica, em estradas, saneamento, energia e telecomunicações, ao tempo que perdeu a capacidade de gerar internamente bons empregos, ou seja, empregos de qualidade com remunerações compatíveis e direitos assegurados. O vínculo explícito entre a retomada do poderio industrial (enfraquecido nas últimas décadas), a expansão dos investimentos nos setores estratégicos, em que a questão da mudança climática aparece como desafio e oportunidade, e a geração de emprego de qualidade é uma das bases de sustentação do plano de desenvolvimento.

Competição com a China

A sombra da perda de competitividade em relação à China percorre o diagnóstico American Job Plan do início ao fim. Está expressa, entre outras passagens, quando o documento constata que a economia norte americana vem perdendo posições em relação às principais economias concorrentes em dimensões tão cruciais quanto Pesquisa & Desenvolvimento (P&D), manufatura e recursos humanos. Ver a versão integral do plano em https://www.whitehouse.gov/briefing-room/statements-releases/2021/03/31/fact-sheet-the-american-jobs-plan/.

A mudança de rota de desenvolvimento presente na proposta assume importância especial quando o documento reconhece explicitamente que as forças de mercado (de oferta e demanda) não têm se mostrado capazes de fazer o redirecionamento dos investimentos para que a economia norte americana recupere o atraso em relação aos principais países concorrentes.

Falha de mercado e o investimento público

Em entrevista postada em podcast de 09 de abril do colunista Ezra Klein, do jornal New York Times, o principal conselheiro econômico do presidente Biden, Brian Deese,  elenca razões práticas para defender a liderança dos investimentos públicos como ferramenta necessária para retomar a competitividade da economia dos EUA. Sua argumentação se assemelha às abordagens de falhas de mercado, especificamente do problema da coordenação dos investimentos. Brian Deese argumenta em determinada passagem da entrevista que o setor privado não tem, por si só, como alavancar os investimentos necessários para instalar uma rede ampla de estações de recarga de veículos elétricos nas rodovias do país. Neste, e em outros casos, o investimento público teria que partir na frente para sinalizar e, assim, debloquear as oportunidades para o setor privado. De forma similar, os investimentos públicos são imprescindíveis para reduzir a vulnerabilidade e a dependência de importações de semicondutores e em outros segmentos estratégicos para retomada do poderio industrial.

Na entrevista, o principal conselheiro econômico de Joe Biden deixa clara a necessidade de ser pragmático e, assim, se libertar das amarras ideológicas vinculadas à suposta supremacia das economias de livre mercado.  Em determinada passagem ele reconhece que a economia chinesa, que não opera com base no livre mercado, vem enfrentando os desafios em diversos dos segmentos mais importantes da atividade econômica com maior competência do que os EUA: está liderando a construção de trens de alta velocidade, enquanto os EUA ainda estão patinando nessa área;   está aumentando os investimentos em P&D em setores estratégicos como parcela do PIB; e, finalmente, a China vem planejando meticulosamente esses investimentos há mais de uma década, enquanto os EUA viram sua infraestrutura se deteriorar progressiva e perigosamente.

Ecossistema produtivo e inovativo

Deese conclui, em linha com as abordagens econômicas mais pragmáticas (e heterodoxas), que o fundamental é fazer o máximo possível em termos de fortalecer um ecossistema de inovação nos setores estratégicos, tarefa que não pode ser deixada ao encargo da iniciativa privada, sempre destacando a complementaridade entre os investimentos públicos e os investimentos ao encargo das empresas, na perspectiva de que é necessário o governo fazer o investimento inicial estratégico e lançar os alicerces dessa transformação para desbloquear o potencial do capital privado. O áudio e a transcrição da entrevista estão acessíveis em https://www.nytimes.com/2021/04/09/opinion/ezra-klein-podcast-brian-deese.html.

