Ricardo Lacerda
Foram
muitas e expressivas as mudanças no mercado de trabalho brasileiro nos últimos
dez anos. O emprego formal cresceu a taxas muito elevadas e se expandiu em
direção a novas áreas do país; a remuneração média se elevou, assim como a
escolaridade do trabalhador; e, principalmente, a taxa de desocupação caiu a
menos da metade. Um aspecto foi particularmente virtuoso: o crescimento mais
acelerado do emprego formal nas regiões mais pobres do país relativamente à
expansão nas regiões mais ricas e industrializadas.
Todas
essas melhorias não significam, todavia, que o mercado de trabalho no Brasil
tenha se tornado maduro, próximo da situação encontrada nos países
desenvolvidos. Persiste muita precariedade. O nosso mercado de trabalho é ainda
marcado por uma participação elevada, mesmo que decrescente, de pessoas na
atividade informal, entre pessoas empregadas sem carteira de trabalho,
ocupações por conta própria e empregadores sem cobertura da previdência e um
grupo residual de trabalhadores em atividades de autoconsumo. O nível médio de
instrução da força de trabalho permanece baixo, apesar das melhorias expressivas
nesse quesito.
As
mudanças positivas no mercado de trabalho nesse período estiveram fortemente associadas
à aceleração do crescimento econômico a partir de 2004 e à política de
valorização do salário mínimo.
Crescimento e emprego
Em
artigo publicado em 1951 intitulado formação
de capital e desenvolvimento econômico, Celso Furtado tratou de tema
recorrente no debate que se travava no pós segunda guerra em torno das
políticas voltadas para promover o desenvolvimento econômico entre os países
pobres.
Para
Furtado, mais restritivo do que o tamanho do mercado interno (afinal havia a
alternativa, em alguns períodos mais favoráveis e outros menos favoráveis, de
vender ao mercado mundial parcela da produção realizada no país), era o fato de
que os países pobres não dispunham de capitais acumulados no montante
necessário para acelerar o investimento para modernizar e diversificar a
estrutura produtiva em direção a atividades de maior produtividade econômica.
Furtado
aponta que existiria a alternativa de apelar para o capital externo a fim de acelerar
o crescimento econômico dos paises pobres, subdesenvolvidos como ele julgava
mais correto denominar, mas, dependendo das características assumidas pelo
crescimento econômico, não seria sustentável a longo prazo depender da poupança
externa e estragulamentos no balanço de pagamento poderiam se tornar
inevitáveis.
Uma marca
distintiva do mercado de trabalho dos países subdesenvolvidos é a de que a
disponibilidade de capital é insuficiente para ocupar toda a força de trabalho
disponível, razão pela qual é persistente o excedente estrutural de força de
trabalho que, sem encontrar oportunidades nos segmentos modernos, vai buscar
alternativas de sobrevivência em atividades de muita baixa produtividade, como
é o caso daquelas realizadas no setor informal.
Para
que o desemprego estrutural fosse eliminado dos países pobres seria necessário
que o crescimento econômico gerasse ocupações em ritmo mais intenso do que a
expansão da População Economicamente Ativa (PEA), até atingir o pleno emprego estrutural
do fator trabalho.
Pleno emprego
O ciclo
expansivo da economia brasileira iniciado em 2004 provocou forte aceleração da
demanda por trabalho, fazendo que o nível de ocupação passasse a crescer a
taxas acentuadas, enquanto mudanças nos padrões demográficos desacelerava o
crescimento da PEA.
A taxa
de desocupação nas regiões metropolitanas pesquisadas pelo IBGE atingiu 4,9% em
abril de 2014, último resultado agregado para o país que se encontra
disponível por conta da longa greve dos funcionários da instituição, bem menos
da metade da taxa de abril de 2004, de 13,1% (ver Gráfico).
Mesmo
com a desaceleração do crescimento nos últimos três anos, a taxa de desocupação
continuou recuando. Analistas têm assinalado um fenômeno muito positivo que
ajuda a explicar porque a taxa de desocupação manteve-se baixa nos anos mais
recentes; uma parcela importante dos jovens estaria adiando o momento de
entrada no mercado de trabalho, estendendo o período dedicado à elevação da
escolaridade e à formação profissional.
A partir de 2010, observadores começaram a se
referir a uma situação de pleno emprego na economia brasileira, o que não é um
ponto pacífico no debate. Se é patente que o mercado de trabalho continua pressionado,
basta constatar que, mesmo com a desaceleração do crescimento, a maior parte
dos dissídios coletivos tem resultado em aumentos salariais superiores à
inflação do período, isso não equivale a afirmar que o desemprego estrutural
teria sido, afinal, eliminado. A taxa de informalidade no mercado de trabalho é
ainda muito elevada, de cerca de 30%, e nas regiões mais pobres, Norte e
Nordeste, se situa em quase 60%.
Não há,
nesse sentido, clareza que a situação do mercado de trabalho constitua em obstáculo
físico que estabeleça um limite ao potencial de crescimento de longo prazo da
economia brasileira.
Fonte:
IBGE. PME.
Publicado no Jornal da Cidade, 31/08/2014
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