Ricardo Lacerda
Alguns períodos de
crescimento são liderados pela expansão do comércio exterior, outros pelos investimentos
autônomos e, mais comumente, pela expansão de consumo. Depois do impulso inicial, pode-se formar um
ciclo virtuoso em que o crescimento se desdobra na elevação das outras
variáveis que compõem a demanda agregada.
O ciclo de crescimento
iniciado em 2004 contou com o impulso decorrente do forte incremento da demanda
por matérias-primas no mercado internacional associado à expansão da economia
chinesa, mas somente firmou-se com a ampliação do poder de compra interno
promovida pela incorporação de novos contingentes populacionais ao mercado de
consumo.
Varejo
Os dados do comércio
varejista anunciados pelo IBGE na semana passada confirmam a ampliação do
mercado de consumo no país. Com os 8,4% de crescimento do volume de vendas do comércio
varejista em 2012, o tamanho do mercado de varejo brasileiro fechou o ano 90,4%
maior do que se encontrava ao final de 2002, antes do inicio do ciclo de
crescimento.
Assim, contamos hoje com um
mercado de varejo que é quase o dobro de dez anos atrás. Reformulando, somente
para enfatizar: são quase dois Brasis em consumo no varejo em uma década.
Em todos os anos a partir de
2004, o volume de vendas no varejo cresceu acima de 4% (ver Gráfico) e a
expansão média anual desde então foi de simplesmente de 7,9%. Esse crescimento foi maior nos estados mais
pobres, nos quais a incorporação de mais pessoas ao mercado de consumo foi mais
intensa. A média anual de crescimento em Sergipe alcançou 9,2% ao ano.
Fonte:IBGE-PMC
Se o crescimento do consumo trouxe
alguns gargalos não desprezíveis, foram muitas as oportunidades abertas por
ele. Alicerçada na expansão do emprego, no aumento da renda e na ampliação do
crédito, a evolução do varejo reflete também a melhoria do acesso aos bens nos
domicílios e ainda indica como esse novo Brasil agregou milhões de famílias ao mercado
de consumo.
Efeitos e limites
A expansão do mercado de
consumo gerou oportunidades de investimentos e fez multiplicar os pequenos
empreendimentos voltados para atender a esse poder de compra aumentado. Muitos
investimentos foram direcionados para as regiões mais pobres do país a fim de
atender essa demanda crescente por bens de consumo e as oportunidades surgidas de
adensar a cadeia de fornecimento.
Ainda que tenham surgidas alertas
aos limites de manter um crescimento puxado pelo consumo, essa questão não tem
uma resposta tão simples assim. A expansão do consumo em determinadas etapas em
que a crise internacional se agudizou foi benéfica para o país. Nos momentos
mais críticos, o incremento do consumo animou as receitas públicas, o emprego,
a produção interna e ajudou a retomada do investimento.
Há evidentemente limites em
quanto o consumo pode seguir crescendo a taxas mais elevadas do que a média da
economia. A um período liderado pelo crescimento de uma variável como o consumo,
deve seguir outros períodos em que os investimentos públicos e privados,
estimulados pelo próprio aumento do consumo, passem a crescer em ritmo mais acelerado.
De outra forma, o crescimento não se sustenta.
Há sim distorções
decorrentes da expansão do consumo. As mais graves decorrem da valorização
cambial, que amplia o acesso a bens de consumo importados em detrimento da
produção que gera emprego internamente e aumenta artificialmente o poder de
compra da população. A ampliação do consumo quando não se segue à retomada do
investimento ou quando a economia se aproxima do teto de sua capacidade também
pode pressionar os preços de tal forma que induza a adoção de políticas monetárias
e fiscais restritivas que findam prejudicando a expansão dos investimentos.
Os recursos reais e
creditícios que financiam a expansão do consumo podem concorrer ou não com as
demandas de crescimento dos investimentos públicos e privados se a fase do
ciclo econômico já aproxima o uso dos recursos produtivos de sua plena
utilização ou se limita a capacidade dos governos de investir em infraestrutura
para o desenvolvimento.
Os sinais que indicam o
limite dessa política se cristalizam em desequilíbrios no balanço de pagamento
ou quando o excesso de demanda pressiona os preços. É monitorando essas
varáveis que a política macroeconômica deve compatibilizar o duplo objetivo de
manter a economia em crescimento, para proporcionar a continuidade da elevação
da qualidade de vida das pessoas, sem descuidar dos desequilíbrios que se
manifestam nos preços e nas relações externas.
Publicado no Jornal da Cidade em 24/02/2013