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Praça São Francisco, São Cristovão-SE. Patrimônio da Humanidade

domingo, 10 de agosto de 2014

O futuro que nos cabe




Ricardo Lacerda

O estado de espírito do brasileiro é uma gangorra. Alterna euforia e descrença sobre o futuro. Em momentos de baixo crescimento, o brasileiro imagina o fim do mundo e em períodos de prosperidade que o futuro chegou e finalmente vamos ingressar no exclusivo clube dos países desenvolvidos. Há dificuldade, sobretudo, para distinguir a parcela dos problemas que decorre de limitações externas e a parcela devida a problemas estruturais internos.

Em situações como essa, vale a pena buscar uma perspectiva de prazo mais longo e indagar sobre o futuro que nos cabe.

O debate

Uma vertente do debate econômico recorreu ao argumento de que o PIB potencial do Brasil havia batido no teto, no sentido estrutural do termo. A desaceleração da taxa de incremento da PEA (População Economicamente Ativa) em situação de pleno emprego do fator trabalho imporia um limite rígido ao crescimento econômico de longo prazo.

Um novo ciclo de aceleração do crescimento exigiria reformas institucionais que estimulassem a ampliação do investimento e o consequente aumento da produtividade. Embora esse argumento tenha sido apresentado e repetido ad nauseam, o fato é que não passa de uma igualdade contábil que depende de uma série de pressupostos para ser válida, pressupostos estes que podem ser aderentes à  realidade ou não.  

Não se consideram, entre outros aspectos, a maturação dos investimentos do pré-sal, o andamento das licitações na área de infraestrutura, o amplo esforço de qualificação profissional representado pelo Pronatec e o imenso exército de subempregados e de pessoas que atuam em atividades de baixa produtividade e que, em algum grau, podem migrar para outras de maior produtividade. Tais argumentações oscilam entre afirmar banalidades e atropelar a realidade. Mais recentemente, têm sido elaborados singulares modelos de comparação entre os países para provar o que desejam provar. Nenhuma consideração é feita sobre os efeitos que a maior crise mundial desde 1930 exerce sobre o potencial de crescimento dos países.  

As regiões que ganham

Ao longo da década de 1990, as mudanças na participação dos grandes blocos econômicos na produção da riqueza mundial foram bem modestas, quando comparadas às transformações verificadas na década seguinte. A participação das economias avançadas iniciou e terminou os anos noventa detendo 79,9% do PIB mundial, contra os 20,1% das economias emergentes (ver Tabela 1). O grupo das sete maiorias economias avançadas oscilou sua participação no período de 65,3% para 66%.

Na década seguinte, a força da emergência da China provocou mudanças de alcance na geração da riqueza mundial, levando de arrastro países satélites situados no leste asiático e os fornecedores de commodities agrícolas e minerais, inclusive países latino-americanos e da África Subsaariana.

Entre 2000 e 2010, as economias avançadas perderam 14,2 pontos percentuais de participação no produto global para as economias emergentes. O grupo das sete maiores economias do mundo desenvolvido (EUA, Alemanha, Japão, França, Reino Unido, Canadá e Itália) viu sua participação recuar de 66%, em 2000, para 50,5%, em 2010, perda de notáveis 15,5 pontos de percentagens do PIB mundial. O grande vencedor foi o grupo dos países emergentes da Ásia, China à frente, mas os países produtores de commodities, inclusive o Brasil, também ganharam participação. Após 2010, a dinâmica de crescimento voltou a mudar, mas a trajetória futura não está clara.

Tabela 1. Participação de Grupos de Países selecionados no Produto Global. (%)
Grupos de países
1990
2000
2007
2010
2013
Economias Avançadas
79,9
79,9
71,7
65,7
61,3
Área do Euro
24,7(1991)
19,1
21,9
19,0
17,2
G7 (7 maiores avançadas)
65,3
66,0
55,3
50,5
46,6
Economias  Emergentes
20,1
20,1
28,3
34,3
38,7
Emergentes da Ásia
4,8
6,9
10,7
14,9
18,2
América Latina e Caribe
5,2
6,6
6,6
7,7
7,8
África Subsaariana
1,4
1,1
1,5
1,7
1,8
Fonte: WEO. FMI.Abril de 2014

Países

A Tabela 2 apresenta a evolução da participação de algumas das principais economias avançadas e economias emergentes na produção global. Entre 2000 e 2010, todas as principais economias avançadas cresceram menos do que a média mundial, perdendo participação na produção global e continuaram perdendo entre 2010 e 2013.

Dentre as principais economias latino-americanas selecionadas, apenas México e Argentina perderam participação. No caso do Brasil, o peso na economia global saltou de 2%, em 2000, para 3,3%, em 2010, crescendo quase 70% a mais do que a média mundial do período. A situação da China é diferenciada, pois se trata da emergência de uma nova potência econômica no cenário mundial.

Depois da crise, entre 2007 e 2010, o Brasil manteve taxas de crescimento relativamente elevadas, na média, enquanto a maioria das economias avançadas naufragava. Nos anos seguintes, as economias centrais voltaram a se enredar na crise, contaminando as possibilidades de crescimento das economias em desenvolvimento. O Brasil foi atingido pela nova deterioração do cenário externo, enquanto as tentativas de se contrapor a maré vazante se mostraram pouco frutíferas dessa vez, o que levou à piora de alguns fundamentos e findou por provocar um abalo da confiança interna.

Não está claro ainda como países e blocos de países vão se inserir na ordem econômica mundial que vem sendo gerada há mais de uma década e qual a feição que esta vai assumir quando, finalmente, a crise internacional estiver superada.

A mudança estrutural pela qual a economia brasileira passou no período anterior à crise, com a ampliação do poder de compra interno a partir da incorporação de milhões de pessoas ao mercado formal de trabalho e ao mercado de consumo e as oportunidades de investimentos existentes apontam para um futuro promissor para o Brasil, muito além das dificuldades que vem enfrentando. Há tarefas importantes para serem encaminhadas, mas não há como desconhecer as enormes potencialidades de crescimento e de continuidade  de processos de inclusão social.

Tabela 2. Participação de Países selecionados no Produto Global (%).
Países
1990
2000
2007
2010
2013
EUA
26,7
31,4
25,7
23,4
22,7
Japão
13,8
14,5
7,7
8,6
6,6
Alemanha
6,9
5,8
5,9
5,2
4,9
França
5,6
4,1
4,6
4,0
3,7
Reino Unido
4,6
4,6
5,1
3,6
3,4
Itália
5,1
3,4
3,8
3,2
2,8
China
1,7
3,7
6,2
9,3
12,4
Brasil
2,1
2,0
2,4
3,3
3,0
Rússia
0,3(1992)
0,8
2,3
2,4
2,9
Índia
1,5
1,5
2,2
2,7
2,5
México
1,3
2,1
1,8
1,6
1,7
Argentina
0,63
0,87
0,46
0,57
0,66
Colômbia
0,25
0,31
0,37
0,45
0,52
África do Sul
0,50
0,41
0,51
0,57
0,47
Chile
0,15
0,24
0,31
0,34
0,37
Peru
0,13
0,16
0,19
0,24
0,28
Fonte: WEO. FMI.Abril de 2014

Publicado em 10/08/2014

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