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Praça São Francisco, São Cristovão-SE. Patrimônio da Humanidade

segunda-feira, 29 de junho de 2015

Novas projeções para 2015 e 2016

Ricardo Lacerda

O Banco Central publicou na semana passada a edição de junho do Relatório de Inflação, de periodicidade trimestral, que avalia a evolução dos preços e explicita os cenários externo e interno que orientaram as decisões do Comitê de Política Monetária (Copom).

A leitura do relatório pode ser útil para buscar entender qual é o plano de vôo das autoridades monetárias para a economia brasileira entre o atual momento de ajuste, que empurra para baixo o nivel de atividade, o emprego, os rendimentos e o consumo, em direção a um novo período de crescimento econômico.

Em relação à edição anterior do relatório, de março de 2015, não há grandes mudanças no que tange ao cenário internacional. O relatório entende que a normalização progressiva da política monetária nos países centrais, recorrentemente postergada, provocará em algum momento nos próximos dois anos um deslocamento para cima na trajetória dos juros, aumentando a volatilidade, os riscos e o custo de acesso ao financiamento externo para as economias emergentes.

Aponta também uma maior convergência nas taxas de crescimento entre as economias maduras (EUA, zona do euro e Japão), mas não se ilude em relação à aceleração do ritmo da retomada, assinalando que as taxas de crescimento do PIB das economias centrais se mostraram baixas e abaixo do crescimento potencial no passado recente.

Recessão

O relatório não deixa margens a dúvidas que o período de ajuste na economia brasileira está apenas começando. A taxa de expansão do PIB em quatro trimestres foi negativa em 0,9% no 1º trimestre de 2015 e deverá finalizar o ano com uma retração de 1,1%.

Em algum momento entre o último trimestre de 2015 e o primeiro trimestre de 2016 o ritmo de queda do PIB deverá ser amortecido pela combinação de alguns fatores que conduziriam até um resultado trimestral positivo a partir do segundo trimestre de 2016, na projeção de mercado, fechando o próximo ano com crescimento inferior a 1%. Em 2017, finalmente, a economia estaria pronta para alcançar taxas de crescimento superiores à expansão da população, voltando a apresentar crescimento do PIB per capita. Trata-se, portanto, de uma trajetória dura, de muitas dificuldades e incertezas ainda pela frente.

O fundo do poço do nível de atividade econômico se situaria na virada para 2016, de forma que uma muito suave retomada seria iniciada entre o segundo e o terceiro trimestre daquele ano. O resultado no acumulado em quatro trimestres deverá ser ainda negativo em março de 2016 (ver Gráfico) mas o PIB trimestral deverá parar de se retrair e nos trimestres seguintes voltar a crescer a taxas relativamente baixas, ainda que moderadamente crescentes.

Componentes da demanda

No segundo semestre de 2015, os componentes do dispêndio interno (consumo das famílias, consumo do governo e investimento) deverão acentuar a retração.

A elevação da taxa de desemprego e as perdas nos rendimentos do trabalho impelirão quedas acentuadas no consumo das famílias, com forte impacto sobre o nivel de atividade dos setores de comércio e serviços, enquanto o ajuste fiscal combinado com a queda na arrecadação tributária realizarão a tarefa de comprimir o consumo do governo em suas três esferas.

O relatório não guarda ilusões de que o ajuste fiscal per si vá proporcionar de imediato aumento dos gastos de investimentos motivado por supostos ganhos de confiança na economia. A Formação Bruta do Capital Fixo deverá continuar despencando até o início de 2016 (ver Gráfico).

Impulso externo

O impulso externo deverá se constituir no principal fator para que a queda do nível de atividade seja amortecida, em um primeiro momento, e depois, já mais avançado em 2016, a economia volte a crescer. Aparentemente, o impulso dado pelo setor externo se originaria menos da retomada da economia mundial, embora isso possa se tornar importante com o tempo, e mais em decorrencia de dois outros fatores.

As exportações de bens e serviços que se retraíram nos quatro trimestres encerrados em março de 2015 passariam a apresentar taxas positivas em torno de 5%, movidas pelos ganhos de competitividade proporcionados pela valorização do câmbio e pelos incrementos de excedentes exportáveis gerados pela recessão. De outra parte, a retração das importações de bens e serviços já verificada em dois trimestres seguidos, na série acumulada em quatro trimestres, seguiria se intensificando, também pela combinação de recessão e de câmbio mais elevado.

