Ricardo Lacerda
A experiência brasileira dos últimos dois
anos de promover o ajuste nas finanças públicas em meio a uma crise política de
grande proporção tem resultado em elevados custos sociais e econômicos. Ainda
no início de 2015 as medidas de contenção fiscal, de ajuste cambial e de
correção de preços administrados em uma situação de colapso da confiança entre
as famílias e empresas deram partida a um ciclo descendente acelerado do nível
de atividade que o novo governo, que assumiu com o afastamento da presidente
Dilma Rousseff em abril de 2016, não tem sido exitoso em estancar até o
momento.
A contar do último trimestre de 2014 até o
trimestre encerrado em agosto de 2016, o Índice de Atividade do Banco Central
(IBC-BR) despencou 8,2%. A queda no nível de atividade impôs perdas acentuadas
na arrecadação da União, Estados e Municípios. Na comparação entre junho-agosto
de 2014 e o mesmo período de 2016, a arrecadação tributária federal despencou
notáveis 13,3% e a receita do Imposto sobre a Produção Industrial (IPI) encolheu
inacreditáveis 28,2%, já descontada a inflação do período.
O custo social da crise econômica também tem
sido extremamente elevado. Entre o trimestre junho-agosto de 2014 e o mesmo período
de 2016 foram eliminados 2,5 milhões de empregos formais no setor privado, em
uma perda equivalente a 6,7% do contingente de trabalhadores empregados no
segmento.
Disseminou-se a percepção de que a
substituição do governo e a nomeação de uma equipe econômica afinada com o
mercado e comprometida com o ajuste fiscal não apenas deixariam para trás o
período de instabilidade política como provocariam um choque de confiança que
teria o condão de interromper rapidamente a espiral descendente que já se
estendia por período demasiadamente longo. A maioria das projeções dos
especialistas indicava que o nível de atividade se estabilizaria no segundo trimestre e no
terceiro trimestre a economia já voltaria a crescer.
Choque de confiança
Desde março, quando o afastamento da
presidente Dilma Rousseff se tornou evidente, os indicadores de confiança de
empresas e de consumidores se encontram em elevação, notoriamente os
indicadores de expectativas futuras. O Índice Bovespa também passou a registrar
altas sucessivas e se posiciona em meados de outubro mais de 60% acima do seu
mínimo anual alcançado em janeiro. Mas, aparentemente, confiança só não basta.
Do lado da economia real os indicadores não
reagem. Pelo contrário, os resultados de agosto para indústria, serviços e
varejo foram piores do que a média dos três meses antecedentes, assim como o
comportamento do setor exportador. Na verdade, vários indicadores setoriais
sinalizam que a desaceleração no ritmo de piora fora interrompida desde o mês
de julho.
A evolução do índice de Atividade do Banco
Central (IBC-BR) sintetiza a reversão da tendência de estabilização da economia
apontada nos últimos resultados publicados. Na comparação com o trimestre
março-maio de 2016, o IBC-BR do trimestre encerrado em agosto (junho-agosto) registrou
queda de 0,41% praticamente o mesmo ritmo de retração dos trimestres encerrados
em junho e em julho. Ou seja, desde
junho a retração no nível de atividade deixou de desacelerar (ver linha
contínua no Gráfico).
Na série trimestral móvel, que capta melhor o
movimento na margem, já por dois resultados subsequentes, ou seja julho e
agosto, o IBC-BR trimestral acentuou a queda (ver linha descontínua).
Assim, enquanto o IBC-BR do trimestre
abril-maio-junho se apresentou estabilizado (-0,01%) em relação ao trimestre
março-abril-maio, os resultados dos trimestres encerrados em julho e agosto
indicaram aceleração da queda em relação aos trimestres móveis anteriores
(respectivamente, -0,13% e -0,28%).
Redução dos juros
Se a publicação dos resultados de agosto tem
traduzido o desgosto associado ao mês, as projeções para os períodos seguintes também
não têm sido animadoras. Bancos e corretoras já revisaram suas expectativas
adiando para 2017 o início da recuperação do nível de atividade econômica,
enquanto a Confederação Nacional da Indústria (CNI) informa que não espera
crescimento na atividade industrial antes de 2018.
Fonte: Banco Central do Brasil. * A evolução
do trimestre móvel compara o resultado da média trimestral com a do trimestre
anterior com a inclusão de um novo mês e a exclusão de um mês. A evolução do trimestre anterior compara a
média trimestral com a média de três meses anteriores, todos com base na série
livre de feitos sazonais do IBC-BR.
Em entrevista publicada no Valor Econômico em
13 de outubro, o ex-diretor do Banco Central Luiz Fernando Figueiredo
é muito enfático ao observar que se restrições monetárias não forem
decididamente atenuadas há riscos altos de abortar o esperado ciclo virtuoso
que se acredita que seguiria às medidas de ajuste.
Luiz Fernando Figueiredo defende a
redução 400 pontos base ou mais na taxa básica de juros (quatro pontos
percentuais) a partir de outubro de 2016, a fim de
traduzir o ganho de confiança em impulso ao crescimento. Para ele a redução da
Selic não deveria se dar em ritmo muito lento, pois “desta vez, estamos numa
situação tão dramática em termos de atividade e das empresas que, se a gente
começar com um alívio muito lento, o risco não será pequeno de abortarmos
esse processo de virada da economia. Podemos retardar por mais três ou seis
meses, com muito sinistro no caminho” (Valor Econômico
13/10/2016).
A frustração nas projeções de estabilização e
retomada do nível de atividade alarmou governo e especialistas e já se refletiu
na redução de 0,25 pp na taxa básica de juros na reunião do COPOM de outubro. O
Banco Central espera reduções adicionais na taxa de inflação em doze meses para
acelerar a queda nos juros, mas, como alertou o ex-diretor do Banco Central,
pode ser tarde demais. Persiste muita incerteza à frente.
Publicado no Jornal da Cidade, em 23/10/2016
Essa administração excessivamente conservadora das taxas básicas pode atrasar sobremaneira uma recuperação sustentável, frustrando assim rapidamente a base de apoio da opinião pública...
ResponderExcluirIsso. Com a frustração da estabilização, os analistas se dividiram sobre o ritmo de redução da Selic
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