Marcelo Déda, um herói sergipano
Ricardo Lacerda
Marcelo Déda é um herói sergipano. E
dos grandes. Marcelo Déda dedicou sua vida à luta pela emancipação política,
econômica e social da gente sergipana. Como ele costumava dizer, uma luta pela dignidade
do povo sergipano e por uma vida mais justa e melhor para a nossa gente.
Marcará a história de Sergipe não apenas pelo episódio trágico de ter morrido
em pleno mandato de governador, acontecimento sem precedente em Sergipe, uma
morte precoce aos 53 anos de idade, ou pela dignidade com que enfrentou a via
crucis do agravamento da doença, dia após dia. Marcelo Déda marcará a vida
sergipana e o tempo o consagrará como o maior governador da história de
Sergipe.
Difícil caracterizar Marcelo Déda do
ponto de vista pessoal. Em uma palavra, uma pessoa digna. A dignidade para ele
estava acima de qualquer coisa. Dignidade no zelo da coisa pública, dignidade
de estar ao lado e combater sempre pelas boas causas, das causas sempre
defensáveis, jamais por interesses mesquinhos ou particularistas. Em duas
palavras, uma pessoa digna e comprometida. Seu compromisso em lutar pela
melhoria de vida das pessoas mais pobres, dos excluídos, não era da boca para
fora. Era real, concreto, se manifestava no dia a dia de suas ações, na forma
corajosa com quem enfrentava os ataques dos adversários e o assédio de quem não
entendia que seu compromisso com o bem estar do povo era pra valer e que ele,
Marcelo Déda, não titubearia em refutar todas as demandas que não fossem
legítimas e defensáveis. Aos que apelavam por flexibilidade, ele respondia que
tinha os seus limites bem definidos, e que esses limites eram circunscritos
pela posição de jamais abrir mão de sua dignidade e do compromisso que
estabeleceu historicamente com o povo sergipano.
Uma pessoa digna, comprometida e
brilhante. O brilhantismo de Marcelo Déda era reconhecido em todo o país, até
mesmo pelos seus adversários. Diferentemente do que alguns procuravam colocar a
pecha, o brilhantismo de Marcelo Déda não se manifestava apenas nos discursos
memoráveis que costumava proferir, no fato de ser um dos maiores oradores
brasileiros de sua geração, na perspicácia e na agilidade intelectual com que
enfrentava os debates públicos. Marcelo Déda era brilhante principalmente
porque tinha uma compreensão mais aguda e mais abrangente das questões que lhe
desafiavam, tanto na condução dos assuntos políticos quanto nas questões
administrativas. Homem culto, detentor de inteligência invulgar, compreendia de
forma arguta e profunda as consequências e as implicações das disputas e
decisões que a ele se apresentavam.
Uma pessoa digna, comprometida,
brilhante e destemida. Desde muito jovem, Marcelo Déda mostrou coragem e
determinação em enfrentar as forças que subjugam desde sempre o povo sergipano.
E com essas características liderou o primeiro governo realmente popular da
história de Sergipe.
Quando se referia à mesmice que
marcava a vida política de Sergipe, Marcelo Déda tinha clareza da dificuldade
de romper o domínio histórico das forças oligárquicas sobre a máquina pública e
as consequências disso em termos de apropriação e concentração da riqueza no
nosso estado. Essas mesmas forças que tentaram durante toda a administração
promover um cerco ao seu governo.
Em seu discurso de posse, Marcelo
Déda assinala que, após décadas de dominação oligárquica, desde o rompimento da
normalidade democrática pelo golpe militar de 1964 que afastou o governador
Seixas Dórea, Sergipe não empossava um governo de centro-esquerda e
jamais o estado de Sergipe havia eleito um governador de um partido claramente
de esquerda. E, de fato, até o início de 2007, Sergipe era um dos últimos
estados do país em que os grupos políticos que deram sustentação ao regime
militar mantinham-se à frente do governo estadual, de forma ininterrupta.