O mais importante na proposição do American Job Plan para nós brasileiros são as implicações que a sua implantação deverá ter em termos de concepção do papel dos investimentos públicos e da centralidade das questões ambientais nas políticas de desenvolvimento mundo afora. Para além das especificidades dos problemas nacionais, caso o plano não seja bloqueado ou esvaziado pela oposição, ele significará uma mudança de grande magnitude nas estratégias de desenvolvimento. Diante da falta de perspectivas que vive o Brasil nos dias de hoje, sem dúvida, o seu êxito traria um grande alento, um sopro de esperança de que dias melhores virão. 

 




*Ricardo Lacerda

Professor do programa de mestrado de economia da UFS. Assessor Econômico da Secretaria Geral de Governo de Sergipe e integrante da ABED- Associação Brasileira de Economistas pela Democracia

 


 

 

 


domingo, 11 de abril de 2021

Keynes está de volta, para a felicidade geral

 Ricardo Lacerda

 O debate econômico atual no Hemisfério Norte não deixa margem à dúvida, está em pleno andamento uma importante virada sobre a compreensão do papel do estado no desenvolvimento econômico e social que poderia ser sintetizada na seguinte ordem do dia: o keynesianismo está de volta. Depois de 40 anos de hegemonia sufocante da perspectiva neoliberal, os fracassos reiterados do sistema de mercados crescentemente desregulados em entregar as promessas de promover crescimento econômico sustentado, estável, inclusivo em termos socais e expansivo em direção a novas áreas do globo terrestre exauriram as suas possibilidades.

A agonia do sistema de mercados desregulados se iniciou ainda em 2008 com o espocar da crise financeira em que naufragou a economia mundial. Todavia, naquele momento, as lideranças políticas dos países ricos e os dirigentes das agências multilaterais de desenvolvimento titubearam em realizar as mudanças necessárias em direção a uma nova etapa de maior regulação da economia mundial e sucumbiram mais uma vez à ideologia neoliberal e aos interesses dos detentores da riqueza financeira. Economistas notáveis como Joseph Stiglitz e Paul Krugman, ambos premiados pelo Prêmio Nobel, que apontavam incansavelmente os fracassos da globalização desregulada em promover crescimento justo socialmente e sustentado econômica e ambientalmente, eram vozes minoritárias e suas mensagens não ultrapassavam os muros das universidades ou dos limites dos movimentos populares mais engajados socialmente.

As insatisfações com o sistema neoliberal foram se acumulando com a deterioração crescente do mercado de trabalho nos países centrais, que se expressava no incremento exponencial das relações de trabalho precarizadas, no crescimento do número de pessoas imersas na situação de pobreza e no imenso contingente de pessoas residindo nas ruas que se formou nos principais centros urbanos dos países ricos, muito especialmente naquele país que simbolizava e liderava ideologicamente a propagação mundial das políticas neoliberais. O debate sobre as crescentes desigualdades de renda entre ricos e pobres, que emergiu a partir dos trabalhos do economista francês Thomas Piketty, foram essenciais para assentar nas mesas acadêmicas e na mente da população a injustiça crescente do sistema de mercados desregulados.

Se a insatisfação crescente com a globalização financeira propiciou a emergência de líderes populistas de extrema direita nos diversos continentes, tendo o presidente norte americano Donald Trump como representante maior, esse ciclo político, aparentemente, começou a se esgotar.

Plano Biden

A manifestação mais consistente e robusta da virada keynesiana foi, sem sombra de dúvidas, o recente pacote de estímulos do presidente Joe Biden, dos EUA, que alcançou a notável soma de dois trilhões de dólares já aprovados pelo congresso para ações emergenciais e mais US$ 2,25 trilhões, em oito anos, voltados para mudanças estruturais. Antes de sua submissão ao congresso o conjunto de medidas emergenciais sofreu ataques diversos, com destaque para as manifestações incisivas do economista Lawrence Summers, exatamente aquele assessor econômico que fez o então presidente Obama titubear em adotar medidas mais duras de enfrentamento ao poderio do setor financeiro. Dessa vez, todavia, o presidente recém-empossado, Joe Biden, não se deixou impressionar pela mensagem alarmista do economista de que um pacote tão robusto teria impactos inflacionários desestabilizadores da economia. A secretária do tesouro americano, a experimentada economista Janet Yellen, presidente do Banco Central (Federal Reserve) na administração Obama, descartou recuar e afirmou sem rodeios que, dessa vez, se o governo tivesse que errar seria para mais e não para menos, como aconteceu em 2008.

