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Praça São Francisco, São Cristovão-SE. Patrimônio da Humanidade

segunda-feira, 10 de março de 2014

Uma breve história do projeto carnalita


Ricardo Lacerda
O jornal Valor Econômico publicou na última sexta-feira, 07 de março, que a companhia Vale adiou para 30 de março do corrente a decisão de implantar ou não o Projeto Carnalita em Sergipe. Segundo a empresa os estudos de viabilidade técnica de exploração da Carnalita já foram concluídos positivamente e a única pendência existente é a disputa entre os municípios de Capela e Japaratuba, cujo desfecho se encontra atualmente na Assembleia Legislativa do Estado de Sergipe, onde tramita proposta de repartição de receitas tributárias.

Trata-se de projeto grandioso, que prevê a produção de 1,2 milhão de toneladas ano de cloreto de potássio, em sua primeira etapa, podendo atingir até 2,2 milhões de toneladas com a maturidade do projeto. O potássio é um dos intermediários básicos na produção de fertilizantes e o grau de importação do produto é de cerca de 90% do consumo nacional.

O Projeto Carnalita prevê a criação de cerca de quatro mil empregos diretos durante a implantação, aos quais devem ser somados alguns milhares de empregos indiretos. As receitas dos dois municípios, ao longo dos 30 anos de exploração do minério, devem alcançar a notável cifra de 1,5 bilhão de reais.

Retardamento

Estarrece ao cidadão sergipano que a aprovação de autorização das instalações da empresa, de competência municipal, venha se estendendo desde meados de 2013, pondo em risco um dos empreendimentos econômicos mais importantes da história econômica de Sergipe.

Esse retardamento põe em risco a presença da Vale em Sergipe, porquanto a exploração do potássio a partir da silvinita, na mina Taquari-Vassouras, cuja produção se iniciou em 1986, ainda pela estatal Petromisa, integrante do sistema Petrobras, encontra-se próxima à exaustão, com produção em declínio e previsão de encerramento antes do final da presente década.  

Histórico do projeto carnalita

Segundo a empresa Vale, desde 2001 a companhia vem desenvolvendo esforços para o aproveitamento das rochas carnalíticas de Sergipe visando a produção de cloreto de potássio (KCl).

Como o teor de concentração de cloreto de potássio nas rochas carnalíticas é muito inferior ao presente na silvinita, a Vale buscou alternativas tecnológicas de exploração das reservas. Os testes realizados apontaram a inviabilidade da utilização dos métodos tradicionais de mineração.

A partir de 2008, a empresa implementou um teste piloto no município de Maruim. A alternativa tecnológica encontrada foi a produção de cloreto de potássio (KCl) por meio de “lavra de dissolução”, produzindo uma salmoura rica de sais de potássio, sódio e magnésio. A salmoura passa então por quatro etapas de evaporação e em seguida executam-se a cristalização, secagem e compactação do produto.

Impasses

A viabilização do Projeto Carnalita exigiu esforço de articulação de grande monta por parte do governo de Sergipe, muito particularmente do empenho pessoal do Governador Marcelo Déda.

No início de 2011, dois eram os impasses que ameaçavam a exploração da carnalita, muito mais complexos do que as atuais disputas municipais: em primeiro lugar, os direitos minerários de exploração das jazidas pertencem a Petrobras e o contrato de arrendamento entre a Vale e a Petrobrás, firmado em 1991 com vigência de 25 anos, se aproximava do término e a empresa Vale não iniciaria um projeto da dimensão prevista sem a segurança  dos direitos de lavra devidamente definidos.

Ao longo do primeiro semestre de 2011, o governador Marcelo Déda fez seguidas reuniões com as diretorias da Petrobras e da Vale visando desatar o nó que envolvia a cessão dos direitos de lavra.

É necessário, nesse momento, fazer um depoimento de quem acompanhou de perto o governador Marcelo Déda nas articulações para que as empresas chegassem a um acordo, ao lado dos secretários Oliveira Júnior, Zeca da Silva e João Andrade: as negociações entre as empresas foram muito acirradas e em diversas ocasiões tudo voltava à estaca zero. O cerne do conflito era a resistência da Petrobras em ceder os direitos de lavra com o argumento de que a área solicitada pela Vale era muito extensa e que havia sobreposição com jazidas petrolíferas de interesse da Petrobras.

Em determinada reunião, testemunhada por mim e pelos supracitados, o governador Marcelo Déda exasperou-se e declarou aos brados que Sergipe não seria a ostra esmagada entre o mar e a rocha, pelos interesses das duas gigantescas companhias. Procurou, ainda no primeiro semestre de 2011, o apoio político da já presidente Dilma Rousseff a fim de superar os desacordos que se estendiam demasiadamente.

As negociações entre as empresas avançaram e finalmente, em fevereiro de 2012, os novos presidentes das companhias, Murilo Ferreira (Vale) e Graça Foster (Petrobras) já anunciavam o acordo de cessão do direito de lavra por mais 30 anos, o que assegurava não apenas a implantação do Projeto Carnalita, como a continuidade da exploração da mina Taquari-Vassouras.

No dia 13 de abril de 2012, Petrobras e Vale, por meio de seus presidentes Graça Foster e Murilo Ferreira, assinaram protocolo de intenções que contemplava a cessão dos direitos e dez dias depois, em 23 de abril, a presidente Dilma Rousseff veio anunciar pessoalmente em Sergipe a superação dos impedimentos.  

Frente à complexidade da negociação da cessão dos direitos de lavra, o segundo impasse, de caráter técnico e material, era relativamente menor, mas sem a sua superação o projeto estaria condenado.

A nova tecnologia de extração do potássio era altamente intensiva no consumo de gás natural e não havia garantia de fornecimento do insumo nos montantes necessários, diante das restrições de produção e distribuição internamente no país. Apenas na primeira fase, o projeto demandaria 760 mil m3/dia de gás natural, algo em torno de três vezes todo o consumo atual de gás natural em Sergipe. Novamente o governador Marcelo Déda intercedeu, procurando em 2011 a então diretora de gás da Petrobras, a atual presidente da empresa Graça Foster, que muito prontamente assegurou que buscaria os meios necessários para viabilizar o fornecimento.  

Futuro
As riquezas minerais de Sergipe são uma dádiva da natureza. A luta pela sua exploração remonta à primeira metade do século XX e até alcançar a exploração de fato, a partir da década de sessenta, muitos foram os episódios decisivos. Grandes nomes, a exemplo do economista Aloísio de Campos, do jornalista Orlando Dantas, dos governadores Seixas Dórea e Augusto Franco e mais recentemente do governador Marcelo Déda, debateram-se em defesa de projetos de exploração mineral que ajudaram a construir Sergipe. Tenho confiança que interesses mesquinhos não se sobreporão ao compromisso com o futuro de Sergipe.

Publicado no Jornal da Cidade, em 09/03/2014

















O governador Marcelo Déda e a presidenta Dilma Rousseff durante a cerimônia de assinatura de contrato entre a Petrobras e a Vale para arrendamento das reservas de potássio no estado de Sergipe / Foto: Roberto Stuckert Filho/PR. Em 23 de abril de 2012.

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