Cabia, portanto,
dar outro rumo ao governo de Sergipe. Cabia fazer uma administração de fato
democrática, voltada para os mais necessitados, para os quais as ações se
limitavam em geral a práticas assistencialistas ou clientelistas.
A consciência de
que os fundos públicos e o poder político tradicionalmente são manipulados para
assegurar os privilégios da elite, do poder oligárquico como preferia chamar, o
impele a ser enfático quando busca explicitar o sentido da mudança de que está
imbuído em implantar. Em seu discurso de posse na Assembleia Legislativa do
estado de Sergipe Marcelo Déda sublinhava que:
“Décadas de
dominação oligárquica cristalizaram na vida pública sergipana, um conjunto de
erros políticos, vícios administrativos e desvios éticos. A mesmice tornou-se a
matéria-prima das ações de governo e a incompetência administrativa lançou fora
oportunidades históricas que poderiam ter melhorado a vida do nosso povo e
avançado a marcha de Sergipe rumo ao desenvolvimento ... Falsas prioridades,
ditadas por interesses politiqueiros, quando não inconfessáveis, terminaram por
lançar o interior do estado no mais completo abandono, diminuir a força da
agricultura, limitar a política industrial e, na prática, ameaçar o futuro da
economia do nosso estado.”
Assim, o controle
oligárquico do Estado era entendido por ele não apenas como excludente social e
politicamente, mas também como impeditivo do avanço econômico do Estado.
Marcelo Déda tinha
uma compreensão ampla sobre o desenvolvimento. O compromisso com a nova forma
de fazer política se explicitou nos dois grandes eixos de políticas do governo:
a inclusão pelos direitos, através da oferta de políticas públicas de acesso
universal e de qualidade; e a inclusão pela renda, através da atração de
investimentos privados, e do papel emulador do estado, agora lastreado numa
política séria de planejamento e de implantação de infraestrutura produtiva por
todo o território estadual.
Desde o inicio de
sua administração mostrou a determinação de dar às políticas públicas o caráter
universal que elas devem ter. As questões sociais sempre precediam as demandas
econômicas e particularistas, pois não deixava se aprisionar pelo mito do
crescimento pelo crescimento.
Na definição dos
investimentos públicos e na indução dos investimentos privados se pautou pela
preocupação explícita em promover um desenvolvimento mais equilibrado espacialmente,
levando investimentos e empregos e políticas sociais às áreas mais pobres do
estado.
Não menos
importante foi a adoção de políticas voltadas aos temas da cidadania, como o
respeito aos direitos humanos, o compromisso com a sustentabilidade dos
recursos ambientais e com um governo participativo. Adotou, portanto, um
sentido de inclusão que não se restringe às questões econômicas e sociais,
posto que abrange também a dimensão cultural, relacionada à valorização da
sergipanidade, a valorização da autoestima do povo, e uma dimensão política, de
construção da cidadania.
Marcelo Déda será consagrado como o
maior governador da história de Sergipe porque soube harmonizar a realização de
investimentos voltados para assegurar o desenvolvimento econômico e gerar
oportunidades de emprego e renda para a população sergipana, com a adoção de um
conjunto muito amplo de políticas públicas, em parceria com o governo
federal, voltadas para promover a melhoria de vida da parcela da população mais
sofrida e injustiçada.
Fui testemunha diária de que, acima
de tudo, Marcelo Déda foi um governante de conduta ética irrepreensível, que
nunca deixou de se guiar senão pelos mais legítimos interesses da cidadania
sergipana e pelo compromisso com o presente e futuro da gente sergipana.
Sergipe fica órfão de seu maior líder popular. Viva Marcelo Déda! Viva o Povo
Sergipano!
Publicado no Jornal da Cidade, em 02 de dezembro de 2013
Publicado no Jornal da Cidade, em 02 de dezembro de 2013
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