Ricardo Lacerda
A crise política amplificou o custo social das
medidas de ajuste fiscal, que inevitavelmente trariam impactos fortes sobre o
mercado de trabalho e sobre as receitas públicas. A precarização do mercado de
trabalho foi muito acentuada ao longo de todo o ano de 2015, prossegue nesse
primeiro semestre de 2016 e certamente está sendo muito mais profunda e
duradoura do que era previsto no início do segundo mandato da presidente Dilma
Rousseff, quando a situação política ainda não fugira completamente dos
trilhos.
Em 2014, último ano do primeiro mandato da
presidente Dilma Rousseff, mesmo com a economia sofrendo forte desaceleração do
nível de atividade, o contingente de trabalhadores ocupados, sob qualquer tipo
de vínculo no mercado de trabalho, havia crescido em quase um milhão de pessoas.
Na comparação entre o último trimestre de
2013 e o último trimestre de 2014, apesar de o PIB ter recuado 0,3%, o número
de trabalhadores ocupados havia aumentado em 993 mil. Nessa mesma comparação,
mais 445 mil trabalhadores haviam obtido vínculo com carteira de trabalho no
setor privado, segundo os dados da PNAD Contínua do IBGE.
Os sinais de fragilização do mercado de
trabalho já eram claros desde o trimestre maio-julho de 2014, no princípio da
corrida eleitoral, com intensa desaceleração na geração de novas ocupações, mas
o cenário em nada se assemelhava com o que veio acontecer depois que a crise
política paralisou o governo e produziu sua agonia final, que é o momento que
estamos vivenciando atualmente.
2015
Era de se esperar que as inadiáveis medidas
de ajuste fiscal iniciadas ainda no final de 2014 pelo ministro Joaquim Levy
acentuassem o quadro recessivo em curso por alguns trimestres e o mercado de
trabalho inevitavelmente seria impactado negativamente.
No início de 2015, a projeção de mercado era
de que ao final do ano o PIB registraria um recuo de 0,5% e a produção
industrial cairia 1%. No início do segundo trimestre, quando os primeiros
resultados do ano já se mostravam muito piores do que os esperados e o grau de
confiança dos agentes econômicos começava a despencar de vez, as expectativas
de mercado apontavam para queda de 1% no PIB e de 2,6% na atividade industrial.
Ao final o ano de 2015, o PIB havia declinado
3,8%, a produção física da indústria de transformação, inacreditáveis 9,9%, e o
conjunto da indústria geral, 8,3%.
O massacre no mercado de trabalho
Na comparação entre o último trimestre de
2014 e o mesmo trimestre de 2015, a economia brasileira fechou 630 mil ocupações
(Ver Gráfico), sob qualquer tipo de vínculo, tragédia que foi acompanhada pela intensa
deterioração na qualidade da inserção no mercado de trabalho. Mais de um milhão
de empregos formais no setor privado foram encerrados e outros 449 mil empregos
sem carteira assinada tiveram igual destino. Com o colapso das finanças
públicas nas três esferas de governo, o setor público enxugou 283 mil vínculos
empregatícios.
Fonte: IBGE.PNAD Contínua.
Frente ao fechamento das vagas no setor
público e no setor privado, um contingente de 1,1 milhão de trabalhadores foi procurar
alternativa de sustento por conta própria e outras 297 mil pessoas saíram em
busca de emprego doméstico. Em linhas gerais, esse é o saldo que o agravamento
da crise política produziu sobre o mercado de trabalho brasileiro em 2015:
perdas de postos de trabalho, aumento das relações trabalhistas precarizadas, expansão
do empreendedorismo de subsistência e o forte incremento do emprego doméstico,
em proporções muito superiores ao que o ajuste fiscal por si provocaria.
2016
No primeiro trimestre de 2016, frente às
expectativas de um ano antes de que o nível de atividade já estaria em plena
recuperação nesse momento, a economia permanecia sem perspectivas imediata de
retomada e o mercado de trabalho continuava desocupando milhares de pessoas. O
colapso no cenário político paralisou de uma vez a gestão da economia, com
resultados trágicos sobre o nível de atividade e sobre o mercado de trabalho.
Na comparação entre o primeiro trimestre de
2015 e o primeiro trimestre de 2016, o contingente de pessoas que perderam
ocupação alcançou 1,38 milhão, sendo que os vínculos com carteira de trabalho
no setor privado recuaram impressionantes 1.435.000. Somente dois tipos de
vínculos com o mercado de trabalho cresceram no período, o de trabalhadores por
conta própria e os trabalhadores domésticos. Um retrocesso, repito,
impressionante, com 1,4 milhão de trabalhadores buscando alternativa de
sobrevivência trabalhando por conta própria e outros 202 mil buscando ocupações
domésticas, muito além do que o ajuste econômico produziria na ausência do
cerco político ao governo.
Tabela: Pessoas de
14 anos ou mais ocupadas, segunda a posição na ocupação. Em mil pessoas.
POSIÇÃO
NA OCUPAÇÃO
|
Jan-Mar
2015
|
Jan-Mar
2016
|
Taxa
(%)
|
Variação
absoluta
|
EMPREGADO NO SETOR PRIVADO COM CARTEIRA
(exclusive trabalhadores domésticos)
|
36.066
|
34.631
|
-4,0
|
-1.435
|
EMPREGADO NO SETOR PRIVADO SEM CARTEIRA
(exclusive trabalhadores domésticos)
|
10.047
|
9.720
|
-3,3
|
-327
|
TRABALHADOR DOMÉSTICO
|
6.019
|
6.221
|
3,4
|
202
|
EMPREGADO NO SETOR PÚBLICO (inclusive servidor estatutário e militar)
|
11.347
|
10.975
|
-3,3
|
-372
|
EMPREGADOR
|
4.076
|
3.725
|
-8,6
|
-351
|
CONTA PRÓPRIA
|
21.773
|
23.187
|
6,5
|
1.413
|
TRABALHADOR FAMILIAR AUXILIAR
|
2.695
|
2.180
|
-19,1
|
-515
|
TOTAL
|
92.023
|
90.639
|
-1,5
|
-1.384
|
Fonte: IBGE.PNAD Contínua.
Publicado no Jornal da Cidade, 08/05/2016
Mas a crise política só agravou essa "crônica da morte anunciada" !!!
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