O novo pacote voltado para o longo prazo contempla investimentos de US$ 750 bilhões em infraestrutura produtiva em estradas, ferrovias e transmissão de energia, US$ 189 bilhões em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) tecnológico, avança em direção ao estímulo a setores industriais considerados estratégicos e mais US$ 100 bilhões em infraestrutura de internet de banda larga. Aproximando-se da plataforma dos ambientalistas, contempla investimentos em energias renováveis, veículos elétricos e saneamento básico em uma revirada ambiciosa em termos de atuação do governo na área econômica. Como até mesmo lideranças do setor financeiro e de empresas da mídia corporativa que costumam se alinhar a esse segmento reconhecem,  as novas medidas anunciadas pela administração Biden significam uma virada de grande alcance na política econômica, não apenas porque enfrentam os postulados das medidas fiscalistas que colocavam a austeridade fiscal no altar da sacralidade, como desenham um conjunto de linhas de ação que reposiciona o papel do estado no desenvolvimento econômico e social do país.  

Efeito demonstração

Não haverá como evitar os impactos políticos do efeito demonstração da iniciativa norte americana sobre a orientação política econômica dos países ricos e mesmo dos países em desenvolvimento como o nosso, apesar dos mugidos e do aparente pouco caso de economistas brasileiros vinculados ao mercado financeiro e de seus porta vozes na mídia corporativa, como retratado entre nós no editorial do jornal Folha de São Paulo, de 04 de abril de 2021. O referido editorial, apesar de reconhecer que o Megapacote de Biden visa revigorar o capitalismo dos EUA, em seguida vaticina que o Brasil não teria a oportunidade de seguir caminho similar.

Do ponto de vista brasileiro, a virada keynesiana que se apresenta no Hemisfério Norte abre uma senda de luta interna para se contrapor não apenas ao desmonte do estado promovido pelas políticas neoliberais que foi retomado em ritmo acelerado depois do golpe parlamentar de 2016.  A possibilidade aberta pela virada na política econômica nos EUA vai além disso, cria condições concretas para a construção de um novo pacto político e social em favor de uma nova etapa de desenvolvimento de forte conteúdo desenvolvimentista e de inclusão social, em linha com as novas demandas da sociedade, de afirmação do país interna e externamente. Essa afirmação deve contemplar não apenas o desenvolvimento produtivo, por meio da capacitação tecnológica, científica e empresarial, como a construção de uma sociedade mais homogênea, menos desigual, em uma nova perspectiva na relação com os recursos naturais e um aprofundamento interno nas relações democráticas. Sim, Keynes está de volta na política econômica e social e chegará ao Brasil. Sim, retornará para a felicidade geral da nação..







Artigo publicado no Jornal da Cidade, de Aracaju, em 11/04/2021


terça-feira, 23 de março de 2021

A importância do Curso de Economia para o estado de Sergipe

Ricardo Lacerda

O curso de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Sergipe não tem rival no que se refere à sua contribuição para o desenvolvimento institucional, econômico e social de Sergipe. A Faculdade de Ciências Econômicas, fundada em 1948, inaugurou o ensino superior em nosso estado no ano de 1950, juntamente com o curso de química. Em 1961, reuniu-se às também isoladas Escola de Química, Faculdade de Direito, Faculdade Católica de Filosofia, Escola de Serviço Social e Faculdade de Ciências Médicas para pleitear a criação da Universidade Federal de Sergipe, o que veio a se concretizar em 15 de maio de 1968.

