Ricardo Lacerda e Sudanês Pereira
A utilização de incentivos fiscais, subsídios e outros atrativos tributários tem sido comum entre os governos estaduais no Brasil. A chamada Guerra Fiscal entre as unidades da federação surgiu em um contexto de abandono de políticas e de instrumentos de desenvolvimento nacional e regional e a extinção das agências federais de desenvolvimento. Essas decisões provocaram a descentralização de ações de desenvolvimento regional.
Os Estados passaram a adotar políticas de incentivos, com o intuito de atrair investimentos industriais para o seu território, sem a interferência do governo federal. O principal atrativo tem sido a renúncia do ICMS. É necessário reconhecer que, frente à tendência dos novos investimentos concentrarem-se nas áreas mais desenvolvidas do país reforçando desigualdades, a Guerra Fiscal foi uma tentativa de atrair investimentos para fora do núcleo industrial mais moderno do território brasileiro.
A disputa fiscal entre os Estados por novos investimentos prejudica as finanças estaduais bem como a provisão pública de bens e serviços. A Guerra Fiscal representa um "jogo não-cooperativo" do tipo soma zero, em que a atração de um investimento para um Estado corresponde à perda efetiva ou potencial de outro e cuja resultante é o prejuízo fiscal para cada um deles e para o conjunto do país. Uma vez em curso a Guerra Fiscal, todos os Estados são induzidos a participar dela, correndo o risco, se não o fizerem, de perder para outros Estados que concedem tais benefícios fiscais, as indústrias implantadas em seu território.
Além do prejuízo às finanças públicas, a Guerra Fiscal gera distorções no setor produtivo criando uma competição desleal em favor a) das grandes empresas contra as pequenas; b) das empresas com maior relação capital/trabalho; c) das empresas novas que recebem incentivos contra as já estabelecidas no mercado. O mais grave é que as firmas escolhem sua localização baseadas nesses incentivos e, freqüentemente, não estabelecem relações com a base produtiva estadual.
A reforma tributária é uma necessidade para a retomada do desenvolvimento brasileiro de forma sustentada. A dificuldade maior reside em criar instrumentos justos de atração de investimentos, bem como construir os mecanismos de transição para o novo marco institucional.
O projeto de reforma tributário coordenado pelo governo federal está assentado na substituição dos tributos sobre bens e serviços (ICMS, IPI, PIS, Cofins, Cide-Combustíveis) por dois impostos sobre o valor adicionado: O Imposto sobre Valor Agregado - Estadual (IVA-E) e o Imposto Sobre Valor Agregado - Federal (IVA-F). Como o IVA-E observaria o princípio do destino, ou seja, seriam arrecadados pelos Estados onde os produtos seriam consumidos (ou utilizados no processo de produção), o principal mecanismo da Guerra Fiscal seria desativado.
A solução passa por uma distribuição equilibrada dos fatores estratégicos, que determinarão o futuro das regiões no nosso país.Algum potencial de Guerra Fiscal ainda restaria, ainda que substancialmente menor do que a que vigora hoje, através de políticas que desonerassem não mais, como a redução ou isenção do ICMS, os produtos elaborados, mas reduzindo a alíquota de insumos utilizados pelas indústrias localizadas no Estado. A migração da incidência da tributação da origem para o destino seria paulatina.
Caberia construir um sistema de compensação em que não houvesse perdedores.
Porém, o ponto central é que a eliminação dos incentivos estaduais deve ter como contrapartida a adoção de medidas efetivas por parte do governo federal voltadas para a redução dos desequilíbrios regionais.
Novos modelos de desenvolvimento têm sido registrados pela literatura especializada, enfatizando como algumas localidades (regiões e cidades) estão transformando as suas estruturas produtivas. Os novos processos de desenvolvimento combinam a atração de investimentos significativos com a ativação das potencialidades socioeconômicas locais. O fundamental é a implantação nas regiões/Estados e localidades das condições sistêmicas para tornar competitivos os investimentos ali realizados. O poder de atração de novos investimentos estaria associado a fatores que confiram competitividade ao sistema produtivo.
Como a constituição desses fatores não acontece da "noite para o dia", é necessária a instituição concertada entre unidades da federação e o poder central, por um tempo determinado, de incentivos fiscais e financeiros, além de outros mecanismos de indução dos investimentos para as áreas menos desenvolvidas do país, em uma estratégia de desenvolvimento nacional.
No momento, está sendo proposta a constituição do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR), cujos recursos poderiam ser alocados em investimentos estruturantes, no financiamento ao setor produtivo e em incentivos fiscais que seriam geridos pelas superintendências de desenvolvimento regional recriadas. O montante de recursos e o impacto dessa medida ainda não estão claramente definidos.
O desenvolvimento regional equilibrado e em bases sustentáveis requer ações voltadas para reforçar fatores que reduzam as desvantagens locacionais das áreas mais pobres, definindo uma melhor distribuição de ativos estratégicos no território brasileiro, tais como: infraestrutura física; escolarização e qualificação da mão-de-obra; acesso a crédito; capacidade de investimento do setor público em suas três esferas; sistemas locais de inovação; capacitação em pesquisa e desenvolvimento; desenvolvimento institucional; sustentabilidade ambiental e o fortalecimento das cadeias produtivas e dos arranjos produtivos locais.
O novo ciclo de desenvolvimento brasileiro que ensaia os seus primeiros passos e os avanços institucionais recentes indicam que estão postas as condições para inaugurar uma nova geração de políticas de desenvolvimento regional no Brasil. A longevidade da
Guerra Fiscal por si já demonstra a dificuldade para encontrar novos mecanismos que permitam a adoção de políticas mais racionais e sustentáveis de desenvolvimento regional. O caminho da solução passa por uma distribuição mais equilibrada dos fatores estratégicos que determinarão o futuro das regiões no nosso país.
Essa guerra fiscal parece estar longe de acabar, pois em nenhuma das proposta dos presidenciáveis aparece o termo reforma tributária e fiscal.
ResponderExcluirÉ isso Carlos, os candidatos têm, de fato, evitado temas polemicos
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