Praça São Francisco, São Cristovão- SE

Praça São Francisco, São Cristovão- SE
Praça São Francisco, São Cristovão-SE. Patrimônio da Humanidade

segunda-feira, 20 de junho de 2016

As exportações regionais em 2016

Ricardo Lacerda

O comportamento das exportações brasileiras nos últimos dois anos tem sido intrigante e decepcionante. Diante da intensa desvalorização da moeda nacional desde agosto de 2014, com nova aceleração da depreciação a partir do início do segundo semestre de 2015, era de se esperar uma retomada mais forte de nossas vendas externas. Na verdade, na comparação entre os doze meses completados em maio de 2016 e o mesmo período anterior, o valor das exportações brasileiras continuou recuando (-9,4%).
É fato que os últimos dois resultados mensais saíram do campo negativo, com crescimento de 1,4%, em abril, e 4,8%, em maio, em relação aos mesmos períodos do ano anterior, mas na comparação entre janeiro-maio de 2016 e o mesmo período de 2015, as exportações brasileiras ainda se situaram 1,6% inferiores. Repito, esperava-se resposta mais rápida do desempenho de nossas vendas externas.
Comportamento intrigante
O comportamento das exportações brasileiras é intrigante porque, além do forte impulso de competitividade decorrente da valorização cambial, a profunda recessão no mercado interno colocou à disposição das atividades exportadoras capacidade produtiva ociosa e força de trabalho disponível e a custo mais baixo.
Parte importante da explicação para a falta de uma resposta mais forte no crescimento das vendas externas decorre da evolução desfavorável das cotações de nossos principais produtos de exportação, notadamente do minério de ferro. Assim, frente ao recuo de 9,4% no valor das exportações nos últimos doze meses, a quantidade exportada apresentou crescimento de 11,8%.
Todavia, mesmo o incremento físico das exportações foi bem inferior à depreciação do real frente a uma cesta de moeda que alcançou, na média de doze meses, cerca de 25% no período, já descontada a inflação.
Analistas têm destacado dois outros outros fatores que explicariam a lentidão da resposta do drive exportador brasileiro, além dos efeitos da debilidade da demanda externa por conta da continuidade da recessão mundial: a extensa desestruturação da atividade industrial brasileira que limita a capacidade do setor em reagir aos estímulos cambiais e redirecionar recursos ociosos para as vendas externas, como acontecera em momentos anteriores de maxidesvalorizações.
O segundo fator decorre da incerteza em relação ao patamar que o câmbio deverá se estabilizar, o que restringe as decisões de voltar a investir com vistas ao mercado externo. Um terceiro fator, certamente, está associado às incertezas em relação ao cenário político interno.

Exportações regionais
Um aspecto significativo da evolução recente das exportações brasileira é o seu perfil regional. A Tabela e o Gráfico apresentados trazem dados elucidativos a respeito das exportações regionais. Entre as cinco regiões brasileiras, apenas o Centro-Oeste apresentou crescimento no valor exportado nos cinco primeiro meses do ano, em relação ao mesmo período do ano anterior, com o incremento notável de 27,5%, devido principalmente aos desempenhos dos estados de Mato Grosso e Goiás. No caso da região Sul há quase empate nessa comparação, com um ligeiro recuo de 0,4%. As demais regiões registraram ainda quedas expressivas; Norte, de 9,9%, Nordeste, de 4,2%, e Sudeste, de 8,3%.
Em termos de volumes exportados, a região Centro-Oeste continuou se distinguindo das demais, apresentando taxa de incremento de 57,6%, seguida pelos 24,9% da região Norte e 16,6% da região Sul.
A última coluna da tabela registra a variação do valor médio da tonelada exportada na comparação entre jan-mai de 2015 e jan-mai de 2016. As regiões mais dependentes de exportações de minérios, como o Norte, ou de commodities agrícolas, como o Centro-Oeste e, em menor grau, a região Sul, se defrontaram com quedas mais acentuadas no preço médio exportado do que as regiões Nordeste e Sudeste. No caso da região Norte, o volume exportado cresceu 24,9%, enquanto o valor caiu 9,9%.

