Ricardo Lacerda
No mês de junho as exportações superaram as importações em US$
4,53 bilhões, o melhor resultado da balança comercial para o mês desde 2009. Talvez
seja cedo ainda para apreender o significado das mudanças em curso no comércio
exterior brasileiro. Há a possibilidade de que o superávit comercial de junho
tenha sido um resultado atípico, decorrente de um forte ajuste interno de
estoques que tenha provocado queda abrupta nas importações e que não volte a se
repetir nos próximos meses, mas o ritmo acelerado das mudanças em curso é
realmente extraordinário.
Mesmo que o resultado de junho tenha sido especial, o fato é que
desde fevereiro não apenas a balança comercial mensal tem apresentado superávit
como ele tem aumentado aos saltos: depois do déficit de US$ 2,84 bilhões em
janeiro, o saldo passou para US$ 457 milhões positivos em fevereiro, US$ 491
milhões em março, US$ 2,76 bilhões em abril.
Resultados
trimestrais
O sentido do que vem ocorrendo é mais bem apreendido se observamos
os resultados trimestrais, menos influenciados por comportamentos atípicos de
alguns setores. Depois do saldo positivo de US$ 1,8 bilhão no terceiro
trimestre de 2014, o saldo comercial fechou negativo no último trimestre de
2014 e no primeiro de 2015 (ver Gráfico 1).
Fonte: BCB
Na média móvel trimestral, a balança comercial brasileira apresentava
saldo negativo desde outubro do ano passado. O déficit comercial se ampliou
muito nos trimestres seguintes e somente passou a registrar uma redução
expressiva muito recentemente, em abril de 2015 (ver Gráfico 2). No trimestre
encerrado em maio, o resultado inverteu de negativo para positivo e no trimestre
completado em junho já alcançou US$ 7,8 bilhões, o mais elevado para o período abril-junho
desde 2009. Ou seja, em um período relativamente curto, o saldo comercial
trimestral inverteu de US$ 5,6 bilhões negativos, no último trimestre de 2014,
para US$ 7,8 bilhões positivos no segundo trimestre de 2015, o que não pode ser
explicado tão somente pelas diferenças sazonais entre o quarto e o segundo
trimestres.
Uma outra forma de explicitar a tendência de recuperação do
saldo comercial é mostrar que enquanto o saldo comercial do último trimestre de
2014 foi U$$ 7,4 bilhões inferior ao do último trimestre de 2013, o 1º
trimestre de 2015 apresentou resultado US$ 520 milhões acima daquele de 2014, o
mais recente, do 2º trimestre de 2015, foi superior em US$ 4,2 bilhões em
relação ao 2º trimestre de 2014.
Fonte: BCB
Substituição
de importações ou recessão
Uma característica importante do atual momento do comércio
exterior brasileiro é que tanto as as exportações quanto as importações têm encolhido.
O superávit comercial do mês de junho e o do segundo trimestre foram causados
por retrações maiores nas importações do que nas exportações. Assim, enquanto
as exportações de junho de 2015 foram inferiores em US$ 839 milhões em relação
a junho de 2014, as importações despencaram em US$ 3,0 bilhões.
Na comparação trimestral, a ampliação do superávit no segundo trimestre
de 2015 em relação ao mesmo período do ano anterior decorreu de retração de US$
9,4 bilhões nas exportações e montante bem mais elevado, queda de US$ 13,6
bilhões, nas importações.
Quanto de tal retração nas importações se deveu à substituição de
produtos importados pela produção interna como reflexo da desvalorização
cambial? Quanto da queda das importações resultou simplesmente da piora do
cenário doméstico, com a redução do poder de compra interno (medido em moeda
forte) e a retração dos investimentos? E qual a parcela que pode ser atribuída
a simples ajuste nos estoques internos de mercadorias e de insumos ao novo
ritmo de produção e consumo e que portanto não voltaria a ocorrer?
Na comparação entre junho de 2015 e junho de 2014, cerca de ¾ da
retração nas importações se concentraram em quatro setores: combustíveis (cerca
de 40%), equipamentos elétricos e eletrônicos, equipamentos mecânicos e o setor
de veículos e componentes, indicando que a melhoria do saldo externo até o
momento tem sido predominantemente causada pela deterioração do poder de compra
interno e não ainda por um ciclo virtuoso de substituição de importados pela
produção doméstica. Todavia, vai ser necessário aguardar os resultados dos
próximos meses para dimensionar melhor o impacto do ajuste recessivo e da depreciação
do real sobre o comércio exterior brasileiro.
Publicado no Jornal da Cidade, 05/07/2015
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