Passado o período mais duro de corte de gastos públicos e dos efeitos do realinhamento dos preços administrados (energia elétrica e combustíveis) sobre o IPCA em doze meses, as taxas de juros poderiam iniciar uma trajetória de declínio. O poder de compra das famílias seria então favorecido pela queda da inflação e pela redução dos juros e o consumo voltaria progressivamente a se expandir.


Fonte: BCB, Relatório de Inflação. Junho de 2015. Obs: *projeção.

No cenário básico, com a Selic em 13,75% ao ano, o relatório projeta inflação de 9,0% em 2015, 4,8% em 2016 e de 4,5% no segundo trimestre de 2017. É razoável pensar que tal cenário de transição pode se concretizar? Tal plano de voo é consistente e viável?


Publicado no Jornal da Cidade, em 28/06/2015


segunda-feira, 22 de junho de 2015

A seca e a safra(2)


Ricardo Lacerda

Os efeitos da estiagem sobre a produção agrícola do Nordeste foram atenuados nos últimos três anos. Os impactos mais duros da seca do Nordeste se concentraram em 2011 e 2012. Em duas das três culturas emblemáticas do semiárido nordestino (milho e feijão), as safras encontram-se em recuperação ou expansão desde 2013. Apenas no cultivo da mandioca a retomada da produção foi postergada para 2014. Ainda assim, extensas áreas da região devem apresentar em 2015 níveis de produção bem inferiores aos do período anterior ao início do período seco.

O impacto da seca foi mais agudo e mais duradouro nos estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco. Foi menos intenso e terminou mais cedo nos estados situados nos extremos da região Nordeste.

O estado do Maranhão não possui nenhum município integrante da sub-região do semiárido nordestino e foi relativamente pouco atingido pela estiagem. A Bahia e o Piauí foram fortemente impactados pela estiagem nas porções dos seus territórios que fazem parte do semiárido mas as safras estaduais não caíram tanto porque as áreas de cerrados, o Sul do Piauí e o Oeste da Bahia, são grandes produtoras agrícolas e não foram atingidas.

Nos casos de Sergipe e Alagoas, a estiagem teve forte impacto na produção agrícola mas o seu período mais agudo foi relativamente mais curto do que na maioria dos estados da região. As quantidades produzidas das três culturas em Sergipe e Alagoas apresentaram recuos muito acentuados nos primeiros anos de estiagem, notadamente em 2011 e 2012, mas nos anos seguintes os efeitos foram muito atenuados, como indica a forte retomada da produção do milho e do feijão nesses estados (Ver gráficos 1, 2 e 3).

Semiárido

As perdas de produção foram especialmente elevadas nos municípios integrantes do semiárido nordestino. Na comparação com o ano anterior, as quantidades produzidas de milho, feijão e mandioca despencaram no semiárido nordestino em 2012. As perdas foram especialmente elevadas no cultivo de feijão, cuja quantidade produzida encolheu 81%. Nas áreas semiáridas do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Alagoas as quebras da produção naquele ano ultrapassaram 90%. 

A produção de milho recuou 2/3 no semiárido. Nesses mesmos estados, a queda na safra de milho no semiárido em 2012 ultrapassou 80%. No Ceará, Paraíba e Pernambuco, a produção de milho permaneceu rebaixada até 2015, enquanto no Rio Grande do Norte e Alagoas o cultivo apresentou forte retomada nos anos mais recentes (ver Gráficos)

A queda na produção de mandioca do semiárido em 2012 foi de cerca de 1/3. A produção de mandioca do semiárido alagoano ainda resistiu em 2012, somente despencando em 2013.
A redução da safra de mandioca no semiárido sergipano foi menos acentuada do que na maioria dos estados da região. Em 2013, a produção do semiárido sergipano era 17% menor do que em 2011, enquanto no semiárido piauense caíra 78%, nas áreas de semiárido potiguar, 76%, e nas da Bahia, 56%.

Ainda vai ser necessário aguardar a publicação de dados mais pormenorizados para avaliar a situação real da produção agrícola no semiárido nordestino. Com as informações disponíveis, é possível inferir que em uma parcela muito ampla do seu território, principalmente as áreas do semiárido entre Ceará e Pernambuco, as principais culturas agrícolas permanecem com níveis de produção muito rebaixados. 

Nos demais estados que possuem municípios que integram o semiárido (Piauí, Bahia, Sergipe e Alagoas), ainda que as safras das três culturas examinadas tenham apresentado forte recuperação nos anos recentes, há ainda áreas em que os efeitos da estiagem não cessaram inteiramente.