Tabela: Taxas de crescimento das exportações regionais em valor e em quantidade entre jan-mai de 2015 e jan-mai de 2016 (%)
Regiões
Taxa de crescimento da Exportações Jan- Mai de 2016/ Jan-Mai de 2015 (%)
Variação do Valor médio por tonelada no período (%)
Em US$
Em toneladas
Norte
-9,9
24,9
-27,8
Nordeste
-4,2
7,7
-11,1
Sudeste
-8,3
4,9
-12,6
Sul
-0,4
16,6
-14,6
Centro-Oeste
27,5
57,6
-19,1
Oper Especiais
12,3
-15,6
33,1
Brasil
-1,6
15,4
-14,7
Fonte: MDIC-SECEX

O Gráfico apresentado auxilia a examinar o movimento das exportações regionais em uma perspectiva de prazo mais longa. Ele compara a taxa de crescimento do valor exportado pelas regiões em doze meses, em relação ao mesmo período anterior.
Nessa série, apenas a região Centro-Oeste já deixou para trás o período de retração no valor exportado, enquanto a região Sul parece caminhar celeramente nessa direção. As exportações das regiões Norte e Sudeste, mais diretamente afetadas pela crise industrial e/ou pela queda nas cotações das commodities minerais, ainda registram quedas muito expressivas, enquanto as exportações do Nordeste, aparentemente, ainda encontram dificuldades para reagir aos estímulos criados pela maxidesvalorização.

