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Praça São Francisco, São Cristovão-SE. Patrimônio da Humanidade

terça-feira, 27 de julho de 2010

A composição dos orçamentos das famílias sergipanas por faixas de renda**

Ricardo Lacerda*

A situação dos rendimentos das famílias brasileiras tem melhorado no período recente, inclusive os rendimentos das famílias de Sergipe. Estudo do IPEA revelou que, entre 1995 e 2008, mais de 13 milhões de brasileiros superaram a situação de pobreza extrema, caracterizada pelo rendimento familiar mensal por pessoa inferior a ¼ do salário mínimo. Em Sergipe, especificamente, em 1995, 41% das famílias se encontravam abaixo desse patamar de rendimentos, participação que caiu para 21,3%, em 2008, ainda alto, mesmo considerando que é o segundo melhor resultado dentre os dos estados nordestinos, logo depois do Rio Grande do Norte. A diminuição da pobreza extrema é uma boa notícia, mas o mais importante é que o IPEA projetou que, com redução anual de 2,7%, até 2016 é possível promover o conjunto das famílias sergipanas para fora da pobreza extrema.

Elevar o nível de renda das famílias mais pobres é fundamental para a melhoria da qualidade de vida das pessoas e assim construir uma sociedade menos desigual e mais harmoniosa. O aspecto mais relevante é o de que, talvez, pela primeira vez, estejam disponíveis as condições materiais, políticas e de aprendizado social para que a pobreza seja superada em nosso país, em nossa região, em nosso Estado.

O nível de rendimento familiar é a mais importante variável na explicação da composição dos gastos das famílias. Neste artigo examina-se como as famílias sergipanas distribuem suas despesas de acordo com as faixas de renda. Esse corte permite que sejam mais bem apreendidas as formas de sobrevivências das famílias sergipanas, diante da restrição orçamentária. Os dados são provenientes Pesquisa de Orçamentos Familiares- POF, do IBGE, referente aos anos de 2008 e 2009.

Orçamentos

Em 2008-2009, a média mensal de gastos da família sergipana era de R$ 1.809,83, 6,4% acima da média nordestina e a segunda maior da região Nordeste, logo depois da média da Bahia. Essas despesas eram distribuídas entre consumo para atender as necessidades das famílias (R$ 1.680), a realização de algum tipo de poupança (R$ 88) e o pagamento de dívidas (R$ 42).

Uma característica que influencia os orçamentos familiares é o tamanho da unidade domiciliar que, no ano da pesquisa, era de 3,6 pessoas em média em Sergipe e esse tamanho não variava significativamente com o nível de renda.
A composição dos gastos das famílias depende principalmente do nível de rendimento familiar. As famílias mais pobres comprometem uma parcela grande do orçamento com despesas com alimentação, habitação e deslocamento, sobrando poucos recursos para os gastos em outros itens importantes da vida. Mesmo esses gastos mais essenciais, frequentemente, são insuficientes e ainda é necessário dispor de recursos para outros itens da vida, como a aquisição de vestuário, saúde, educação, higiene e cuidados pessoais, acesso à cultura e lazer, serviços pessoais e outros.

Faixas de renda

A pesquisa do IBGE informa que, em 2008, as famílias sergipanas com rendimento total e variação patrimonial de até R$ 830,00, comprometiam mais de 2/3 (68,8%) do seu orçamento com gastos com alimentação e habitação, quando a média das famílias sergipanas dedicava 49% com esses grupos de itens. É fácil verificar no gráfico como a parcela direcionada aos gastos com alimentos e habitação (marcada na cor branca), cai rapidamente na medida em que são consideradas faixas de renda mais elevadas. Assim, as famílias com rendimento médio mensal superior a R$ 10.375 comprometem cerca de 30% do orçamento com alimentação e habitação. Ver gráfico. Isso significa que, na medida em que os rendimentos vão se elevando, as famílias podem deslocar mais recursos para fazerem frente a outras despesas de consumo, como o melhor acesso a educação, a saúde e serviços pessoais e a cultura e lazer.

Um aspecto que chama a atenção é o grau de comprometimento com a aquisição de veículos que respondia, em 2008, por 7% do rendimento médio das famílias sergipanas. Sem dúvida a facilidade de crédito e o sonho de consumo explicam esse tipo de dispêndio que, naturalmente, é mais comum nas faixas de renda mais elevadas, mas que se tem tornado crescentemente realidade em grupos de rendas intermediários. Em média, as famílias com rendimentos superiores a R$ 10.375 dedicavam cerca de 10% dos seus orçamentos com a aquisição de veículos. No estrato de renda mais baixo, as despesas com deslocamento se situavam em torno de 2% do orçamento.



Um outro aspecto importante é a capacidade das famílias de investirem no aumento dos seus patrimônios, com a aquisição de imóveis, aplicações financeiras e outros. Em níveis de rendimentos mais baixos, a parcela da renda direcionada a aquisição de ativos é inexpressiva frente à urgência das despesas com a sobrevivência da família. No estrato de rendimento mais baixo, em média, apenas 1,1% do orçamento é utilizado para aquisição de patrimônio. A pesquisa revela que, somente a partir de um orçamento familiar acima de R$ 4.150, as famílias sergipanas passam a contar com uma parcela expressiva da renda voltada para esse intuito. Na faixa de rendimento familiar entre R$ 4.150 e R$ 6.225, as famílias já dedicavam 6,1% dos gastos para o aumento do patrimônio, participação que podia superar os 10% do rendimento familiar nos casos das famílias que auferiam mensalmente acima desse patamar. Dentre esses investimentos, o mais expressivo, sem termos de comparação com nenhum outro, é aquele efetuado com a aquisição ou reforma de imóvel.

A elevação dos rendimentos das famílias brasileiras constatada pelo IBGE tem significado melhorias concretas nas condições de vida da população mais pobre. A ampliação do mercado de trabalho e a disseminação dos programas de transferências de renda explicam parte expressiva dessa melhoria. Há muito ainda o que caminhar. A composição das despesas familiares mostra que uma parcela muito expressiva da população ainda se defronta com fortes restrições orçamentárias e que é necessário intensificar as políticas sociais para esses setores.

* Professor do Departamento de Economia da UFS.
** Publicado no Jornal da Cidade em 18/07/2010.

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