Fonte: IBGE. Pam e LSPA (2014 e 2015, edição de maio de 2015)

Fonte: IBGE. Pam e LSPA (2014 e 2015, edição de maio de 2015)

Fonte: IBGE. Pam e LSPA (2014 e 2015, edição de maio de 2015)





Publicado no Jornal da Cidade, em 21/06/2015 

domingo, 14 de junho de 2015

A seca e a safra (1)


Ricardo Lacerda

O país recebeu recentemente uma notícia auspiciosa sobre a agricultura do Nordeste. Em 2015, pela primeira vez, a produção de grãos do Nordeste deveria superar a da região Sudeste. Das 201 milhões de toneladas de cereais, leguminosas e oleaginosas projetadas para o Brasil pelo Levantamento Sistemático da Produção Agropecuária (LSPA) de abril, o Nordeste responderia por 18,9 milhões  de toneladas e o Sudeste por 18,3 milhões de toneladas, respectivamente 9,4% e 9,2% do total. As regiões Centro-Oeste e Sul, pela ordem, com cerca de 40% cada, continuariam liderando a produção de grãos.

Na edição de maio do LSPA, o IBGE revê esses números e apresenta, digamos assim, um empate técnico, com ligeira vantagem ainda para o Sudeste em 2015. Na nova projeção para 2015, a região Sudeste deverá produzir 18,7 milhões de toneladas de grãos enquanto para a região Nordeste foram projetadas 18,5 milhões de toneladas, correspondendo, cada uma, a 9,1% do total nacional (ver Gráfico 1).

Comparativamente à safra de 2014, a produção de grãos de Nordeste cresceu 17,7%, enquanto a da região Sudeste aumentou 4,2%. O Mato Grosso continua liderando a produção nacional de grãos respondendo por quase uma em cada quatro (24,2%) toneladas produzidas no país.


Fonte: IBGE. LSPA.Maio de 2015.

MAPITOBA

A revisão da projeção não diminuiu a importância da extraordinária expansão agrícola de parte do território regional representado pelo oeste da Bahia e pelo sul do Maranhão e do Piauí que em conjunto com área ocidental do estado de Tocantins formam a mesorregião conhecida como MAPITOBA, acrônimo das sílabas iniciais dos estados, uma das principais fronteiras agropecuárias do país.  

Ainda que em a mesorregião em grande parte integre o Nordeste as suas condições agrícolas diferem substancialmente de outras áreas do território regional, em particular do semiárido nordestino que periodicamente sofre os efeitos da estiagem.

A seca

Muito se tem falado que a estiagem atual, iniciada em 2012, é provavelmente a mais intensa desde a década de 1970. Os prejuízos sobre a produção agrícola foram particularmente acentuados em 2012, ainda que se estendam até o ano atual em algumas áreas do semiárido. Em comparação a 2011, as duas culturas temporárias mais disseminadas na sub-região  foram fortemente impactadas.

A produção de milho nos municípios do semiárido da região (excluindo os municípios do norte de Minas Gerais) despencou 68% entre 2011 e 2012 (ver Gráfico 2). A quantidade produzida de mandioca recuou 1/3 e a do feijão, outro cultivo muito praticado,  caiu 81%.

Em 2013, último ano com dados disponíveis por município e por sub-região , os cultivos de milho e de feijão no semiárido já principiavam forte retomada, enquanto a de mandioca seguia despencando. Nos três casos a quantidade produzida em 2013 se situou muito abaixo do volume de 2011, antes do início da estiagem.

Fonte: IBGE. PAM.


2014 e 2015

Há indícios de forte recuperação da atividade agrícola no semiárido nordestino em 2014 e 2015, ainda que não estejam disponíveis os dados por município que possibilitam agregar os resultados por sub-região .

Os municípios do semiárido respondem por uma parcela bastante grande da produção de milho, mandioca e feijão do Nordeste. Em 2011, último ano em que a safra não foi afetada pela atual seca, a sub-região  do semiárido produzia 47% do milho, 42% da mandioca e 76% do feijão obtido no Nordeste. Com os efeitos da estiagem, essas participações se retraíram, em 2012, para 20%, 37% e 48%, mas se recuperaram parcialmente em 2013.

As projeções de safra do LSPA mostram que as três culturas emblemáticas do semiárido nordestino apresentaram recuperações vigorosas nos estados da região em 2014 e 2015 (ver Gráfico 3). No casos do milho e do feijão, as safras nordestinas de 2015 deverão alcançar, respectivamente, produções 46% e 8% superiores às de 2011.

Mesmo no caso do cultivo da mandioca, em que a produção ainda não alcançou o pico anterior à estiagem, os anos de 2014 e de 2015 tiveram incrementos bem acentuados, indicando que o pior do período da seca já passou, pelo menos para a maior parte da região. No próximo artigo, serão analisados os dados por estado, a fim de mostrar como os resultados se apresentaram bem distintos entre eles.



