Ricardo Lacerda
A redução recente das diferenças no desenvolvimento
econômico entre as regiões brasileiras mais prósperas e as mais pobres pode ser
observada em muitas dimensões. As transferências federais de renda foram sem
dúvida um fator importante na diminuição das disparidades, mas não é o único. A elevação do poder de compra do salário
mínimo tem um impacto muito maior nas regiões mais pobres do que nas de níveis
de renda mais elevados, da mesma forma que o acesso ao crédito para as faixas
de renda mais baixas é mais importante para elas.
As macrorregiões brasileiras com maior
incidência proporcional de pobres e de menor rendimento médio, por ordem, o
Nordeste e o Norte, e em grau bem menos acentuado, o Centro-Oeste, vêm
apresentando, sistematicamente, no último decênio, taxas de crescimento de
renda, de PIB e de consumo, superiores às registradas pelas regiões
relativamente mais ricas, Sudeste e Sul.
Uma questão central é tentar avaliar os
efeitos do crescimento mais acentuado dessas regiões em termos de sua
realimentação e sustentabilidade para gerar um ciclo virtuoso de redução da
pobreza e de convergência regional dos níveis de desenvolvimento, na medida em
que a expansão recente proporcionou o aumento do tamanho de mercado e ampliou e
qualificou os fatores de oferta, como o capital social básico, o parque
produtivo e os recursos humanos e tecnológicos.
Ainda que as diferenças de
desenvolvimento entre as regiões mais ricas e mais pobres permaneçam muito
amplas, a redução obtida no passado recente autoriza expectativas relativamente
otimistas de que as desigualdades regionais de desenvolvimento possam ser estreitadas
de forma importante e consistente.
Para deixar claro, não estamos
afirmando que seria razoável esperar que, em um futuro próximo, as diferenças
de desenvolvimento entre as regiões brasileiras possam desaparecer ou se
tornarem residuais, elas são muito amplas em qualquer dimensão considerada, e
sim de que é possível reduzi-las de forma substantiva.
Em relação a dez anos atrás, as regiões
mais pobres aumentaram suas participações no bolo nacional quando se
observa o mercado de consumo, a receita
tributária, a renda e, como veremos em seguida, o emprego formal.
Emprego setorial
Convidamos o leitor a seguir nos
próximos parágrafos um singelo exercício de análise da evolução do emprego
formal nas regiões entre 2002 e 2012 que constata importante avanço das regiões
mais pobres, relativamente às regiões mais ricas, em praticamente em todos os setores
de atividade.
Para evitar alguns vieses, não foram
considerados os empregos no setor de administração pública e foram calculadas
médias trienais para as extremidades do período, respectivamente as médias do
estoque de emprego de 2002-2004 e de 2010-2012, para evitar que o comportamento
atípico, para cima ou para baixo, em um ano determinado contaminasse o
resultado obtido.
Na comparação entre as duas médias
trienais, o emprego formal aumentou em 14 milhões de ocupações no setor privado
brasileiro, um incremento de 61%, resultado extraordinário em todos os
sentidos.
Dentre os cinco setores ou agrupamentos
de setores considerados, dois cresceram em velocidade superior à média da
economia, a campeã construção civil, notáveis 147%, e o comércio, 70%. O setor serviços, maior empregador, cresceu ao
mesmo ritmo da média do conjunto da economia, 61%, e a indústria geral
(incluindo ainda os serviços industriais de utilidade pública), com 46%, e a agricultura,
com 19%, registraram crescimento abaixo da média.
Regiões
No conjunto do setor privado, o emprego
formal aumentou em 92% no Norte, 76%, no Nordeste, e 71% no Centro-Oeste,
frente às taxas de 57% e 53% nas regiões Sudeste e Sul (na parte superior da
tabela, foram destacadas as células em que o desempenho por região foi superior
aos da média nacional).
Na comparação
entre os triênios 2002-04 e 2010-12, o emprego formal nas regiões Norte,
Nordeste e Centro-Oeste cresceu em ritmo mais acelerado do que a média nacional
em todos os setores de atividade. No Nordeste, emprego formal somente não
cresceu acima da média do país na agropecuária.