A construção da cidade Universitária, no município de São Cristóvão, teve por liderança o professor José Aloisio de Campos, reitor entre 1976-1980, que posteriormente veio dar nome ao campus. O economista José Aloísio de Campos foi, desde os anos 1960, a principal liderança intelectual de Sergipe nos debates travados em favor da industrialização do estado e da exploração das nossas riquezas minerais. Presidiu o histórico Conselho de Desenvolvimento Econômico de Sergipe (CONDESE), que cumpriu papel decisivo na elaboração e execução das políticas voltadas para o desenvolvimento das chamadas indústria de base de Sergipe nos anos 1970 e 1980.

Nesse momento da história, o curso de economia da Universidade Federal de Sergipe foi peça determinante na formação de recursos humanos e no amadurecimento das reflexões sobre as questões mais relevantes para o desenvolvimento do estado de Sergipe, em suas diversas dimensões.

 

A fundação da UFS coincidiu com outras grandes transformações de nosso estado: a exploração intensiva das riquezas minerais, com a produção de petróleo e gás natural pela Petrobras e com a instalação de unidades de produção de amônia e ureia e de produção de potássio, que viriam impactar profundamente a estrutura ocupacional e de renda e acelerar o ritmo de crescimento econômico; o intenso processo de urbanização e a modernização da máquina administrativa pública; o florescimento de Aracaju como uma cidade moderna, com oferta diversificada de bens e serviços. Em todas essas dimensões, os economistas formados pela UFS tiveram participações decisivas.

 

Esse conjunto de transformações correspondia ao movimento intenso de modernização do Brasil, com baixa inclusão social, cujas referências centrais foram os períodos de intenso crescimento do Milagre Econômico e dos Planos Nacionais de Desenvolvimento, nos anos sessenta e setenta, em um regime político fechado.

Três professores honraram o departamento de economia em suas passagens pela reitoria da Universidade Federal de Sergipe. Além de José Aloísio de Campos, os professores Gilson Cajueiro de Holanda (1980-1984) e Josué Modesto dos Passos Subrinho, esse último por dois mandatos conferidos em eleições diretas pela comunidade universitária (2004-2008 e 2008-2012). O professor Gilson Cajueiro de Holanda, com larga experiência administrativa, foi fundamental para a conclusão dos investimentos no recém inaugurado campus universitário, nesse momento de consolidação do ensino superior no Brasil e em Sergipe

O sistema universitário público somente voltou a apresentar um novo ciclo de expansão de grande magnitude nos anos 2000, agora já em plena vigência do regime democrático, quando a melhoria nas finanças e a decisão de ampliar a rede federal viabilizaram os recursos necessários. A redemocratização inseriu definitivamente na agenda do Brasil a preocupação com o progresso social da população brasileira que não poderia mais ser aparteado da perspectiva do desenvolvimento econômico.

Foi nessas circunstâncias que a gestão do Prof. Josué Modesto dos Passos Subrinho (2004-2012) empreendeu um novo grande salto da Universidade Federal de Sergipe, com o estabelecimento, pela primeira vez, de um sistema robusto de pesquisa e de pós-graduação, e de uma grade de cursos de graduação muito ampla, contemplando as mais importantes áreas de conhecimento e de formação profissional, fundamentais para o presente e para o futuro de Sergipe.

 

Ao longo desse período, o departamento de economia também passou por importantes mudanças. Inicialmente contou com um corpo docente composto por técnicos do governo do estado dedicados em tempo parcial ao curso de economia e, como era típico da época, em boa parte com formação em cursos de pós-graduação lato sensu promovidos pela Comissão Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL). Com a expansão do sistema de pós-graduação brasileiro, a partir do final dos anos setenta, o departamento de economia passou a assumir uma feição propriamente acadêmica nos anos oitenta, com a chegada de professores formados em cursos de pós-graduação stricto sensu. É o início de um processo que mesclou a chegada de docentes de fora do estado com a participação do(a)s melhores aluno(a)s egresso(a)s do curso local e que buscaram qualificação em alguns dos mais renomados centros de pós-graduação de economia do Brasil.