Fonte: IBGE. PAM e LSPA (2014 e 2015)


Publicado no Jornal da Cidade, em 14 de junho de 2015


segunda-feira, 8 de junho de 2015

O PIB do 1º trimestre

Ricardo Lacerda

O primeiro resultado trimestral do PIB da gestão Joaquim Levy à frente do ministério da fazenda já sinaliza os efeitos da política de ajuste sobre o nível de atividade. O PIB do 1º trimestre recuou 0,2%.

Muitos podem discordar que a retração do nível de atividade tenha sido causada pelas medidas de ajustes mas não é fácil sustentar uma posição como essa.  As medidas de ajuste, que impactaram fortemente o poder de compra da população, jogaram água no moinho da recessão, ou seja adicionaram novas forças de retração da demanda em uma economia que já apresentava sinais de anemia desde o segundo semestre de 2013. Os dados das contas nacionais trimestrais não deixam dúvidas em relação a isso.

Retração dos dispêndios

Ao longo de toda série das contas trimestrais, iniciada em 1996, somente em três trimestres coincidiu de que os três componentes fundamentais do dispêndio interno, por ordem de importância, o consumo das famílias, o consumo do governo e o investimento (FBCF) tenham recuado em relação ao trimestre anterior, na série com ajuste sazonal.

A primeira vez em que se verificou tal coincidência foi no último trimestre de 1998 quando se sabia que a âncora cambial do plano real não sobreviveria muito além do período da reeleição presidencial e que o país enfrentaria em pouco tempo uma crise de financiamento no seu balanço de pagamentos, em um efeito dominó em andamento na economia mundial. Os três componentes voltaram a recuar no último trimestre de 2008 em pleno furacão da crise financeira internacional.

No primeiro trimestre de 2015, o consumo das famílias, que responde por mais de 60% dos gastos do país recuou incríveis 1,5%, o terceiro maior declínio em toda série histórica, somente inferior aos do 4º trimestre de 2008 e do 1º trimestre de 1997 (ver Gráfico 1).  


Fonte. IBGE. CNT.

Ao lado da queda acentuada nos dispêndios das famílias, contidos que foram pela restrição ao crédito e pelo piora abrupta no mercado de trabalho, os gastos do governo também apresentaram forte redução, caindo 1,3% no trimestre, sempre na série com ajustes sazonais.

Os investimentos também se retraíram 1,3%, com o agravante de que caíram em relação a uma base de comparação já rebaixada. Resumo da ópera: as medidas de ajuste fiscais deprimiram fortemente os gastos das famílias e do governo, como era esperado, e produziram a taxa negativa do PIB do 1º trimestre.

O setor externo não deu, até o momento, a contribuição positiva que poderia se esperar como resultado da combinação da apreciação cambial e do esfriamento da economia. O resultado do setor externo sobre a taxa de crescimento do PIB foi praticamente neutro no período.
Se há algo a comemorar em relação ao saldo de exportações de bens e serviços foi que ele deixou de piorar em termos substantivos, como vinha acontecendo nos trimestres anteriores. Vai ser necessário esperar mais alguns trimestres para perceber uma reação, que se espera bem mais forte, no saldo entre exportações e importações de bens e serviços.

Setores

Em termos setoriais, a grata surpresa foi o desempenho do setor agropecuário que se recupera dos efeitos da longa estiagem. No 1º trimestre de 2015, a agropecuária apresentou crescimento de 4,7% em relação ao trimestre anterior. Trata-se, todavia, apenas do início da retomada do setor que apresentou trajetória crítica entre os terceiros trimestres de 2013 e 2014 (ver Gráfico 2).

No setor industrial, a indústria extrativa, com destaque para a exploração de petróleo, vem apresentando resultados extraordinários, crescimento de 3,3% no trimestre e 10,3% no acumulado de quatro trimestres. Mas o conjunto da atividade industrial continuou recuando puxada para baixo pela indústria de transformação. A construção civil, mesmo tendo apresentado crescimento em dois trimestres sucessivos, continua amargando forte retração em quatro trimestres (-4%).

Serviços

Menos comum é a queda do PIB nas atividades de serviços, muito abrangente no período. Recuaram o comércio, as atividades de transporte e armazenagem, a intermediação financeira, a administração pública e o amplo segmento de outros serviços. No acumulado de quatro trimestres, foi a primeira vez que o conjunto das atividades de serviços registrou queda, desde o início da série em 1996.



Fonte. IBGE. CNT.

