Ricardo
Lacerda
O ano de
2013 inicia com a pauta das relações entre as unidades federativas atravancada.
Além da guerra dos royalties, cuja demora no desfecho atrasa a retomada dos
leilões para exploração de novos campos de petróleo, o dispositivo legal que
estabelecia os critérios de rateio do Fundo de Participação dos Estados (FPE) teve
seus efeitos cessados em 31 de dezembro último, sem que nova norma tivesse sido
aprovada pelo legislativo federal, no prazo estabelecido pelo STF.
Finalmente,
o ano se inicia sem a aprovação das mudanças nas alíquotas do ICMS nas operações
interestaduais, instrumento que é a base da disputa entre os estados para
atrair empreendimentos produtivos, em geral do setor industrial.
Guerra fiscal
Na
essência, a guerra fiscal é operacionalizada por meio de concessão de créditos
fiscais pelo estado de origem quando as empresas vendem seus produtos para os demais
estados. Pelas regras em vigor, as empresas devem recolher na origem 12%,
quando sediadas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, e 7%, no caso de
instaladas no Sul e Sudeste, nas vendas interestaduais.
Como as
empresas incentivadas pagam apenas fração, em geral bem diminuta, da alíquota
que caberia ao estado de origem, elas poderiam obter uma redução de até 12% ou
até 7%, dependendo da região, fazendo com que os estados mais pobres possam
oferecer um diferencial de incentivo em relação aos mais industrializados de
até 5% no pagamento do imposto. Essa
margem pode compensar, entre outras desvantagens, os custos logísticos mais
altos que as empresas incorrem quando se instalam nas áreas menos
industrializadas e mais distantes dos principais mercados.
É
difícil fazer a defesa do incentivo fiscal do ICMS nas operações interestaduais,
dado que as empresas se creditam no estado de origem de uma alíquota que não
foi recolhida integralmente ou que foi diferida a perder de vista. Mas esse não
é nem mesmo o principal vício do tributo, que transfere arrecadação sobre o
consumo da população dos estados mais pobres, consumidores em termos líquidos,
para os estados mais ricos, que sediam a maior parcela das empresas, vazamento
de renda que não encontra justificativa econômica ou social.
Desconcentração
Esse
arranjo pouco estruturado da guerra fiscal ganhou dimensão e amplitude,
passando a ser instrumento mais efetivo de desconcentração de atividades
industriais em direção aos estados mais pobres ou de menor densidade econômica.
Os incentivos do ICMS, ao lado de outras
vantagens, como a oferta de infraestrutura e apoio locacional, têm conseguido
atrair empresas para as regiões mais pobres e são tidos pelo setor empresarial
como um atalho para aliviar a pressão da carga fiscal sobre a produção, cujo
patamar já é demasiadamente elevado. Têm sido um instrumento efetivo também que
os estados possuem para orientar a localização de empreendimentos industriais
nas áreas mais pobres dos seus territórios.
Uniformização
O
Ministério da Fazenda vem atuando junto aos estados para construir o consenso que
permita a aprovação da unificação escalonada das alíquotas até 2025, quando
atingiriam 4% nos estados de origem, independentemente da região. Se a guerra
fiscal tem problemas que devem ser corrigidos, dificuldades muito maiores
surgirão com a uniformização do ICMS, deixando os estados mais pobres sem
instrumentos para fazer política de atração de investimentos, quando o poder
central tem sido pouco eficaz em induzi-los por meio de uma política industrial
com conteúdo regional.
Por um
lado, a uniformização da alíquota na origem em um patamar mais baixo não
elimina a guerra fiscal. Os estados podem continuar isentando as empresas da
parcela de origem do tributo, ainda que a dedução de 4% seja menos atraente do
que 7% ou 12%.
Por
outro lado, com a uniformização das alíquotas, os estados mais distantes dos
principais mercados não têm como atrair empresas. E a contrapartida oferecida pelo
ministério até o momento para compensar a perda de atratividade dos estados
mais pobres tem quase nenhuma efetividade.
Não por
outras razões, os estados das regiões menos industrializadas vêm resistindo a
mudança proposta pelo ministério, pois entendem que, com sua implementação,
estarão condenados a acompanharem passivamente os investimentos industriais se
reconcentrarem nas áreas mais industrializadas do país.
Finanças
Finalmente,
em relação ao custo dos incentivos fiscais no orçamento dos estados vale a pena
examinar o gráfico apresentado. Continuadamente, entre 1995 e 2012, até o mês
de setembro, as regiões mais pobres ganharam peso no total do ICMS arrecadado
no país, sinalizando que a concessão dos incentivos tem sido mais do que
compensada pelo crescimento diferenciado que elas vêm apresentando, em função
de uma série de fatores, inclusive por conta da atração de empresas. O
Nordeste, por exemplo, aumentou de 12,6% para 15,4% sua participação no total
de ICMS arrecadado, entre 1995 e 2011, enquanto a região Sudeste reduziu seu
peso de 60,5% para 54,7%.
Publicado no Jornal da Cidade em 06/01/2013
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