Ricardo Lacerda
O governo central comemorou efusivamente, com
a cumplicidade mais do que benevolente dos meios de comunicação, o terceiro
crescimento sucessivo do PIB trimestral, mesmo tendo o resultado do 3º
trimestre registrado aumento de apenas 0,1%, quase traço.
O esforço publicitário na divulgação do
resultado do PIB integrou a mobilização geral que se assiste nas últimas
semanas pela derradeira tentativa do governo de votar a reforma da previdência
ainda esse ano. Do ponto de vista do governo, é preciso convencer a população
que a economia encontrou o rumo da retomada do crescimento e que a reforma
previdenciária é etapa fundamental para consolidar o ajuste e assegurar que não
haverá risco de reversão na recuperação econômica. A julgar pelas pesquisas de
opinião, o público não demonstra muito entusiasmo, nem em relação à recuperação
da economia, muito menos com a reforma previdenciária.
Afinal, o crescimento de 0,1% no 3º trimestre
foi bom ou foi ruim? Significou que a economia brasileira confirmou a retomada do
crescimento ou revelou sua debilidade? A resposta mais razoável para tais
questões é: depende das expectativas que cada um tem em relação ao que o
crescimento econômico deve promover e da velocidade que a economia deveria se
expandir para atender minimamente tais expectativas. Até me arriscaria avaliar que
se o objetivo principal da retomada é proporcionar a recuperação de emprego e
renda para a população e promover o reequilíbrio das finanças públicas, mesmo
que em um horizonte de prazo bastante largo, poder-se-ia afirmar que o
resultado do PIB é um copo ¼ cheio e ¾ vazios.
Sustentabilidade e fragilidade
É importante registrar que o anúncio do PIB
do 3º trimestre foi acompanhado pela revisão para cima dos resultados dos dois
trimestres anteriores, de 1% para 1,3%, no 1º trimestre, e de 0,2% para 0,7%,
no 2º trimestre. Com isso, as projeções
de crescimento para 2017 devem ser revistas levemente para cima. O Relatório
de Mercado- Focus elevou de 0,73% para 0,89% a projeção do crescimento do PIB
para 2017, sem impacto, todavia, no crescimento para 2018.
Se
a projeção anual foi revista a maior, uma correção mais de caráter estatístico
do que uma mudança de fundo na atividade econômica, os resultados trimestrais
assinalam, sem sombra de dúvida, uma desaceleração do ritmo de crescimento na
margem, de 1,3%, no 1º trimestre, para 0,7%, no 2º trimestre e, finalmente, de
0,1% no 3º trimestre.
Alguns
analistas questionaram se essa evolução não poria em dúvida a própria
sustentabilidade da retomada do crescimento, que poderia ter sido associado nos
dois primeiros trimestres a fatos extraordinários, não recorrentes;
respectivamente o salto na produção agrícola, no 1º trimestre, e o impacto da
liberação dos recursos do FGTS e do PIS sobre o consumo das famílias, no 2º
trimestre e ainda com impacto no 3º trimestre.
Ainda
que esses efeitos tenham participado de fato com peso significativo nos
resultados do PIB na primeira metade do ano, a abertura dos dados, tanto do
lado da produção, quanto do lado do dispêndio, parece afastar essa preocupação
de que a recuperação não venha se mostrar sustentável nos próximos trimestres,
sem deixar de confirmar, por sua vez, que ela tem sido lenta e vacilante e que
vai demorar muitos trimestres até que a população perceba melhorias mais
robustas. Os congressistas estão conscientes disso.
Produção
O
Gráfico 1 apresenta a evolução dos PIBs trimestrais em relação aos trimestres
imediatamente anteriores, já livre dos efeitos sazonais, segundo os setores e
alguns subsetores de atividade mais
significativos.
No
1º trimestre de 2017 foi a recuperação da produção agrícola, depois dos efeitos
da estiagem no ano anterior, o principal fator do incremento do PIB, mas o
início da recuperação da indústria de transformação, depois de anos de
retração, e o incremento do comércio
também contribuíram.
Depois
do forte impulso no 1º trimestre, o setor agropecuário apresentou resultados
negativos nos 2º e 3º trimestres, sem prejudicar o incremento anual que deverá
ser superior a 10%.
O
incremento do PIB no 2º trimestre, pelo lado da oferta, foi explicado principalmente
pela expansão das atividades comerciais e pelos subsetores de transporte e de
outros serviços. O crescimento desse período pode ser parcialmente atribuído à
expansão do poder de compra das famílias associado à liberação de mais de R$ 40
bilhões de recursos do FGTS.
No
3º trimestre, indústria de transformação, comércio e, em menor grau, serviços
puxaram para cima o crescimento da economia, enquanto o setor agropecuário empurrou
para baixo. Assim, excluídos fatores muito específicos do setor agropecuário,
muitas das mais importantes atividades econômicas apresentaram crescimento
relativamente bom no 3º trimestre, permanecendo, todavia, a preocupação com a
construção civil, que tem peso muito significativo no PIB e no emprego continua
sem se mexer do lugar.
Fonte: IBGE. CNT
Dispêndio
O exame dos componentes do dispêndio provê
elementos adicionais para avaliar o comportamento do PIB em 2017. Como
apresentado no Gráfico 2, o consumo da família apresentou incremento robusto,
tanto no 2º quanto no 3º trimestres, em parte por conta da redução da inflação
e dos juros nominais, em parte por conta da liberação dos recursos do FGTS, em
parte por conta do incremento da ocupação, mesmo com vínculos precários de
trabalho. O consumo do governo tem se mantido em ligeira retração ao longo de
todo ano.
Um aspecto interessante é que o setor externo,
que vinha contribuindo em termos líquidos para a expansão do PIB, deixou de
fazê-lo no 3º trimestre, não porque as exportações de bens e serviços tenham
deixado de crescer, e sim porque o incremento do nível de atividade interna
impulsionou a demanda bastante comprimida de bens, seja para consumo das
famílias, seja para a atividade produtiva. Os investimentos apresentaram
evolução positiva, mas a partir de uma base de comparação muito rebaixada.
Em resumo, do ponto de vista do dispêndio, os
gastos do governo puxam o freio da economia, enquanto o consumo das famílias,
em parte por conta do incremento da ocupação, em parte por conta dos juros mais
baixos nas operações de crédito, põe alguma tração para cima. A resultante das forças não poderia ser mesmo
espetacular, mas é razoável supor que a recuperação, em ritmo lento e desigual
setorialmente, tenha continuidade nos próximos trimestres.
Fonte: IBGE. CNT
Publicado no Jornal da Cidade, em 10/12/2017
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