Publicado no Jornal da Cidade em 07 de junho de 2015

segunda-feira, 1 de junho de 2015

A crise e o desemprego depois de 2008

Ricardo Lacerda

Muitos de nós economistas esquecemos em algumas situações que a economia trata de pessoas. Os números do PIB, juros, inflação/deflação, câmbio, ajuste fiscal, balanço de pagamentos não se encerram em si próprios.

Na edição de maio de 2015 do relatório Perspectivas Sociais e do Emprego no Mundo, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) dimensiona o impacto da crise financeira internacional sobre o mercado de trabalho, tanto em termos de desemprego quanto da precarização nas relações de trabalho.

O relatório estima que o número de desempregados ao final de 2014 se posicionou cerca de 30 milhões acima da situação anterior à crise de 2008. A edição de janeiro do relatório havia apresentado os números de forma mais detalhada. Entre 2008 e 2009 o contingente de desempregados na economia mundial saltou de 179 milhões de pessoas para 199 milhões de pessoas (ver Gráfico).


Fonte: OIT. Trends Econometric Models. Outubro de 2014


Projeções

A instituição estima que 40 milhões de jovens entram no mercado de trabalho anualmente no mundo e que um crescimento econômico robusto é fundamental para abrir postos de trabalho para essas pessoas, o que não vem ocorrendo já por sete longos anos.

No primeiro momento da crise, o mercado de trabalho nas economias emergentes não foi tão impactado. O Brasil, por exemplo, continuou gerando empregos formalizados até muito recentmente e a taxa de desocupação no país caiu de 8,1%, em 2007, para 6,5%, em 2013.

Nos últimos dois anos a geração de emprego se tornou mais débil nas economias emergentes e as projeções da OIT apontam para aumento na taxa de desemprego em muitas das principais economias emergentes, como Rússia, Brasil e África do Sul.

O mercado de trabalho nos países de economia avançada sofreu com intensidade muito maior os efeitos da crise. Em alguns deles, como a França e a Itália, a taxa de desemprego se aproxima, no primeiro caso, e ultrapassa, no segundo, de 10% da força de trabalho, sem perspectivas de melhorias expressivas até 2017.
Mesmo com a recuperação no mercado de trabalho nos útimos anos em grandes economias, como as dos EUA, Reino Unido e Alemanha, a taxa de desemprego entre os países de economia avançada se situou ao final de 2014 dois pontos percentuais acima da taxa de 2007.

Precarização

A edição de maio do relatório da OIT sublinha que desde a deflagração da crise financeira em 2008 a relação de trabalho se tornou menos segura o que, inclusive, enfraquece a demanda e penaliza a produção. Como o sacrifício recaiu desproporcionalmente sobre os segmentos mais pobres da população economicamente ativa, notadamente nos países ricos, a piora no mercado de trabalho produziu aumento de desigualdades e colocou novos e maiores desafios para as políticas públicas em termos de ampliação da cobertura da proteção social.

O relatório denuncia que a relação de emprego estável em tempo integral perdeu peso nas economias avançadas e corre o risco de deixar de ser o tipo de vínculo dominante. Entre os países de economia emergente, apesar do ciclo de crescimento anterior que favoreceu a formalização do trabalho, o emprego informal continua a ser muito disseminado. Ademais, a OIT alerta que nas atividades menos nobres das cadeias de abastecimento globais disseminam-se relações de trabalho de curta duração e com horários irregulares.

Em tempos de crise, eleva-se o risco da corda arrebentar do lado mais fraco. Nesse momento da vida brasileira em que a quase totalidade dos segmentos empresariais e uma parcela ampla da classe política e economistas se perfilam em favor de, sob pretexto de regulamentar, ampliar a prática da terceirização da força de trabalho, o relatório da OIT serve de alerta.

Cadeias globais

A OIT entende que mudanças na regulação do trabalho são necessárias para dar conta da nova realidade. A inserção dos países pobres nas cadeias globais de produção e comercialização tem ocorrido muitas vezes sem observar as garantias minímas para os trabalhadores.
A instituição sublinha que os trabalhadores submetidos às novas relações de trabalho, mais precarizadas, como trabalhadores temporários e informais, trabalhadores em tempo parcial, en muitos das quais há um predomínio de mulheres, são mais afetados pela pobreza e pela exclusão social e que adotar políticas públicas que propiciam uma cobertura social daqueles que estão submetidos às relações mais frágeis vai ser um dos principais desafios dos próximos anos. Nesse contexto, defender o avanço da terceirização, como alguns propõem para o Brasil é um grande equívoco.

Publicado no Jornal da Cidade, em 31 de maio de 2015