Ricardo
Lacerda
A elevação da cotação
do dólar nas últimas semanas reflete a anunciada, ainda não implementada, reversão
da política monetária expansionista do banco central americano.
A chamada facilitação
quantitativa, que se encontra em sua terceira versão, injeta mensalmente até 85
bilhões dólares na economia americana por meio de aquisição de títulos
públicos. Os sinais mais concretos de que a economia americana vem se
recuperando nos últimos trimestres, ainda que em ritmo moderado, foi o sinal para
que o Federal Reserve comunicasse que esse poderoso estímulo monetário deverá
ser gradualmente retirado. A simples expectativa sobre os efeitos de sua
progressiva desativação sobre as taxas de juros vem causando, literalmente, uma
revolução nos mercados de câmbio em todo o mundo, inclusive no Brasil.
Na semana passada, a
moeda norte-americana chegou a ser cotada em R$ 2,45 quando a cotação média
mensal em maio foi de R$ 2,03 (ver Gráfico 1). A cada novo salto, especialistas
ajustam apressadamente suas previsões para o suposto novo ponto de equilíbrio;
há um mês falava-se em R$ 2,40, na semana passada, alguns estipulavam R$ 2,70,
mas, de fato, ninguém tem uma ideia mais sólida sobre o patamar em que vai
estacionar.
Fonte: Banco Central do Brasil
Retomada
Mais difícil é
avaliar os impactos da reversão da expansão monetária nos EUA sobre a evolução
do PIB dos países emergentes e, especificamente, sobre o PIB brasileiro. Desde o terceiro trimestre de 2012, o nível
de atividade da economia brasileira, apesar de oscilações de alguns indicadores
mensais, vem apresentando uma série consistente de crescimento, mesmo com
aceleração bastante moderada, como é o caso da evolução do PIB trimestral, na
comparação com o mesmo trimestre do ano anterior.
A publicação do
resultado do PIB do segundo trimestre de 2012, no próximo dia 30, deverá
confirmar essa tendência de lenta recuperação que, frente ao quadro muito
difícil da economia mundial, é ainda um resultado positivo.
A evolução trimestral
do IBC-BR, indicador do nível de atividade do Banco Central, já apresentava
taxa de 4% no segundo trimestre de 2013, frente ao mesmo trimestre do ano
anterior (ver Gráfico 2).
Fonte: Banco Central
do Brasil
A questão central que
vem guiando as expectativas, melhor dizendo, as ansiedades, nas últimas semanas
é se a elevação na cotação do dólar vai ser mais uma peça entre os fatores que
podem se contrapor à modesta e já muito arrastada recuperação do nível de atividade
interna. Não há como negar que essa nova rodada de
desvalorização do real frente ao dólar, iniciada em junho, adiciona graus de
incerteza sobre a velocidade da retomada do crescimento.
Não deixa de parecer
paradoxal que um fato extremamente positivo para a recuperação da economia
mundial, como a confirmação de que os Estados Unidos, a muito custo, vem
superando o período de extremas dificuldades que vem se arrastando por sete
anos, pode disseminar efeitos desestabilizadores sobre outros países.
Câmbio
O aparente paradoxo
decorre de dois efeitos, com sinais opostos, que são propagados pela progressiva
e moderada recuperação da economia americana, um sobre os juros e outro sobre a
demanda.
Enquanto os estímulos
de sua retomada sobre a economia mundial somente se farão sentir à medida em
que o crescimento econômico impacte positivamente os fluxos comerciais, os
efeitos financeiros e cambiais são imediatos e
têm potencial de desorganizar as economias dos países mais dependentes
de afluxos de capitais externos para fechar o balanço de pagamento.
Há ainda o impacto da
desvalorização do câmbio sobre os preços que, no caso particular do Brasil, poderia
levar o Banco Central a prolongar o ciclo de elevação das taxas de juros, com
efeitos negativos sobre o nível de atividade, embora seja razoável ponderar que
os sinais mais recentes de esfriamento do consumo, podem (ou não) atenuar a
capacidade das empresas de repassarem para preço aumentos de custos
provenientes da desvalorização cambial.
Depois do tranco
inicial, a desvalorização do câmbio trará efeitos muito benéficos para a
economia brasileira, ajustando o nível de consumo à renda nacional, e, por
outro lado, impulsionando a produção interna frente ao consumo de importados,
com efeitos muitos positivos sobre a sustentabilidade do crescimento econômico
no médio prazo.
Publicado no Jornal da Cidade em 25/08/2013