Ricardo Lacerda
Dois eminentes especialistas em economia do semiárido nordestino,
um do Ceará e outro do Rio Grande do Norte, comentaram por meio de mensagens
eletrônicas os artigos que publiquei aqui no Jornal da Cidade, nos dias 14 e 21
de junho, a respeito dos efeitos da longa estiagem que assola a região sobre a
produção de suas principais culturas agrícolas. Fundamentalmente os
especialistas argumentam que em muitas áreas do semiárido a estiagem continua
castigando fortemente a produção agrícola e não há ainda sinais de que o pior dos
efeitos da seca já tenha passado. É difícil discordar dessa afirmação,
notadamente para as áreas do semiárido do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e
Pernambuco.
Entre junho e novembro, novos dados tornaram-se disponíveis
permitindo voltar ao tema com informações adicionais: de um lado, a Pesquisa
Agrícola Municipal (PAM) de 2014 foi publicada na semana passada pelo IBGE, com
a discriminação dos dados dos municípios do semiárido para aquele ano; de
outro, o IBGE fez revisões das previsões de safra que alteraram significativamente
para baixo a estimativa da produção de alguns estados das principais culturas temporárias
para 2015. Vamos aos números.
Culturas temporárias
Os cultivos de milho, feijão e mandioca representaram na média
de 2006-2010, portanto, antes da estiagem se instalar com mais intensidade, 86%
das áreas colhidas das culturas temporárias do semiárido nordestino (excluindo
os municípios de Minas Gerais que integram essa subregião). Essa participação
atinge 96% no semiárido sergipano e apresenta a menor participação no semiárido
potiguar, com 76%.
Em termos de área colhida nesse período, o milho respondeu por
41% do total das culturas temporárias do semiárido nordestino, o feijão por 37%
e a mandioca por 8%, ainda que essas proporções possam se diferenciar bastante entre
os estados. No artigo de hoje examinaremos a evolução do cultivo do milho.
O Milho
Estimulado pelas cotações favoráveis do produto no mercado
internacional, o cultivo de milho se expandiu em ritmo acelerado na região
Nordeste nos últimos dez anos. A produção projetada pelo IBGE para 2015 é 67%
superior à média anual do período 2006-2010 (ver Gráfico 1). O incremento da
cultura foi especialmente intenso nas áreas de fronteira agrícola do sul do
Maranhão e do Piauí, mas o crescimento também foi notável em Sergipe e na Bahia,
inclusive em áreas do semiárido. É digno de nota que a cultura do milho responda
por cerca de ¾ das áreas ocupadas por culturas temporárias no semiárido
sergipano.
O desempenho da cultura foi bem menos favorável nos demais
estados do Nordeste. Mesmo no período anterior à atual estiagem, a cultura do
milho não conheceu expansão acelerada nos territórios dos estados do Ceará, Rio
Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas e depois que a estiagem se
instalou as quantidades produzidas despencaram nesses estados. Há portanto,
desempenhos muito distintos na cultura do milho entre os dois conjuntos de
estados considerados.
As projeções do IBGE para as safras de milho em 2015 indicam
produções recordes para o Maranhão, Piauí, Bahia e Sergipe. Nos casos do Ceará,
Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas, a safra de 2015 deve se
situar muito abaixo da média anual do período 2006-2010, sendo especialmente
ruim a projeção para o Rio Grande do Norte, que deverá produzir em 2015 apenas
15% da média do período 2006-2010. Há que se registrar, ainda, que no vasto
território entre Ceará e Pernambuco, abrangendo o Rio Grande do Norte e a
Paraíba, as projeções são de que as safras de milho de 2015, como resultado de
uma recidiva da estiagem, se apresentem inferiores às de 2014, estancando a
retomada que parecia dar os primeiros passos entre 2012 e 2013.
Fonte: IBGE. PAM para os anos de 2000 a 2014 e projeção da LSPA
de setembro de 2015 para o ano de 2015.
Semiárido
A trajetória das safras de milho nos municípios que integram o
semiárido apresenta, em geral, similaridades
com a evolução da produção das totalidades dos estados, ainda que os resultados
sejam inferiores no caso do semiárido (ver Gráfico 2).
As safras de 2014, últimos resultados disponíveis nesse nível de
agregação, mostram retomadas robustas da produção nos municípios que integram o
semiárido dos estados do Piauí e de Sergipe e para o conjunto do semiárido
nordestino (excluídos os municípios de Minas Gerais). Para os estados entre
Ceará e Alagoas, as safras de milho do semiárido em 2014 se situam muito abaixo
da média de 2006-2010. No caso do semiárido baiano, a retomada da safra foi
muito significativa, mas produção de 2014 ainda não atingiu o patamar médio do
período anterior à seca.
O Gráfico 2 traz ainda dois aspectos importantes: o primeiro é
que mesmo nos estados mais atingidos pela estiagem, as piores safras de milho
do semiárido se concentraram em 2012, com alguma recuperação em 2013 e 2014.
O segundo aspecto é que, caso as safras de milho do semiárido acompanhem
asprojeções para 2015 da LSPA para os territórios estaduais, as áreas
semiáridas entre Ceará e Pernambuco, incluindo Rio Grande do Norte e Paraíba,
registrarão quedas de produção no ano corrente, enquanto que no Piauí, Sergipe
e Alagoas as safras do semiárido terão se expandido.
Em relação aos artigos de junho, as principais alterações
percebidas na análise são de que as safras de milho nos territórios dos estados
entre Ceará e Pernambuco enfrentaram em 2015 novas frustrações decorrentes da
recidiva da estiagem. Foi dada, também uma ênfase maior no presente artigo ao
fato que o patamar da produção nesses estados se encontra ainda muito abaixo do
período pré-estiagem. Finalmente destacou-se que as retomadas da produção foram
mais intensas naques estados em que o cultivo do milho se encontrava em forte
expansão no período anterior à estiagem.
No artigo da próxima
semana, examinaremos a evolução das safras de feijão no semiárido.
Fonte: IBGE. PAM para os anos de 2000 a 2014. * foram excluídos
os resultados dos municípios de Minas Gerais que integram o semiárido. ** A
estimativa do índice de produção de milho de 2015 para as áreas do semiárido
dos estados foi calculada aplicando-se às mesmas taxas de crescimento previstas
pela LSPA de setembro de 2015 para as totalidades dos territórios estaduais.
Publicado no Jornal da Cidade, 08/11/2015
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