Ricardo
Lacerda
O jornal Valor Econômico publicou na última
sexta-feira, 07 de março, que a companhia Vale adiou para 30 de março do
corrente a decisão de implantar ou não o Projeto Carnalita em Sergipe. Segundo
a empresa os estudos de viabilidade técnica de exploração da Carnalita já foram
concluídos positivamente e a única pendência existente é a disputa entre os
municípios de Capela e Japaratuba, cujo desfecho se encontra atualmente na Assembleia
Legislativa do Estado de Sergipe, onde tramita proposta de repartição de
receitas tributárias.
Trata-se de projeto grandioso, que prevê a produção
de 1,2 milhão de toneladas ano de cloreto de potássio, em sua primeira etapa,
podendo atingir até 2,2 milhões de toneladas com a maturidade do projeto. O
potássio é um dos intermediários básicos na produção de fertilizantes e o grau
de importação do produto é de cerca de 90% do consumo nacional.
O Projeto Carnalita prevê a criação de cerca de quatro
mil empregos diretos durante a implantação, aos quais devem ser somados alguns milhares
de empregos indiretos. As receitas dos dois municípios, ao longo dos 30 anos de
exploração do minério, devem alcançar a notável cifra de 1,5 bilhão de reais.
Retardamento
Estarrece ao cidadão sergipano que a aprovação de
autorização das instalações da empresa, de competência municipal, venha se
estendendo desde meados de 2013, pondo em risco um dos empreendimentos
econômicos mais importantes da história econômica de Sergipe.
Esse retardamento põe em risco a presença da Vale
em Sergipe, porquanto a exploração do potássio a partir da silvinita, na mina
Taquari-Vassouras, cuja produção se iniciou em 1986, ainda pela estatal
Petromisa, integrante do sistema Petrobras, encontra-se próxima à exaustão, com
produção em declínio e previsão de encerramento antes do final da presente
década.
Histórico do projeto carnalita
Segundo a empresa Vale, desde
2001 a companhia vem desenvolvendo esforços para o aproveitamento das rochas carnalíticas
de Sergipe visando a produção de cloreto de potássio (KCl).
Como o teor de
concentração de cloreto de potássio nas rochas carnalíticas é muito inferior ao
presente na silvinita, a Vale buscou alternativas tecnológicas de exploração
das reservas. Os testes realizados apontaram a inviabilidade da utilização dos
métodos tradicionais de mineração.
A partir de 2008, a
empresa implementou um teste piloto no município de Maruim. A alternativa tecnológica
encontrada foi a produção de cloreto de potássio (KCl) por meio de “lavra de
dissolução”, produzindo uma salmoura rica de sais de potássio, sódio e
magnésio. A salmoura passa então por quatro etapas de evaporação e em seguida
executam-se a cristalização, secagem e compactação do produto.
Impasses
A viabilização do
Projeto Carnalita exigiu esforço de articulação de grande monta por parte do
governo de Sergipe, muito particularmente do empenho pessoal do Governador
Marcelo Déda.
No início de 2011, dois
eram os impasses que ameaçavam a exploração da carnalita, muito mais complexos
do que as atuais disputas municipais: em primeiro lugar, os direitos minerários
de exploração das jazidas pertencem a Petrobras e o contrato de arrendamento
entre a Vale e a Petrobrás, firmado em 1991 com vigência de 25 anos, se
aproximava do término e a empresa Vale não iniciaria um projeto da dimensão
prevista sem a segurança dos direitos de
lavra devidamente definidos.
Ao longo do primeiro
semestre de 2011, o governador Marcelo Déda fez seguidas reuniões com as
diretorias da Petrobras e da Vale visando desatar o nó que envolvia a cessão
dos direitos de lavra.
É necessário, nesse
momento, fazer um depoimento de quem acompanhou de perto o governador Marcelo
Déda nas articulações para que as empresas chegassem a um acordo, ao lado dos
secretários Oliveira Júnior, Zeca da Silva e João Andrade: as negociações entre
as empresas foram muito acirradas e em diversas ocasiões tudo voltava à estaca
zero. O cerne do conflito era a resistência da Petrobras em ceder os direitos
de lavra com o argumento de que a área solicitada pela Vale era muito extensa e
que havia sobreposição com jazidas petrolíferas de interesse da Petrobras.
Em determinada reunião,
testemunhada por mim e pelos supracitados, o governador Marcelo Déda
exasperou-se e declarou aos brados que Sergipe não seria a ostra esmagada entre
o mar e a rocha, pelos interesses das duas gigantescas companhias. Procurou, ainda
no primeiro semestre de 2011, o apoio político da já presidente Dilma Rousseff
a fim de superar os desacordos que se estendiam demasiadamente.
As negociações entre as
empresas avançaram e finalmente, em fevereiro de 2012, os novos presidentes das
companhias, Murilo Ferreira (Vale) e Graça Foster (Petrobras) já anunciavam o
acordo de cessão do direito de lavra por mais 30 anos, o que assegurava não
apenas a implantação do Projeto Carnalita, como a continuidade da exploração da
mina Taquari-Vassouras.
No dia 13 de abril de
2012, Petrobras e Vale, por meio de seus presidentes Graça Foster e Murilo
Ferreira, assinaram protocolo de intenções que contemplava a cessão dos
direitos e dez dias depois, em 23 de abril, a presidente Dilma Rousseff veio
anunciar pessoalmente em Sergipe a superação dos impedimentos.
Frente à complexidade
da negociação da cessão dos direitos de lavra, o segundo impasse, de caráter
técnico e material, era relativamente menor, mas sem a sua superação o projeto
estaria condenado.
A nova tecnologia de
extração do potássio era altamente intensiva no consumo de gás natural e não
havia garantia de fornecimento do insumo nos montantes necessários, diante das
restrições de produção e distribuição internamente no país. Apenas na primeira
fase, o projeto demandaria 760 mil m3/dia de gás natural, algo em
torno de três vezes todo o consumo atual de gás natural em Sergipe. Novamente o
governador Marcelo Déda intercedeu, procurando em 2011 a então diretora de gás
da Petrobras, a atual presidente da empresa Graça Foster, que muito prontamente
assegurou que buscaria os meios necessários para viabilizar o fornecimento.
Futuro
As riquezas minerais de Sergipe são uma dádiva da
natureza. A luta pela sua exploração remonta à primeira metade do século XX e
até alcançar a exploração de fato, a partir da década de sessenta, muitos foram
os episódios decisivos. Grandes nomes, a exemplo do economista Aloísio de
Campos, do jornalista Orlando Dantas, dos governadores Seixas Dórea e Augusto
Franco e mais recentemente do governador Marcelo Déda, debateram-se em defesa
de projetos de exploração mineral que ajudaram a construir Sergipe. Tenho
confiança que interesses mesquinhos não se sobreporão ao compromisso com o
futuro de Sergipe.
Publicado no Jornal da Cidade, em 09/03/2014
O governador Marcelo Déda e a presidenta Dilma Rousseff durante a cerimônia de assinatura de contrato entre a Petrobras e a Vale para arrendamento das reservas de potássio no estado de Sergipe / Foto: Roberto Stuckert Filho/PR. Em 23 de abril de 2012.
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