O enfoque do curso também tem passado por importantes mudanças, em consonância com o que vem ocorrendo na disciplina. Com o rápido avanço dos métodos quantitativos nas chamadas ciências econômicas, potencializado pelos efeitos da radical transformação das tecnologias de informação sobre os métodos estatísticos e econométricos, o curso de economia da UFS mais recentemente buscou conjugar uma formação teórica sólida e plural, abrangendo os principais paradigmas das chamadas ciências econômicas, com o instrumental técnico propiciado pelas novas tecnologias. Faz isso sem se afastar do seu compromisso fundamental, que vem norteando suas ações desde sua longínqua criação em 1948, o compromisso com o desenvolvimento econômico e social de Sergipe.

Publicado no Jornal da Cidade, em 21/03/2021

segunda-feira, 1 de março de 2021

Vídeo das Aulas do Curso de Economia Regional e Urbana no You Tube





LINK DAS AULAS

- TEORIA DOS LUGARES CENTRAIS

 
- VON THUNEN- ÁREAS DE ABASTECIMENTO
 
- WEBER
 
- ISARD
 
- Industrialização e Desenvolvimento Regional- Parte 1

 
- Industrialização e Desenvolvimento Regional- Parte 2


- O GTDN,  a criação da SUDENE e a política de desenvolvimento regional

https://youtu.be/ALziwSStSpE

O GTDN , A Política de Desenvolvimento Regional e a Nova Indústria do Nordeste
Desenvolvimento regional brasileiro nos anos 1970 E 1980


Desenvolvimento Econômico do Nordeste no início do seculo XXI









A economia brasileira precisa de um pacote de estímulos robusto

Ricardo Lacerda de Melo

 

O ano de 2020 foi guiado pelos impactos da pandemia do Covid-19 sobre a produção e circulação de bens e serviços e pelas respostas dos governos nacionais a fim de atenuar os efeitos de desestruturação econômica e social causada pela disseminação do vírus entre a população global. A Organização Mundial de Saúde reconheceu em 11 março de 2020 a situação de pandemia da doença do Covid- 19. Até o início do dia 25 de fevereiro de 2021, a instituição registrava 111.999.954 casos confirmados de pessoas infectadas pelo vírus da covid-19, com 2.486.679 mortes, distribuídas por todos os continentes.

O Brasil é o terceiro país em número de pessoas com casos confirmados, 10.257.875, abaixo apenas dos EUA e da Índia, mas até a 1ª quinzena de abril o número de casos confirmados no nosso país deverá superar o do Índia, galgando a 2ª posição. Haviam sido registradas no Brasil, até aquela data, 248.529 pessoas mortas pelo Covid-19, número inferior apenas às 499.019 pessoas mortas nos EUA. Desde o início de novembro de 2020, a doença enfrenta uma segunda onda de contaminação no país, voltando a se expandir em ritmo acelerado em parte expressiva do território nacional, atingindo média semanal superior a mil casos diários em meados de fevereiro, sem perspectivas de refluir.

Nos países centrais, a vacinação ampla contra a doença do Covid-19 ganhou impulso a partir do final de 2020, mas não deverá lograr a imunização de parcela significativa da população mundial antes do segundo semestre de 2021. A consequência desse fato é que os impactos da pandemia continuarão marcando a evolução da economia em escala global ao longo do corrente ano e, possivelmente, do ano de 2022.  No Brasil, o início da vacinação foi postergado para o mês de janeiro de 2021, com o agravante de que a o ritmo de vacinação se mantém muito insatisfatório, por conta da falta de uma política clara de aquisição dos insumos no exterior, que persiste até o momento. Salta aos olhos a descoordenação que impera na implementação do programa de vacinação.

Impactos econômicos e sociais

Os impactos econômicos e sociais da pandemia têm sido terríveis. Em meados de dezembro de 2020, o balanço preliminar da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL), órgão integrante das Nações Unidas, estimou contração média de 7,7% do PIB do subcontinente latino-americano em 2020, queda sem paralelo desde que as estatísticas começaram a ser registradas. Para aquela instituição, o encerramento temporário de muitas atividades e a perda de rendimentos das pessoas provocaram uma contração acentuada do nível de ocupação em todos os países da região. Em uma estimativa para o segundo trimestre de 2020, abrangendo catorze países da América Latina e Caribe, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) indicou queda de 10 pontos percentuais na taxa de ocupação, na comparação com igual período do 2019, correspondentes a uma perda de 47 milhões de postos de trabalho.

