Ricardo
Lacerda
As implicações trazidas pelas mudanças na regulação da economia
brasileira nos anos noventa nem sempre são compreendidas em sua integralidade pelas
gerações de economistas e planejadores públicos que acalentaram por décadas e
ajudaram a construir o projeto desenvolvimentista de Sergipe.
As novas formas de funcionamento da economia brasileira inauguradas
naquela década, com a exposição do mercado interno à competição de produção oriunda
em qualquer paralelo do planeta, com a desregulamentação da atividade
produtiva, muito especificamente dos pólos das indústrias de base, e com a
saída quase completa das empresas estatais da atividade industrial e consequente
desmantelamento do chamado Setor Produtivo Estatal (SPE), condenaram
definitivamente as possibilidades do principal projeto estruturador de Sergipe,
idealizado nos anos setenta e oitenta, o seu polo cloroquímico.
Quando em março de 1988, o decreto 95.813 de criação do Pólo
Cloroquímico de Sergipe foi assinado pelo presidente José Sarney, as condições
concretas de sua implantação eram muito frágeis e se tornaram definitivamente deslocadas dos novos tempos após as
desregulamentações procedidas na década seguinte. Ver decreto presidencial em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1980-1989/d95813.htm.
Novos determinantes
Com o recuo do papel do estado na economia e com a abertura do mercado
interno à competição com os importados alijou-se do espectro das políticas
econômicas, por quase quinze anos, uma ação mais orientada do governo federal para
o desenvolvimento regional.
A partir dos anos noventa, o desenvolvimento industrial dos estados
situados nas regões mais pobres passaria a depender essencialmente da
capacidade de atrair investimentos privados por meio de atrativos fiscais e
outros benefícios. A política de indução de investimentos produtivos por parte
do governo federal para as regiões mais pobres foi desmobilizada, restando
apenas os instrumentos constitucionais, como o FNE.
Emprego industrial
O emprego industrial em Sergipe apresentou-se em
declínio ao longo de quase toda a década de noventa, voltando a reagir apenas
após a desvalorização cambial promovida no início de 1999.
Na comparação entre os anos extremos, a indústria
geral, que inclui a indústria de transformação e a indústria extrativa mineral,
gerou meros 262 postos formais de trabalho, equivalentes a um incremento de 1%.
A título de comparação, na década seguinte, entre 2000 e 2010, foram criados 19.823 empregos formais na indústria sergipana,
equivalentes a um incremento de 75% (ver Gráfico).
O corte de emprego foi especialmente duro entre
1990 e 1995, quando foram eliminados 6.557 postos de trabalho na indústria
sergipana. Entre 1999 e 2000 iniciou-se uma recuperação vigorosa na geração de
empregos industriais em função do impacto positivo causado pela desvalorização
cambial, momento a partir do qual a política de atração de investimentos por
meio de incentivos fiscais começou a produzir resultados mais robustos, além da
recuperação do emprego no setor sucroalcooleiro.
Fonte: MTE/RAIS
Um fato significativo na trajetória da produção industrial nas regiões
mais pobres nesse período decorreu da pressão competitiva externa sobre a
estrutura industrial, potencializada pela valorização cambial vigente até final
de 1998.
Tais pressões findaram por provocar alguns movimentos espaciais
importantes, com destaque para a relocalização de investimentos em atividades
intensivas em trabalho das regiões mais industrializadas (Sudeste e Sul) para as
regiões mais pobres (Nordeste, Norte e Centro-Oeste), motivida pelo diferencial
de salários e pelos incentivos fiscais concedidos.
Setorial
No caso de Sergipe, presenciam-se na década de noventa, além do fim do
ciclo dos investimentos das estatais em sua indústria de base, o encolhimento
do setor têxtil, fortemente impactado pela competição com os importados, e
expansão do emprego na indústria calçadista, representativa do movimento de
relocalização citado acima.
A tabela apresentada resume a evolução do emprego por setor e subsetor
da indústria geral entre 1990 e 2000, de acordo com alguns subperíodos
significativos.
Entre 1990 e 1994, a indústria geral de Sergipe viu serem eliminados
4.213 empregos formais. Foi o subperíodo mais difícil porque combinou exposição
aos produtos inmportados com baixo crescimento do mercado interno. O corte do
emprego industrial foi generalizado, atigindo quase todos os subsetores da
indútria de transformação, as exceções foram a indústria de calçados e a de
madeira e mobiliário. O emprego no conjunto da indústria geral foi reduzido de
25.992 para 21.022 nesse subperíodo (ver Tabela. Estão marcadas as células em
que o emprego no setor ou subsetor retraiu-se em relação ao ano da coluna
anterior).
Entre 1994 e 1996, o emprego industrial continuou se retraindo, mas o
impacto ficou fortemente concentrado na cadeia têxtil-confecção, que perdeu quase
três mil postos de trabalho, que se somaram a outros 1.587 empregos cortados no
subperíodo anterior.
Finalmente, no suberíodo 1996-2000, o número de
empregos formais inicialmente parou de cair para se ampliar com vigor após a
desvalorização cambial de 1999, refletindo-se no quantum de emprego gerado
naquele ano e em 2000. Na comparação entre 1996 e 2000, foram criados 5.232
empregos industriais, abrangendo não apenas a recuperação parcial no subsetor
têxtil, como a expansão nas atividades de fabricação de acúcar e etanol e um
forte incremento no emprego na indústria calçadista e na atividade de produção
de minerais não metálicos (cimento).
Considerando-se a década como um todo, a indústria têxtil sofreu um
forte revés do qual nunca viria a se recuperar plenamente; a indústria de
calçados firmou-se no estado, com a atração de empresas oriundas das regiões
mais industrializadas, e prosseguiu o crescimento do emprego naquelas
atividades industriais que acompanham a expansão habitacional, como os
subsetores de madeira e móveis e de produtos metálúrgicos, além da atividade
sucroalcooleira.
Os espaços para novos investimentos significativos da indústria de base se
fecharam por mais de dez anos.
Tabela.Empregos formais na Indústria Geral de
Sergipe segundo setores e subsetores. Anos Selecionados
|
||||
Setor
|
1990
|
1994
|
1996
|
2000
|
Indústria Geral
|
25.992
|
21.779
|
21.022
|
26.254
|
Extrativa Mineral
|
1.235
|
3.578
|
3.546
|
786
|
IndústriadeTransformação
|
24.757
|
18.201
|
17.476
|
25.468
|
Alimentos e Bebidas
|
5.046
|
4.721
|
6.074
|
8.759
|
Indústria Têxtil
|
9.922
|
8.344
|
5.453
|
6.950
|
Prod. Mineral Não Metálico
|
2.125
|
1.950
|
1.643
|
2.875
|
Indústria Química
|
802
|
374
|
659
|
2.145
|
Indústria Calçados
|
406
|
772
|
747
|
1.420
|
Madeira e Mobiliário
|
544
|
637
|
799
|
977
|
Papel e Gráfica
|
711
|
465
|
644
|
718
|
Indústria Metalúrgica
|
571
|
527
|
486
|
706
|
Borracha,Fumo, Couros
|
4.107
|
315
|
504
|
437
|
Material deTransporte
|
323
|
61
|
405
|
279
|
Elétrico e Comunic
|
89
|
17
|
26
|
114
|
Indústria Mecânica
|
111
|
18
|
36
|
88
|
Fonte: MTE/RAIS
Publicado no Jornal da Cidade em 27/94/2014