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Praça São Francisco, São Cristovão-SE. Patrimônio da Humanidade

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Indústria, serviços e as perspectivas da economia brasileira


 
Ricardo Lacerda

A crise financeira internacional atropelou a indústria brasileira. O desempenho ruim da produção física  nesse início de 2014 é apenas mais um capítulo nas dificuldades que a indústria de transformação brasileira vem enfrentando desde o final de 2008. No primeiro quadrimestre de 2014, a indústria geral (ind. transformação + extrativa mineral) recuou 1,2% em relação ao mesmo período do ano anterior, abortando, mais uma vez, a retomada que tentava ensaiar.

O comportamento extremamente instável da trajetória da indústria brasileira nos últimos anos é sintoma de dificuldades que vem enfrentando e coloca na ordem do dia a questão da competitividade de nosso parque manufatureiro.

Descolamento

O Gráfico 1 não deixa dúvidas quanto ao descolamento da trajetória da indústria de transformação em relação ao PIB a partir do último trimestre de 2008. Desde então, a evolução da indústria de transformação tem sido não apenas anêmica, como instável.

Depois da recuperação em 2010, o nível de produção física da indústria de transformação voltou a recuar a partir de meados de 2011, depois do segundo mergulho da crise internacional. Ensaiou nova retomada em 2013 e voltou a entornar no final daquele ano, como resultado do anúncio da reversão da política de expansão monetária norte-americana e da queda de confiança de consumidores e empresários internamente.

Crescendo em ritmo relativamente ajustado com o PIB até o terceiro trimestre de 2008, a indústria de transformação descolou a partir de então e, depois de oscilar, chega ao final do 1º trimestre de 2014 com o mesmo nível de atividade, em doze meses acumulados, de setembro de 2008, enquanto o PIB se situa 14,8% acima e o setor de serviços, 16,3% (ver Gráfico 1). 


Fonte: IBGE-CNT. Série sem efeitos sazonais.



Preços relativos

A trajetória problemática da indústria manufatureira, essa é a nossa hipótese, decorre, de um lado, do agravamento do quadro internacional e, de outro, da natureza da reação adotada internamente para manter aquecido o nível de atividade da economia brasileira naquele cenário externo extremamente ruim. Trocando em miúdo,  quando a situação internacional agravou-se, o Brasil deu uma resposta inversa a da crise de 1930; se preservou o nível da demanda interna o fez por meio da expansão do consumo, estimulando assim a demanda das atividades produtoras de bens não comercializáveis, como a prestação de serviços ofertados no mercado interno, mas sacrificou a produção industrial. Procedeu assim porque os canais de financiamentos externos se mantiveram abertos  e permitiram que financiasse os déficits crescentes de transações correntes por meio da conta de capital.

O erro estratégico, pelo qual a estrutura produtiva interna paga um preço elevado, foi permitir que o real retomasse, ainda no segundo semestre de 2009, a trajetória de valorização iniciada em 2004 e que havia sido interrompida no momento do dêbacle financeiro em setembro de 2008. Uma mudança de vulto e persistente nos preços relativos entre os bens comercializáveis e não comercializáveis, naquela ocasião, teria assegurado a competitividade da produção manufatureira interna, mesmo que isso custasse uma parcela do incremento do consumo que se pretendeu estimular.  


Indústria e Serviços

Um aspecto que tem sido pouco observado no debate sobre a perda de competitividade da economia brasileira é que a crise financeira internacional não mudou as condições de competitividade apenas da atividade industrial. A parcela das atividades de serviços que é comercializável no mercado internacional, cada vez mais importante, também foi intensamente impactada depois de 2008. Entre 2008 e 2013, os serviços (chamados de não fatores) importados em termos líquidos passaram de US$ 16,7 bilhões para US$ 47,7 bilhões, incremento de 182% (ver Gráfico 2). 

Esse agrupamento inclui itens que têm pesado no aumento do déficit externo nas relações correntes, como turismo, aluguel de equipamentos, transporte e serviços computacionais.

Do incremento do déficit de transações correntes pós 2008, decorrente da deterioração do cenário externo e da manutenção do câmbio valorizado, o peso do aumento dos gastos com serviços foi significativamente superior à contribuição decorrente da perda de competitividade nas exportações de bens (ver Gráfico 2). O aumento das importações líquidas de tais serviços respondeu por 56% do incremento do déficit nas transações correntes, frente aos 41% originários da redução do saldo da balança comercial. A situação do cambio, portanto, não diz respeito apenas à competitividade da atividade industrial. Atinge de forma crescente as atividades de serviços e torna insustentável a situação do balanco de pagamento no médio prazo.


Fonte: Banco Central do Brasil.



Publicado no Jornal da Cidade em 08/06/2014

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