Fonte: MDIC-SECEX

Publicado no Jornal da Cidade, em 19/06/2016 



segunda-feira, 13 de junho de 2016

O comportamento dos componentes do PIB

Ricardo Lacerda
Do ponto de vista das despesas ou da demanda agregada, o PIB é igual à soma dos seus cinco componentes, a saber: o Consumo das Famílias, o Consumo do Governo, a Formação Bruta de Capital Fixo- FBCF (incluindo a variação dos estoques), as Exportações de Bens e Serviços e o quinto fator são as Importações de Bens e Serviços com sinal negativo, dado que significam despesas que vazam para o resto do mundo. Em termos algébricos,  PIB= Cons das Familias + Cons do Governo + FBCF + (Saldo das Exp – Imp de B e S).
Há pelo menos duas formas de interpretar a relação entre o PIB e os componentes da demanda agregada. No sentido mais restrito é apenas uma igualdade contábil. Assim, ao final de um determinado período, são somados todos os componentes da demanda e o valor obtido é igual da soma de tudo que foi produzido nos setores primário, secundário e terciário. No sentido mais amplo, busca-se identificar uma relação causal entre a variação de cada um dos componentes e os demais para explicar o comportamento do PIB.
Em um sentido ou em outro vale a pena examinar a evolução dos componentes da demanda agregada a fim de buscar entender o período recente de retração do PIB e as possibilidades de recuperação do níveld e atividade econômica.
Peso dos componentes
Evidentemente, variações nos componentes que apresentam participações mais elevadas tendem a causa maior impacto no resultado do PIB. Há, todavia, interações entre eles que também devem ser observadas.
No acumulado dos quatro trimestres encerrados no 1º trimestre de 2016, em termos correntes, o Consumo das Famílias respondeu por 63,5% do PIB, o Consumo do Governo, por 20,3%, a FBCF, por 16,6%, e o Saldo entre as exportações e as importações de bens e serviços por -0,4% (decorrente da diferença entre 13,7% e -14,1%).
Na série que compara com o trimestre imediatamente anterior, descontados os efeitos sazonais, o PIB vem desacelerando o ritmo de queda; de 2,0% no segundo trimestre de 2015, para 1,6% no terceiro trimestre, 1,3% no quarto trimestre de 2015.
No 1º trimestre de 2016, a a queda foi bem mais atenuada, 0,3% (ver Gráfico 1). Como os componentes da demanda agregada contribuíram para a desaceleração expressiva da queda do PIB no 1º trimestre?
Consumo das famílias e do governo
Em linhas gerais, na comparação com o trimestre imediatamente anterior, apenas dois componentes da demanda agregada registraram crescimento; o Consumo do Governo, com incremento de 1,1% e as Exportações de Bens e Serviços, com o extraordinário crescimento de 6,5%.
Todavia, na avaliação dos fatores que explicam a desaceleração da queda do PIB há que se considerar não apenas a variação para cima ou para baixo dos componentes de um trimestre para o outro. É necessário ponderar também se aqueles componentes ampliaram ou reduziram a variação em relação ao período anterior. O Gráfico 1 apresenta esses resultados.
O Consumo das Famílias não apenas caiu muito no primeiro trimestre de 2016 (1,7%) como sua queda foi bem mais acentuada do que a do último trimestre de 2015, quando a retração fora de 0,9%. Ou seja, observando-se exclusivamente a evolução do Consumo das Famílias, o PIB teria acentuado e não atenuado a queda nesse início de 2016.
Curiosamente, a contribuição do componente Consumo do Governo para atenuar a retração do PIB no 1º trimestre foi da mesma dimensão do papel das Exportações de Bens e Serviços, que tem sido mais propalada. Afinal, respondendo por cerca de 20% da demanda agregada, o consumo do Governo, que havia caído 2,9% no último trimestre de 2015, inverteu sua trajetória e se expandiu 1,1%, enquanto as exportações de bens e serviços, com cerca de 14% da demanda agregada, ampliou o crescimento de 0,1% para 6,5%. Cabe indagar se é razoável esperar que nos próximos trimestres o Consumo do Governo continue a dar contribuição positiva na evolução do PIB.
Investimentos e Setor Externo
Os investimentos na Formação Bruta de Capital Fixo continuaram despencando no 1º trimestre de 2016, mas o ritmo de queda foi bem menos acentuado do que no trimestre anterior, 2,7% e 4,8%, respectivamente, contribuindo também expressivamente para a redução da queda do PIB (um pouco mais de 1/3 das contribuições das Exportações ou do Consumo do Governo).
Finalmente, as Importações de Bens e Serviços não apresentaram variação significativa no ritmo de queda na comparação entre os dois trimestres.
O Fundo do poço
Em termos contábeis, para que o PIB trimestral pare de cair, atingindo o fundo do poço, e se inicie em seguida a sua recuperação, mesmo que em ritmo anêmico, é necessário que haja uma melhoria no comportamento dos componentes (na média ponderada), com a redução da queda ou reversão para o crescimento daqueles que se encontram ainda em trajetória declinante e a intensificação do incremento daqueles que cresceram no trimestre anterior.
É difícil imaginar que as Exportações e as Importações de Bens e Serviços possam acelerar, respectivamente, os seus ritmos de incremento e de queda que, em termos anualizados, se aproximaram de 30% no primeiro trimestre. O Consumo do Governo, por sua vez, deverá contribuir negativamente para a evolução do PIB nos próximos trimestre, a acreditar na sinalização da nova equipe econômica.
A melhoria do PIB dependerá, portanto, de dois fatores básicos que já haviam sido apontados pelo ex- ministro Nelson Barbosa: o primeiro é que o Consumo das Famílias, que responde por mais de 60% do PIB, pelo menos reduza seu ritmo de queda nos próximos trimestres. O comportamento desse componente, como se sabe, vai depender da evolução do mercado de trabalho, da confiança das famílias e da situação do crédito e dos juros.
O outro componente determinante é a Formação Bruta de Capital Fixo, incluindo a variação dos Estoques. Duas considerações a fazer: esse componente vem despencando continuamente desde o segundo trimestre de 2014, acompanhando em grande parte a trajetória declinante da atividade industrial. É razoável esperar que o ritmo de queda da FBCF se atenue muito nos próximos trimestres e mesmo passe a apresentar crescimento em algum momento entre o final de 2016 e início de 2017. Podem contribuir para isso, além do próprio movimento do ciclo econômico, resultante da combinação entre o acelerador e o multiplicador, a elevação progressiva da confiança no ambiente de negócios. A retomada do nível de atividade, todavia, não está ainda assegurada, como mostraram as projeções mais recentes da OCDE e do Banco Mundial para a economia brasileira.



Fonte: IBGE- CNT






segunda-feira, 6 de junho de 2016

O PIB do 1º trimestre de 2016 e o fundo do poço

Ricardo Lacerda

No 1º trimestre de 2016, o PIB brasileiro recuou pela quinta vez seguida, na série trimestral com ajuste sazonal. Ressalte-se, todavia, que, nessa série, desde o 2º trimestre de 2013 a economia brasileira deixou de apresentar crescimento relevante e a trajetória de declínio do PIB trimestral se iniciou de fato no segundo trimestre de 2014 (ver Gráfico).
O que teve início no 1º trimestre de 2015 e completou cinco trimestres no primeiro resultado de 2016 foi o seu declínio contínuo e, na média do período, muito acentuado. No acumulado de quatro trimestres, o PIB também computou cinco quedas seguidas.
A nova fase da crise econômica iniciada no primeiro trimestre de 2015 resultou de uma combinação especificamente extraordinária: de adoção de fortes medidas de contenção de dispêndios e de correção dos preços administrados e do câmbio que fizeram despencar a renda da população; de colapso da confiança decorrente dos desdobramentos das operações jurídico-policiais e do sitiamento político ao governo; e, subsidiariamente, de novo agravamento, em 2015, de um cenário internacional já bastante adverso desde 2013.
Completam-se, portanto, nesse início de 2016, dez trimestres sem crescimento, oito trimestres de trajetória de declínio do PIB e cinco trimestres de quedas contínuas. Não é pouca coisa.