Na comparação entre as duas médias
trienais, o emprego formal no Nordeste aumentou 199% na construção civil, 92%
no comércio, 58% no setor de serviços e a atividade industrial ampliou em 55%.
Redistribuição do emprego
Um aspecto positivo
é que o crescimento mais rápido do emprego nas regiões mais pobres equivale a uma
redistribuição espacial importante, que pode ser quantificada, em que os
principais beneficiários foram, por ordem de valor absoluto, o Nordeste, o
Norte e o Centro- Oeste.
Aplicando-se a
versão mais simples do modelo Diferencial-Estrutural (também conhecido como
shift-share), verifica-se que, na comparação entre as duas médias trienais, o
Nordeste que apresentou uma variação absoluta do emprego formal de cerca de 2,5 milhões de ocupações
teria gerado apenas cerca de 2,0 milhões, se essa variável tivesse evoluído na
região ao mesmo ritmo médio do país.
Ou seja, o
desempenho diferenciado propiciou a região em torno de 500 mil empregos a mais,
o que é um resultado muito significativo. Para a região Norte foram
redistribuídos cerca de 260 mil empregos e para o Centro-Oeste, 166 mil (ver a
última linha da tabela). Enquanto isso, as regiões Sudeste e Sul deixaram de
criar, respectivamente, 569 mil empregos e 368 mil empregos, por não terem
acompanhado a média nacional.
A tabela apresenta
ainda, na faixa intermediária que mostra o Efeito Competitivo, quanto cada
região gerou a mais ou deixou de gerar, por setor de atividade, pelo fato de
ter crescido acima ou abaixo da média nacional do segmento.
Tabela. Indicadores de geração de Emprego Formal
no setor privado entre a média de 2002-2004 e 2010-2012
|
||||||
Item
|
TAXA DE CRESCIMENTO DO EMPREGO FORMAL POR SETOR
|
|||||
Região Natural
|
Norte
|
Nordeste
|
Sudeste
|
Sul
|
Centro-Oeste
|
Brasil
|
Indústria Geral e SIUP
|
56%
|
55%
|
44%
|
39%
|
72%
|
46%
|
Construção Civil
|
228%
|
199%
|
129%
|
119%
|
151%
|
147%
|
Comércio
|
101%
|
92%
|
63%
|
66%
|
74%
|
70%
|
Serviços
|
87%
|
72%
|
58%
|
56%
|
64%
|
61%
|
Agropecuária
|
93%
|
11%
|
10%
|
14%
|
50%
|
19%
|
TOTAL DO EMPREGO PRIVADO
|
92%
|
76%
|
57%
|
53%
|
71%
|
61%
|
Item
|
EFEITO COMPETITIVO NA GERAÇÃO DE EMPREGO
|
|||||
Indústria Geral e SIUP
|
20.668
|
69.102
|
-56.580
|
-106.139
|
72.950
|
|
Construção Civil
|
43.704
|
104.976
|
-103.913
|
-48.021
|
3.254
|
|
Comércio
|
68.868
|
167.486
|
-211.197
|
-41.117
|
15.960
|
|
Serviços
|
81.475
|
145.308
|
-166.435
|
-82.964
|
22.617
|
|
Agropecuária
|
30.989
|
-17.649
|
-53.570
|
-10.142
|
50.372
|
|
TOTAL DO EMPREGO PRIVADO
|
245.703
|
469.223
|
-591.696
|
-288.382
|
165.152
|
|
Item
|
EEFEITO ESTRUTURAL NA GERAÇÃO DE EMPREGO
|
|||||
TOTAL DO EMPREGO PRIVADO
|
17.500
|
38.859
|
22.354
|
-79.268
|
555
|
|
Item
|
TOTAL DAS VANTAGENS REGIONAIS NA GERAÇÃO DO
EMPREGO
|
|||||
TOTAL DO EMPREGO PRIVADO
|
263.203
|
508.081
|
-569.342
|
-367.650
|
165.708
|
Fonte:
MTE-RAIS. Obs. Foram excluídos apenas os empregos da administração pública
direta e das autarquias. Os quantitativos de emprego nas empresas públicas
estão contabilizados nos setores de atividade em que as instituições atuam.
Publicado no Jornal da Cidade em 03/11/2013
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