Ricardo Lacerda
A expectativa de mercado para o crescimento
do PIB de 2018 subiu seguidamente entre o início de fevereiro até a penúltima
semana de março; desde então ela entrou em trajetória descendente, com a
projeção mais recente (de 27 de abril) retornando ao patamar de meados de fevereiro
(ver Gráfico 1). As estimativas para a produção industrial e para o nível de
atividade do setor de serviços, ainda que indiquem continuidade do crescimento,
vêm sendo revistas para baixo.
Não foi um declínio assombroso, mas a
reversão de trajetória revela frustração em relação às perspectivas anteriores de
melhoria sustentada no ambiente político, econômico e social no futuro próximo.
Pode ser uma percepção momentânea, que venha a ser revertida nas próximas
semanas, mas não é fora de propósito afirmar que ela também pode se cristalizar
em um final de ano melancólico.
Fonte: Banco Central do Brasil
Sim, é verdade que, em parte, as revisões
para baixo no crescimento do PIB representam
ajustes em expectativas anteriores demasiadamente otimistas; mas, em grande parte,
elas respondem aos seguidos resultados aquém do esperado das pesquisas
setoriais ao longo dos três primeiros meses do ano e da ausência de reanimação
do mercado de trabalho, consolidando na população a sensação de desalento em
relação às possibilidades de melhoria do quadro social.
É prematuro concluir que a recuperação do
nível de atividade da economia brasileira vai entrar em banho-maria, mas
acontecimentos externos e internos nas duas últimas semanas somente concorreram
para deprimir as expectativas.
Em artigo publicado no dia 03 de maio no
portal Poder360, o jornalista Alon Feuerwerker fez, em nosso entendimento, a
melhor síntese do momento econômico e político, quando pespegou o título “Ortodoxos
de mau humor, um sintoma de que as coisas não vão bem”, para assinalar que a frustração
com a retomada do crescimento em bases mais firmes pôs em cheque o projeto
político da ortodoxia liberal.
Turbulências
Ingredientes externos recentes, como as turbulências
provocadas pelas perspectivas de aceleração na elevação dos juros dos títulos
do tesouro norte-americano, a imposição de quotas de exportações do aço pela
administração Trump e os sinais de crise cambial na vizinha Argentina poderão induzir,
nas próximas semanas, a novas revisões para baixo na estimativa do crescimento
do PIB brasileiro para 2018.
Firmando-se o crescimento da economia da
norte-americana, acompanhado pelas perspectivas de incrementos nas taxas de
juros internacionais, o capital externo deverá se tornar mais avesso ao risco,
exigindo prêmios mais elevados para continuar fluindo para os países
emergentes, com consequências ainda não bem dimensionadas sobre o comportamento
do PIB e dos preços internos.
Não menos importante tem sido a sensação de
que o país perdeu o prumo: a plataforma de transição apresentada no documento
Uma Ponte para o Futuro pouco resultados alcançou, o governo central se encontra
imobilizado com as denúncias de corrupção e a crise social se agravou.
Mercado de trabalho
Após seis trimestres de crescimento do PIB, a
contar do último trimestre de 2016, a taxa de desocupação no Brasil no
trimestre janeiro-março manteve-se em patamar muito elevado (13,1%), redução
quase imperceptível em relação aos 13,7% do mesmo trimestre de 2017.
Ainda que a ocupação total tenha aumentado em
1,6 milhão de pessoas nessa comparação, o emprego formal no setor privado não
vem reagindo. Pelo contrário, o contingente de pessoas ocupadas com carteira de
trabalho no setor privado encolheu em 493 mil, na comparação entre os primeiros
trimestres de 2017 e de 2018 (ver Gráfico 2). É especialmente preocupante que a
desaceleração do ritmo de queda desse vínculo tem sido muito lenta, indicando
que ainda poderá demorar alguns trimestres até que o emprego de melhor
qualidade volte a crescer.
Como sintoma adicional da fragilização do
mercado de trabalho, os dados do Cadastro de Empregados e Desempregados
(CAGED), do Ministério do Trabalho, que registra as movimentações nos vínculos
celetistas, apontaram que o contingente de empregados formais somente vem
crescendo nas faixas salariais mais baixas, de até 1,5 salários mínimos,
enquanto a ocupação formal continua se
retraindo nas faixas médias e altas.
Fonte: IBGE. PNADC
Publicado no Jornal da Cidade, em 06/05/2018
Nenhum comentário:
Postar um comentário