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Praça São Francisco, São Cristovão-SE. Patrimônio da Humanidade

quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

Nuvens no cenário externo


Ricardo Lacerda
Depois de um período, entre 2017 e parte de 2018, de aceleração e de sincronização de crescimento entre as maiores economias mundiais, o ano de 2018 se encerrou com moderação e assincronia no ritmo de crescimento entre os países líderes, limitando a retomada da atividade econômica nos mercados emergentes e países em desenvolvimento. 
Em 2019, China, Estados Unidos e Zona Europeia deverão registrar reduções na taxa de incremento do PIB, enquanto o Japão deverá manter o desempenho já rebaixado de 2018. A moderação no crescimento nas grandes economias, as novas rodadas de elevação nos juros básicos nos Estados Unidos e o recrudescimento das disputas comerciais são as principais ameaças à retomada do crescimento das economias em desenvolvimento, notadamente entre aquelas exportadoras de commodities, como são os casos dos países latino-americanos.
Exportadores de commodities
A edição de janeiro de 2019 do relatório Perspectivas Econômicas Globais, do Banco Mundial, aponta o aparecimento de horizonte nublado no cenário econômico em 2019, como resultado da combinação de certa moderação no ritmo de crescimento e condições financeiras menos favoráveis no cenário internacional. Os riscos afetariam especialmente Mercados Emergentes e Economias em Desenvolvimento (EMDEs, na sigla em inglês).
Alguns dos principais EMDEs já estariam se ressentindo de substanciais pressões do mercado financeiro, como são os casos da Argentina e da Turquia. A situação externa menos favorável vem afetando o crescimento dessas economias, retirando impulso na retomada do crescimento dos países exportadores de commodities, enquanto as economias emergentes importadoras desses bens apresentam desaceleração nos seus ritmos de crescimento. O relatório do Banco Mundial é seco nas suas conclusões sobre as perspectivas da economia mundial: o céu está escurecendo e a retomada dos Mercados Emergentes e das Economias em Desenvolvimento simplesmente parou.
O PIB argentino, depois de crescer 2,9%, em 2017, deve ter recuado 2,8%, em 2018, e, em 2019, deverá apresentar nova forte retração, projetada em 1,7%. No caso do Brasil, o relatório reviu para metade a projeção feita no meio do ano, de crescimento de 2,4% para 2018; a nova estimativa de crescimento para 2018 é de 1,2%, adição de apenas de 0,1 ponto percentual em relação ao PIB de 2017 (Ver Quadro).

Quadro. Taxa de crescimento do Produto Interno Bruto no Mundo e algumas áreas selecionadas, 2016-2020 (%)
Áreas
2016
2017
2018
2019
2020
Mundo
2,4
3,1
3
2,9
2,8
Economias Avançadas
1,7
2,3
2,2
2
1,6
EUA
1,6
2,3
2,9
2,5
1,7
Zona do Euro
1,9
2,4
1,9
1,6
1,5
Japão
0,6
1,9
0,8
0,9
0,7
China
6,7
6,9
5,8
5,5
5,6
América Latina e Caribe
-1,5
0,8
0,6
1,7
2,4
Brasil
-3,3
1,1
1,2
2,2
2,4
Argentina
-1,8
2,9
-2,8
-1,7
2,7
Índia
7,1
6,7
7,3
7,5
7,5
Fonte: Banco Mundial, GEP janeiro de 2019
Ameaças
Dois tipos de ameaças podem ter maiores impactos sobre as economias dos países em desenvolvimento: o acirramento e a difusão das disputas comerciais e o fim do impulso causado pelo miniciclo de valorização das commodities, sem que os EMDEs tenham aproveitado o período favorável para sanear a situação fiscal de suas economias e realizarem esforços para torná-las mais competitivas. A desaceleração no crescimento de algumas maiores economias do mundo, em especial da China, já se reflete nos preços das commodities, fechando uma janela de oportunidade para os EMDEs. Em outras palavras, a moderação no crescimento global restringe a retomada no crescimento desses países.
O relatório destaca que o aperto mais acentuado do que esperado anteriormente nas condições de financiamento poderá impactar desfavoravelmente a atividade econômica dos EMDEs e assinala que a escalada das tensões comerciais é outra grande ameaça para a perspectiva global. Os gráficos 1 e 2 apresentam a evolução do PIB de algumas das principais economias entre 2016 e 2018 e as projeções do Banco Mundial para 2019 e 2020.



Fonte: Banco Mundial, GEP janeiro de 2019



Fonte: Banco Mundial, GEP janeiro de 2019



Publicado no Jornal da Cidade, em 20/01/2019

segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

2019: condicionantes e possibilidades



Ricardo Lacerda

Levantamento recente do Instituto Datafolha estimou que 65% dos brasileiros estão otimistas em relação ao governo Bolsonaro, entre aqueles que acreditam que o governo iniciado no dia 1º de janeiro deverá ser bom ou ótimo.

