Ricardo Lacerda
Quando se afirma que a economia brasileira
deverá estabilizar o nível de atividade no 1º semestre e voltar a crescer na
segunda metade do ano algumas qualificações são necessárias. Depois de recuar
3,8%, em 2015, e 3,6%, em 2016, as projeções do mercado e do governo para o PIB
de 2017 coincidem em incremento de 0,5%, ainda que permaneçam sob forte
instabilidade muitos fatores políticos e econômicos que poderão influenciar o resultado
efetivo. A projeção do FMI para o crescimento da economia brasileira em 2017 é
de 0,2%.
Muito se fala no carregamento estatístico (carry over) dos
últimos dois trimestres de 2016 sobre o resultado anual do PIB de 2017. Isso
significa que mesmo que a economia apresente algum crescimento na margem já a
partir do 1º ou 2º trimestre de 2017, em relação ao trimestre imediatamente
anterior, na série livre de efeitos sazonais, esses resultados ainda se
situarão bem abaixo dos mesmos trimestres de 2016. Já na segunda metade do ano,
o carregamento estatístico será menos desfavorável ao resultado anual,
porquanto os resultados do 3º e 4º trimestres de 2017 serão comparados com
números mais rebaixados dos mesmos trimestres de 2016.
É por esse aspecto estatístico (mas que
reflete uma realidade, sem dúvida) que o ministro Meirelles tem divulgado que
no quarto trimestre de 2017 a economia brasileira deverá estar rodando alguma
coisa acima de 2% na comparação com o 4º trimestre de 2016, mesmo que o
incremento anual venha a ser de 0,2% a 0,5%.
Componentes do PIB
Há alguns fatores que concorrem para que a
economia estanque a queda no ano de 2017, mas isso não significa que uma retomada
sustentada do crescimento, mesmo que moderada, está longe de estar assegurada. A projeção do FMI para o crescimento
brasileiro dos próximos anos é de que ele não alcançará a casa de 2% até 2021,
último ano para o qual a instituição apresenta simulação. Ainda assim, se a instabilidade
política interna ou o cenário econômico externo não entornarem o caldo. O
cenário do FMI em nada se assemelha ao otimismo disseminado pelo ministro da
fazenda.
Um dos principais fatores que pode levar a
economia brasileira a apresentar algum crescimento em 2017 é o comportamento do
setor agropecuário, também por um viés estatístico, que não deixa também de ter
uma dimensão real, mas que está longe de significar que o país reencontrou o
caminho do crescimento.
O PIB setor agropecuário despencou 6,6% em
2016, por conta dos efeitos da estiagem, notadamente nas regiões Nordeste e
Centro-Oeste. O simples retorno da atividade agropecuária ao patamar de 2015,
se o escândalo decorrente das investigações da polícia federal nos frigoríficos
não prejudicar muito a produção do setor, teria o impacto de 0,48% no PIB,
exatamente a projeção de mercado para o crescimento da economia em 2017.
A projeção de mercado da semana passada era de
que a produção do setor agropecuário não recuperará em 2017 toda a perda de
2016 mas ficará próxima disso. A produção agropecuária deverá crescer 6%,
enquanto a indústria teria um crescimento quase residual (0,8%), sobre uma base
muito rebaixada, e o setor serviços ficaria próximo da estabilização, recuaria
0,12%.
Confiança e demanda
Seja em função da recuperação da safra
agrícola, seja em por conta dos efeitos positivos esperados da redução da
inflação e dos juros ou dos ganhos de confiança entre as famílias e as empresas,
a estabilização e o posterior incremento do nível de atividade necessariamente se
traduzirão em componentes de dispêndio. Ou seja, deverão aparecer na
contabilidade em termos de gastos das famílias, de despesas de investimentos das
empresas ou do saldo das exportações e importações de bens e serviços com o
exterior, posto que não se pode esperar impulso significativo oriundo dos
dispêndios governamentais, pelo menos nas primeiras etapas do processo.
No último Relatório da Inflação do Banco
Central, de 22 de dezembro de 2016, quando a instituição projetava crescimento
do PIB 0,8% para 2017, os vetores de demanda que se contraporiam à continuidade
da trajetória declinante do PIB estariam associados essencialmente à
interrupção do declínio dos gastos das famílias e dos investimentos das
empresas em capital fixo.
Depois de declinar 3,9%, em 2015, e 4,2%, em
2016 (ver Gráfico), o relatório projetava para o consumo das famílias um
incremento de 0,4% em 2017. Os gastos com a Formação Bruta de Capital Fixo
(FBCF), que iniciaram sua trajetória de retração em 2014 e entraram em queda
livre em 2015 e 2016, também se estabilizariam e apresentariam um incremento de
0,5% em 2017. As contribuições do saldo das exportações e importações de bens e
serviços e dos gastos do governo não seriam muito expressivas.
Colocados esses números, acredito que fica
relativamente balizado o debate sobre as nossas possibilidades de crescimento
em 2017 e mais além. Nada de espetacular no horizonte, com várias pedras no
caminho.
Fonte: IBGE.
Publicado no Jornal da Cidade, em 26/03/2017
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