No início de janeiro de 2021, o relatório Panorama Econômico Mundial, do Banco Mundial, estimou em 6,9% a retração do PIB na América Latina e Caribe e projetou para 2021uma retomada parcial do crescimento na região, com elevação de 3,7% no seu PIB.

O Relatório de Inflação do Banco Central do Brasil assinalou no início de dezembro que a recuperação da economia mundial dependerá principalmente da evolução do Covid-19. O relatório alerta que a ressurgência da pandemia entre algumas das principais economias mundiais poderia interromper ou mesmo reverter, por algum tempo, a recuperação parcial do nível da atividade econômica mundial registrada no terceiro trimestre de 2020, o que veio a se confirmar no início de 2021.

As políticas contracíclicas

As respostas dadas pelos governos nacionais para atenuar os impactos da pandemia sobre a ocupação e os rendimentos das famílias, e assim se contraporem à espiral descendente do poder de compra, assumiram grandes proporções. As medidas implementadas envolveram um leque variado de instrumentos, contemplando políticas monetárias agressivas de adoção de taxas de juros negativas, montantes inéditos de transferência de renda para as famílias que, de uma hora para outra, perderam suas fontes de ganhos e políticas creditícias e de suplementação de salários dos empregados para as empresas em dificuldades, configurando uma das mais abrangentes experiências históricas de políticas anticíclicas e de caráter humanitário.

No Brasil, as medidas contracíclicas alcançaram grande monta, abrangendo, além dos instrumentos citados acima, volumosas transferências federais para os entes subnacionais (estados e municípios), a fim de compensar as abruptas perdas na arrecadação, sem as quais os serviços públicos mantidos por essas esferas de governo teriam entrado em colapso.

Indefinição angustiante

Os governos dos países centrais e as agências multilaterais de desenvolvimento têm expressado enfaticamente a necessidade da continuidade dos estímulos de renda, tanto do ponto de vista humanitário, quanto do ponto de vista da retomada da economia. O recém empossado presidente Biden, dos EUA, anunciou um robusto pacote de estímulo que deve alcançar entre US$ 1,4 e US$ 1,9 trilhão.

O Brasil inicia o ano de 2021 em um ambiente de profunda incerteza, diante do encerramento do período estipulado para a vigência dos diversos programas contracíclicos. Com mais de 50 dias de interregno, o governo federal ainda não foi capaz de aprovar um programa robusto de amparo à população desassistida e que venha se contrapor ao refluxo da demanda. Apegadas a uma retórica de austeridade desconectada com a gravidade da situação econômica e social, as autoridades econômicas retardam a definição das novas medidas de socorro à população sem renda, que venham suprir o vazio de políticas que vige desde o final do ano passado. É importante destacar que, depois da modesta retomada verificada no 3º trimestre de 2020, graças ao vigor dos estímulos concedidos, a economia brasileira já vem perdendo fôlego nos últimos meses.

O citado Relatório da Inflação, do Banco Central constatava em dezembro que as perspectivas sobre o ritmo de crescimento da economia brasileira continuavam muito incertas, diante da redução do volume de transferências de rendas para as famílias (auxílios emergenciais) já nos últimos meses de 2020.

Para 2021, reina a indefinição e as medidas atualmente em discussão são completamente insuficientes. Do ponto de vista social, a proposta do novo auxílio emergencial encaminhada ao congresso nacional, em quatro parcelas de R$ 250, não atende minimamente as necessidades de sobrevivência das famílias empobrecidas pela pandemia e chega a ser inexpressiva do ponto de vista de impulso da demanda. Ao fim e ao cabo, famílias empobrecidas, empresas fragilizadas e entes subnacionais iniciam o ano de 2021 sem perspectivas definidas em relação ao futuro imediato.