Ricardo Lacerda
Ao longo de 2015 foram realizadas mudanças significativas na
estrutura de preços da economia brasileira que, apesar de penosas para a
população, eram inadiáveis. Ainda que a elevação dos preços tenha superado em
muito às previsões do início do ano, parcela expressiva dessa aceleração decorreu
de ajustes necessários e mesmo aguardados pelo mercado. Refiro-me
especificamente à correção dos preços dos combustíveis e das tarifas de energia
elétrica e aos aumentos nos preços de bens e serviços decorrentes da
depreciação da paridade cambial. No caso
das tarifas da energia elétrica a defasagem havia sido ampliada pelo aumento
dos custos de geração em função da prolongada estiagem.
O Índice de Preços ao Consumidor Ampliado (IPCA) subiu de 6,4%,
em 2014, para 10,7%, em 2015. Para 2016,
o mercado projeta inflação de 7%, enquanto o governo diz perseguir a taxa de 6,5%.
Realinhamento
de preços
A correção dos chamados
preços monitorados foi um dos principais fatores do aumento do IPCA em 2015,
não apenas pelo seu peso na composição do índice, como por meio da transmissão
de custo para a oferta de outros bens e serviços. Os preços monitorados que
haviam subido 5,3%, em 2014, aumentaram 18,1%, em 2015.
A transmissão da elevação do câmbio sobre os preços foi também
significativa, ainda que tenha sido amortecida pela queda das cotações das
commodities no mercado internacional e pelo enfraquecimento do poder de compra
interno. O Gráfico 1 compara a elevação do IPCA em 2014 e 2015, segundo alguns
grupos de preços selecionados.
A primeira observação é que a elevação de preços se acentuou em
todos os grupos selecionados; a segunda observação é que a aceleração foi mais
intensa em alguns grupos, como nos preços monitorados, alimentos e bebidas e
nos preços dos produtos comercializáveis.
A aceleração de preços foi relativamente menos acentuada
naqueles grupos que vinham liderando os incrementos de preço no período
anterior à adoção das medidas de ajuste econômico: as despesas pessoais, os
bens e serviços não comercializáveis e, em menor graus, os de serviços de saúde
e cuidados pessoais.
Fonte: IBGE.
O Gráfico 2 apresenta o incremento na
elevação dos preços, medido em pontos percentuais, na comparação entre os
trimestres de 2015 e os mesmos trimestres de 2014.
O IPCA de 2015 apresentou incrementos maiores
no 1º e no 4º trimestres. O resultado do IPCA do 1º trimestre foi muito
influenciado pela correção nos preços monitorados. O resultado do 4º trimestre,
aparentemente, esteve mais associado aos impactos da apreciação cambial sobre
os preços dos produtos comercializáveis e à elevação nos preços dos alimentos e
bebidas.
Fonte: IBGE.
Correção
de preços e recessão
O realinhamento na estrutura dos preços provocou perdas no poder
de compra da população por meio de dois canais principais: elevação da inflação
em velocidade superior a dos reajustes dos rendimentos do trabalho;
encarecimento e restrição do acesso ao crédito e contenção nos gastos públicos
que, visando atenuar os impactos das mudanças dos preços relativos sobre a
inflação, provocaram desemprego e queda da massa de rendimentos.
Nesse sentido, os efeitos das mudanças na estrutura dos preços e
a deterioração do cenário externo foram dois dos fatores decisivos para a
acentuada queda do nível de atividade econômica em 2015.
Há que se reconhecer, todavia, que se a perda do poder
aquisitivo da população consistia em um dos pilares das políticas de ajuste do
ministro Levy, a intensidade com que ela ocorreu foi muito além do que se
projetava, seja por conta da acelerada deterioração do cenário externo, seja
por conta da crise política interna.
Se o primeiro impacto da elevação nos preços
administrados/monitorados e dos aumentos decorrentes da depreciação da paridade
cambial foi o de provocar uma forte aceleração na inflação, em sua essência se
tratou de uma inflação corretiva que, uma vez realizada, não tende a se
repetir. Em outras palavras, já foi paga a maior parte de uma conta que havia
se acumulado no tempo.
Publicado no Jornal da Cidade, em 24/01/2016