O clima otimista que se instalou pós-eleição não é suficiente para mascarar o estado anêmico em que se encontra a economia brasileira.  Não devemos nos iludir; viemos de um ano duro e 2019, ainda que deva apresentar alguma melhoria em relação ao ano anterior, deverá apresentar resultados limitados no que se refere a finanças públicas, geração de emprego e elevação da renda dos brasileiros. E são esses os indicadores que, ao fim e ao cabo, de fato interessam no momento em que o empobrecimento da população e a crise nas políticas públicas são os sentimentos predominantes: repetindo, melhoria nas finanças públicas, geração de emprego e elevação de renda.  

Letargia

A verdade é que em 2018 o ritmo de retomada do nível de atividade da economia brasileira desacelerou intensamente, revelando o grau de dificuldade de darmos partida a um novo de ciclo de crescimento vigoroso que permita a elevação expressiva da renda e do emprego. Enquanto entre 2016 e 2017 saímos de uma retração de 3,3% do PIB para um incremento de 1,1%, registrando, portanto, um ganho de 4,4 pontos percentuais no ritmo de crescimento, entre esse último ano e 2018 o PIB agregou apenas 0,3 pp na taxa de incremento, para se situar em torno de 1,4%, se tanto (ver Gráfico). Ou seja, quando consideramos o ritmo de retomada da economia depois da recessão, andamos de lado ao longo de 2018. É pouco, muito pouco diante da devastação econômica e social dos últimos anos.

Cabe não esquecer que iniciamos o ano de 2018 com a expectativa de que o PIB apresentaria incremento de 2,7%, taxa que, se não é espetacular, indicaria possibilidades de retomada substantiva do crescimento econômico.

Muito do que se apresenta hoje como indicadores econômicos favoráveis, como a inflação comportada, juros básicos rebaixados e o saldo favorável da balança comercial, são na verdade reflexos irrefutáveis de como a economia brasileira permanece letárgica. Adicione-se que a recuperação anêmica do nível de atividade tem sido muito desigual em termos regionais: enquanto o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-BR) apresentou incremento de 1,4%, na comparação entre os dez primeiros meses de 2018 e o mesmo período de 2017, no caso da região Nordeste o crescimento do Índice de Atividade Econômica Regional (IBC-R) no período se limitou a 0,2%.



Perspectivas

Os dados duros a respeito da atividade econômica em 2018 não escondem o fato de que o crescimento do PIB deverá acelerar em 2019. As projeções podem variar entre 2,4%, do Relatório de Inflação do Banco Central, de dezembro de 2018, até 2,8%, de instituições financeiras mais otimistas. Sabemos, todavia, que, nos últimos anos, as expectativas formuladas de recuperação mais vigorosa têm se revelado seguidamente frustradas, por fatores de diversas naturezas.

A principal força que deverá impulsionar o crescimento do PIB em 2019, pouco se fala disso, tem um caráter quase que “automático”, no sentido de que desde o 1º trimestre de 2017 a economia superou a etapa declinante do ciclo econômico e iniciou a de retomada e, ainda que a recuperação venha se revelando muito vacilante, os mecanismos cíclicos da atividade econômica devem continuar impulsionando alguma aceleração de crescimento.

A melhoria da confiança empresarial, em vários segmentos econômicos, e das famílias, associada ao resultado eleitoral e às expectativas em relação à implementação das reformas prometidas, pode sim constituir fator favorável à aceleração do crescimento, mas o impacto, a duração e os desdobramentos que terá são muito incertos e seus efeitos devem ser cotejados com as limitações e as incertezas persistentes, no cenário interno e no quadro internacional.

O ponto central, determinante para a intensidade da retomada do crescimento, é que não estão claras as forças de demanda que o impulsionarão em 2019 e anos seguintes. Por mais que os fatores relacionados à melhoria da confiança dos chamados agentes econômicos (empresas e famílias) possam atuar favoravelmente persistem fortes restrições ao incremento dos gastos empresariais e do consumo das famílias, sem falar nas limitações fiscais e legais para a expansão dos gastos públicos.

A situação do mercado de trabalho é ainda muito precária e o grau de endividamento das famílias permanece muito elevado para se contar com uma retomada firme da demanda por consumo, enquanto o grau de endividamento das empresas, a elevada ociosidade de recursos nos diversos segmentos produtivos e, sobretudo, a falta de um equacionamento para a crise da construção civil, não autorizam expectativas muito otimistas para a retomada dos investimentos.

 Publicado no Jornal da Cidade em 06/01/2019