O IPEA publicou na semana passada o Índice de Vulnerabilidade das Famílias, com recortes por região, unidade da federação, rural/urbano e metropolitano/ não metropolitano. O objetivo do índice é o de tentar identificar os perfis das famílias brasileiras a partir do conceito de vulnerabilidade, que considera a pobreza como um fenômeno multidimensional, em que a carência de renda é apenas uma das dimensões. Também são consideradas as dimensões da própria estrutura da família, o acesso ao trabalho, o desenvolvimento infanto-juvenil e as condições habitacionais.
Os estudos sobre desenvolvimento e pobreza avançaram muito nas últimas décadas. Há muito tempo que a renda per capita e o PIB per capita deixaram de ser a expressão que sintetizava o grau de desenvolvimento econômico e social de um país ou de uma região. A simples troca de indicadores de rendimentos médios, que escondem as situações extremas (os muito ricos e os muito pobres), por indicadores que consideram a distribuição já permite identificar o quantitativo de pessoas em situação de pobreza e abre a possibilidade de localizar as famílias que deverão se constituir alvos prioritários das políticas públicas.
Laranjas e maçãs
Mas, até esse ponto, nosso índice conta apenas com uma variável (rendimento familiar per capita) e apenas uma dimensão (o rendimento). Mais complexo vai se tornando quando outras variáveis e outras dimensões vão sendo agregadas. É isso o que faz a medida de vulnerabilidade do IPEA; é um índice que sintetiza 6 dimensões, 26 componentes e 48 indicadores para caracterizar a situação de pobreza e vulnerabilidade das famílias (ver em http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/comunicado/120117_comunicadoipea131.pdf).
Quando aprendemos contabilidade social nas escolas de economia nos ensinam que não é possível somar maçãs com laranjas no cálculo do Produto Interno Bruto. É necessário reduzir todos os bens e serviços que o compõem a uma unidade comum para se obter o resultado agregado, o PIB, expresso em termos monetários. Como, então, agregar a estrutura das famílias, os seus rendimentos, as condições de habitação etc? Com o avanço dos métodos quantitativos, os economistas foram elaborando índices multivariados, somando maçãs, laranjas, presença de idosos e crianças na família e existência de esgotamento sanitário no domicílio em um único índice, por meio da padronização e da estipulação de peso para cada componente.
Fiz este longo percurso explicativo para situar o leitor em relação aos diversos índices que pululam no nosso cotidiano, desde os mais reconhecidos, como o IDH, até os índices de desenvolvimento municipal, de transparência pública, de qualidade de vida, de ambiente favorável de negócios, de competitividade e de atratividade de países e regiões etc.
O desenho do índice, com a definição das variáveis, dos seus pesos e mesmo de suas linhas de pobreza, atende às necessidades e crenças de quem o formula, selecionando os componentes considerados mais relevantes em relação a determinadas questões, seja para subsidiar a adoção de políticas públicas, seja para influenciar os debates contemporâneos. Muito comumente, a escolha das variáveis está apoiada em concepções teóricas que não estão explicitadas na metodologia. Outras vezes, são meros ajuntamentos de informações.
O Índice de Vulnerabilidade das Famílias apresentado pelo IPEA foi formulado a partir de variáveis disponíveis na Pesquisa Anual de Amostra Domiciliar (PNAD), do IBGE, o que o torna muito operacional, permitindo comparar a situação de diferentes grupos e sua evolução no tempo.
Sergipe
Sergipe se situou relativamente bem no índice proposto, posicionando-se em primeiro lugar entre os estados nordestinos, ainda que abaixo da média nacional (ver gráfico). Ficou à frente dos demais estados da região em cinco das seis dimensões consideradas; a exceção foi a dimensão acesso ao trabalho em que apareceu em segundo lugar na região, atrás do Rio Grande do Norte. Dividiu com Pernambuco e a Paraíba o melhor resultado na dimensão desenvolvimento infanto-juvenil e nas demais dimensões (vulnerabilidade da estrutura familiar, acesso ao conhecimento, escassez de recursos e condições habitacionais) situou-se na liderança isolada.
Fonte: IBGE- PNAD.
Extraído de IPEA. Vulnerabilidade das famílias entre 2003 e 2009. Comunicados do IPEA. Nº 131, 2012.
A construção de índices multidimensionais colocou o debate sobre o desenvolvimento econômico e social em novo patamar. Em meio a importantes contribuições, foram colocados alguns gatos no cesto de lebres.
O Índice de Vulnerabilidade das Famílias mostra, a exemplo de outros, que o Brasil vem avançando nos últimos anos nas várias dimensões que conformam a situação de pobreza das famílias. A seleção das variáveis, o sistema de ponderação e a forma de construção, apesar de criativos, não me pareceram convincentes como sendo os mais adequados para retratar a situação e como provedor de informações para focalizar as políticas públicas.
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