Ricardo Lacerda
Muitos de nós economistas esquecemos em
algumas situações que a economia trata de pessoas. Os números do PIB, juros,
inflação/deflação, câmbio, ajuste fiscal, balanço de pagamentos não se encerram
em si próprios.
Na edição de maio de 2015 do relatório
Perspectivas Sociais e do Emprego no Mundo, a Organização Internacional do
Trabalho (OIT) dimensiona o impacto da crise financeira internacional sobre o
mercado de trabalho, tanto em termos de desemprego quanto da precarização nas
relações de trabalho.
O relatório estima que o número de
desempregados ao final de 2014 se posicionou cerca de 30 milhões acima da
situação anterior à crise de 2008. A edição de janeiro do relatório havia
apresentado os números de forma mais detalhada. Entre 2008 e 2009 o contingente
de desempregados na economia mundial saltou de 179 milhões de pessoas para 199
milhões de pessoas (ver Gráfico).
Fonte: OIT. Trends Econometric Models.
Outubro de 2014
Projeções
A instituição estima que 40 milhões de jovens
entram no mercado de trabalho anualmente no mundo e que um crescimento
econômico robusto é fundamental para abrir postos de trabalho para essas pessoas,
o que não vem ocorrendo já por sete longos anos.
No primeiro momento da crise, o mercado de
trabalho nas economias emergentes não foi tão impactado. O Brasil, por exemplo,
continuou gerando empregos formalizados até muito recentmente e a taxa de
desocupação no país caiu de 8,1%, em 2007, para 6,5%, em 2013.
Nos últimos dois anos a geração de emprego se
tornou mais débil nas economias emergentes e as projeções da OIT apontam para aumento
na taxa de desemprego em muitas das principais economias emergentes, como
Rússia, Brasil e África do Sul.
O mercado de trabalho nos países de economia
avançada sofreu com intensidade muito maior os efeitos da crise. Em alguns deles,
como a França e a Itália, a taxa de desemprego se aproxima, no primeiro caso, e
ultrapassa, no segundo, de 10% da força de trabalho, sem perspectivas de
melhorias expressivas até 2017.
Mesmo com a recuperação no mercado de
trabalho nos útimos anos em grandes economias, como as dos EUA, Reino Unido e
Alemanha, a taxa de desemprego entre os países de economia avançada se situou
ao final de 2014 dois pontos percentuais acima da taxa de 2007.
Precarização
A edição de maio do relatório da OIT sublinha
que desde a deflagração da crise financeira em 2008 a relação de trabalho se tornou
menos segura o que, inclusive, enfraquece a demanda e penaliza a produção. Como
o sacrifício recaiu desproporcionalmente sobre os segmentos mais pobres da
população economicamente ativa, notadamente nos países ricos, a piora no
mercado de trabalho produziu aumento de desigualdades e colocou novos e maiores
desafios para as políticas públicas em termos de ampliação da cobertura da
proteção social.
O relatório denuncia que a relação de emprego
estável em tempo integral perdeu peso nas economias avançadas e corre o risco
de deixar de ser o tipo de vínculo dominante. Entre os países de economia
emergente, apesar do ciclo de crescimento anterior que favoreceu a formalização
do trabalho, o emprego informal continua a ser muito disseminado. Ademais, a
OIT alerta que nas atividades menos nobres das cadeias de abastecimento globais
disseminam-se relações de trabalho de curta duração e com horários irregulares.
Em tempos de crise, eleva-se o risco da corda
arrebentar do lado mais fraco. Nesse momento da vida brasileira em que a quase
totalidade dos segmentos empresariais e uma parcela ampla da classe política e
economistas se perfilam em favor de, sob pretexto de regulamentar, ampliar a
prática da terceirização da força de trabalho, o relatório da OIT serve de
alerta.
Cadeias globais
A OIT entende que mudanças na regulação do
trabalho são necessárias para dar conta da nova realidade. A inserção dos
países pobres nas cadeias globais de produção e comercialização tem ocorrido
muitas vezes sem observar as garantias minímas para os trabalhadores.
A instituição sublinha que os trabalhadores
submetidos às novas relações de trabalho, mais precarizadas, como trabalhadores
temporários e informais, trabalhadores em tempo parcial, en muitos das quais há um
predomínio de mulheres, são mais afetados pela pobreza e pela exclusão social
e que adotar políticas públicas que propiciam uma cobertura social daqueles que
estão submetidos às relações mais frágeis vai ser um dos principais desafios
dos próximos anos. Nesse contexto, defender o avanço da terceirização, como
alguns propõem para o Brasil é um grande equívoco.
Publicado no Jornal da Cidade, em 31 de maio de 2015
Nenhum comentário:
Postar um comentário