Fonte: IBGE. CNT

O fundo do poço
Os resultados do 1º trimestre de 2016 trouxeram à tona o debate sobre quando o nível de atividade vai atingir o fundo do poço, estancando as quedas, e qual o horizonte para que se inicie a retomada da economia, mesmo que em ritmo muito suave.
Dois aspectos têm sido destacados: o primeiro é que o ritmo de retração vem desacelerando nos últimos três trimestres; depois de cair 2% no segundo trimestre de 2015, a economia recuou 1,6%, no terceiro trimestre, 1,3%, no quarto trimestre e agora a queda foi bem menos acentuada, de 0,3%, relativamente próxima de uma situação de estabilização.
O segundo aspecto é que a indústria de transformação, um dos segmentos mais atingidos pela crise juntamente com a construção civil, já apresenta sinais de estabilização. Depois de um longo período de queda livre desde o último trimestre de 2014, a produção industrial registrou no primeiro trimestre de 2016 retração bem menos intensa do que nos períodos anteriores, de apenas 0,3%, quando a retração havia sido de 3,5% e 2,3%, respectivamente, nos terceiro e quarto trimestres de 2015.
A atividade manufatureira, alguns analistas têm assinalado, teria atingido o fundo do poço, seja por conta da própria operação do ciclo de negócios, com o ajuste dos estoques, seja em função dos estímulos oriundos da mudança do câmbio sobre diversos ramos de atividade, alguns dos quais já apresentando crescimento nos últimos meses.
A expectativa predominante no mercado é de que o declínio do PIB deverá estancar em algum momento do segundo semestre e o seu incremento, mesmo em ritmo muito modesto, deverá iniciar entre o final de 2016 e o primeiro trimestre de 2017. Ainda assim, o crescimento no próximo ano, se se confirmar, deverá ser muito modesto.

Limites e incertezas
Persistem, todavia, muitas interrogações e incertezas em relação às projeções de estabilização e posterior retomada do nível de atividade, algumas relativas ao cenário político interno e outras referentes à propria robustez e significado dos resultados do PIB do primeiro trimestre.
Em relação ao quadro político, as incertezas vão desde a continuidade do atual governo, passam pelos desdobramentos das investigações criminais em curso, com a possibilidade de alcançar lideranças políticas e empresariais muito expressivas, até a questões como a capacidade política do governo em implementar as medidas de ajuste fiscal e realizar as reformas de longo prazo demandadas pelo mercado.
Em relação à interpretação dos resultados do PIB, tem sido lembrado, em primeiro lugar, que os comportamentos de alguns componentes da demanda continuaram muito ruins no primeiro trimestre: o consumo das famílias, que representa cerca de 60% do PIB, registrou nova queda acentuada; e os investimentos (FBCF) despencaram mais uma vez.
A suavização da queda do nível de atividade no 1º trimestre se deveu, primordialmente, ao incremento das exportações e encolhimento das importações de bens e serviços e, secundariamente, com impacto muito menor, quase inexpressivo, do aumento do consumo do setor público, que não se sabe se vai perdurar nos próximos trimestres.
Ainda que a evolução das exportações e a da substituição de importações continuem ampliando suas contribuições para o incremento do PIB nos próximos trimestres, isso poderá não ser suficiente caso o desemprego continue crescendo, de modo a postergar a e estabilização e posterior recuperação do consumo das famílias. O comportamento ruim do mercado de trabalho poderá também refrear a melhoria da confiança do mercado, tida como crucial para impedir a continuidade da derrocada dos investimentos.
As próximas publicações de indicadores setoriais, coincidentes e antecedentes, inclusive daqueles relativos ao quadro da economia mundial, e os desdobramentos do cenário político deverão proporcionar informações mais robustas sobre as perspectivas de enfim estancar a queda no PIB.


Publicado no Jornal da Cidade, em 05/06/2016