Ricardo Lacerda
O crescimento de 0,7% do PIB no 4º
trimestre de 2013 afastou o fantasma da chamada recessão técnica, dois
trimestres sucessivos de recuo no nível de atividade econômica. No ano, o PIB
cresceu 2,3%, um pouco acima da expectativa de mercado.
O resultado surpreendeu positivamente,
visto que se disseminaram em alguns setores prognósticos de taxa negativa de
crescimento no trimestre e, principalmente, porque os investimentos em capital
fixo (a FBCF) e, não o consumo, puxaram a expansão em 2013.
Apesar de o resultado positivo ter sido
importante, por ter afastado o clima de quase histeria que se anunciava, o
debate sobre o crescimento do país não deve ser feito a solavancos, sem uma
perspectiva mais consistente.
Cenário externo
A crise financeira internacional,
iniciada em 2008, produziu impacto profundo sobre a evolução da economia
brasileira, como não poderia deixar de ser, como também impactou negativamente
o crescimento econômico dos países nos cinco continentes.
Os efeitos da crise internacional sobre
os países em desenvolvimento mudaram ao longo dos últimos cinco anos, conforme
os desdobramentos que ela foi apresentando, que se expressaram pelos canais do
comércio internacional, do fluxo de capital, das movimentações no valor do câmbio
e das crises de confiança que emergiram nos momentos mais agudos.
Internamente, esses canais produziram efeitos
perversos nas condições da demanda externa pelos produtos brasileiros e na
substituição da produção interna pelos importados, provocaram pressões de preço
por meio de mecanismos diversos, alteraram as condições de aceso ao crédito e as
taxas de juros e impactaram as finanças públicas, com desdobramentos na
confiança dos agentes econômicos, empresários e famílias. Enfim, as intempéries
vindas de fora comprimiram as perspectivas de crescimento e estreitaram o raio
de manobra da política econômica.
Não é difícil constatar que, a cada turbulência
no cenário externo, como em setembro de 2008, com o estouro da bolha
imobiliária nos EUA; em meados de 2011, com o aprofundamento da crise europeia;
e depois do anúncio do banco central americano, em maio de
2013, que iniciaria a reversão de sua política de expansão monetária, com
efeitos potencializados pela perspectiva de desaceleração do crescimento da China, a evolução do
nível de atividade interna foi impactada negativamente.
O gráfico 1, que mostra a evolução do
PIB brasileiro em quatro trimestres em relação ao mesmo período anterior,
registra a acentuada desaceleração do crescimento a partir de meados de 2011,
frente a um cenário de agravamento da economia internacional, seguida pela
progressiva retomada do crescimento interno entre meados de 2012 e meados de
2013. Nos últimos dois trimestres, quando as condições de acesso pelos países
emergentes ao capital externo se deterioraram, a retomada da economia
brasileira perdeu fôlego, gerando certa apreensão em relação às perspectivas de
crescimento em 2014 e 2015.
Fonte: IBGE. Contas Nacionais
Trimestrais.
Competitividade
Para além dos impactos de natureza
macroeconômica, citados acima, a crise financeira internacional também suscitou
questões atinentes às condições de competitividade de longo prazo da economia
brasileira, que dizem respeito às deficiências na infraestrutura, marcos
regulatórios e restrições oriundas do mercado de trabalho.
Na prática, é muito difícil atribuir
qual é a parcela dos fatores macroeconômicos associados ao cenário externo
adverso e qual é a parcela das deficiências mais estruturais na restrição ao
crescimento do nível de atividade econômica, tal como medido pela variação do
PIB ou de outros indicadores. O exame do comportamento dos elementos da demanda
talvez forneça algumas pistas relevantes.
Dispêndio
Do ponto de vista das variáveis de
dispêndio que compõem o Produto Interno Bruto, salta à
vista como a deterioração do setor externo prejudicou a evolução do nível de
atividade da economia brasileira. No período imediatamente anterior à crise
internacional, o saldo dos fluxos externos de comércio e serviços do Brasil se
manteve positivo, embora declinante.
Em 2007, esse saldo contribuiu com 2,2%
do PIB (em valores constantes de 1995). Essa contribuição caiu em 2008 e 2009,
até se tornar negativa a partir de 2010. Em 2013, o saldo negativo das exportações e
importações de bens e serviços já representou 3,7% do PIB (ver Gráfico2).
Na comparação entre os anos extremos,
nenhum outro componente, sob a ótica da demanda agregada, contribuiu tanto para
explicar o comportamento do PIB quanto a evolução do saldo das transações
comerciais e de serviços com o exterior, nem mesmo o consumo das famílias, que
responde por quase 2/3 da demanda agregada (ver Gráfico 2). Enquanto o consumo
das famílias aumentou em 5,1 pontos percentuais entre 2007 e 2013, a
contribuição do componente externo variou -5,9 pontos percentuais.
Essa mudança de sinal, de positivo para
negativo, no saldo entre exportações e importações de bens e serviços com o
exterior indica um problema de competitividade de nosso sistema econômico e de
sustentabilidade de crescimento a médio prazo.
Parcela das restrições ao crescimento
será atenuada quando a economia internacional voltar a apresentar taxas de
crescimento mais robustas. Outra parcela depende de respostas de natureza
macroeconômica, no manejo da política fiscal, monetária e cambial, e de
melhorias na infraestrutura, recursos humanos e ambiente geral de negócios.
Em Fonte: IBGE. Contas Nacionais Trimestrais. Participações calculadas
com base em preços de 1995.
Publicado no Jornal da Cidade em 03 de março de 2014
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