Ricardo Lacerda
As regiões mais pobres do país, Nordeste e
Norte, foram relativamente favorecidas no ciclo de crescimento e de inclusão
social do período 2004-2014. Ainda que essas regiões tenham permanecido com os piores
indicadores em praticamente todas as dimensões do desenvolvimento econômico e
social, elas avançaram mais rapidamente do que as regiões mais ricas, Sudeste e
Sul, estreitando mesmo que não muito o fosso entre elas. A isso a literatura do
desenvolvimento chama de processo de convergência.
As principais forças motrizes das regiões
mais pobres no período de crescimento estiveram associadas a ganhos de renda e,
portanto, de poder de compra, que geraram efeitos cumulativos na medida em que atraíram
investimentos de empresas de outras regiões para participar nos mercados que se
expandiam mais rapidamente, no bojo daquilo que ficou conhecido como a ascensão
da Classe C. O aumento real do salário mínimo no período potencializou os
efeitos do incremento do emprego sobre a expansão do mercado regional. As políticas
de transferências de renda foram um capítulo adicional, mais importantes para a
inclusão social do que propriamente para a expansão da massa de
rendimentos.
Se o incremento das rendas das famílias foi o
principal impulso do crescimento nas regiões mais pobres, não estiveram
ausentes investimentos em infraestrutura produtiva, urbana e social, como os
investimentos em complexos portuários, em recursos hídricos, nas redes federais
de escolas técnicas, entre outros.
Como se sabe, o ciclo de crescimento econômico
se exauriu em 2014, após a reversão do cenário internacional. A aterrisagem
brasileira na recessão mundial, como se sabe, foi uma das mais devastadoras do
mundo, em meio a um turbilhão político do qual ainda não conseguimos emergir.
Depois do crescimento pífio de 0,5%, em 2014,
a economia brasileira amargou uma das piores recessões de sua história, com o
PIB recuando 3,5% em 2015 e 2016, e apresentou um muito modesto crescimento em
2017, de 1%. A dinâmica do emprego seguiu a evolução do nível de atividade, mas
com uma estendida defasagem temporal, registrando-se geração de emprego formal
no setor privado de mais de um milhão de pessoas (na média de quatro
trimestres), em 2014, quando a economia começava a submergir, e redução de 950
mil empregos formais no setor privado na comparação nos 4 trimestres de 2017 em
relação a 2016, mesmo com o nível de atividade econômica em crescimento.
Impactos regionais da crise
Não há ainda avaliações conclusivas sobre os impactos
regionais da crise econômica que se seguiu o ciclo expansivo, mas, sobretudo,
os indicadores de ocupação, emprego e renda sinalizam que as regiões mais
pobres foram afetadas mais do que proporcionalmente.
Desempenhos setoriais têm importante poder explicativo,
com setores como agricultura (pela estiagem e pela crise do setor
sucroalcooleiro) e construção civil, principalmente, apresentando
comportamentos bastante distintos conforme as regiões, mas parece haver um
padrão regional comum aos vários setores, tema ao qual voltaremos a tratar em
artigo subsequente. Apenas para ilustrar, o emprego formal no comércio e no
segmento de outros serviços apresentou retrações de maior intensidade no
Nordeste do que na média do país e da maioria das regiões.
Emprego no setor privado
O gráfico a seguir mostra as participações
das regiões no total de pessoal ocupado com carteira de trabalho no setor
privado na média de quatro trimestres, com base nos dados da Pesquisa Anual de
Amostra Domiciliar Contínua (PNADC), entre 2012 e 2017. Até 2015, na média dos quatro trimestres, a
região Nordeste aumentou ano a ano sua participação, passando de 16,1%, em 2012, para 17%, em 2015. A região
ganhou peso no total nacional tanto nos anos em que o emprego no setor privado
cresceu, até 2014, como em 2015, por conta de a retração do emprego regional ter
sido inferior à média nacional. Os
desempenhos do Nordeste em 2016 e 2017, todavia, foram piores do que a média
nacional, fazendo com que a participação no emprego formal no setor privado
retornasse à porcentagem de 2012, ou seja, de 16,1%.
Ainda que as variações de participação do
Nordeste no emprego formal privado não pareçam tão expressivas ao primeiro
olhar, elas caracterizam sim um desempenho muito superior do emprego regional
no 1º período e muito inferior, no segundo período, como veremos a seguir.
As duas colunas mais à direita no gráfico
mostram o peso das regiões na variação do emprego formal privado entre 2012 e
2015 e entre esse último ano e 2017, com a observação que no primeiro período o
pessoal ocupado com carteira de trabalho no
privado no Brasil aumentou em 1,4 milhão, e no segundo período
verificou-se uma retração de 2,4 milhões, sempre na média de quatro trimestres.
Pois bem, entre 2012 e 2015, a região Nordeste, que apresentava pouco mais de
16% do emprego formal privado, participou
com mais do que o dobro dos novos empregos, 37,1%, a maior participação
entre todas as regiões brasileiras.
Inversamente, entre 2015 e 2017, a região
Nordeste participou com 29,2% dos empregos formais privados que foram
eliminados, muito mais do que o peso da região nesse tipo de ocupação. Note-se
que apenas as regiões Nordeste e Norte apresentaram perdas de emprego formal
privado superiores aos seus pesos nesse tipo de ocupação. Caso se considere que
a comparação mais pertinente seria entre as médias de 2017 e 2014, por serem
anos de retração, as conclusões não seria diferentes, mesmo considerando que nesse
caso as desvantagens do Nordeste seriam um pouco menos pronunciadas. Há também
sinais de que a economia do Nordeste (e do Sudeste também) está demorando mais
a se recuperar do que a média nacional, enquanto as regiões Centro-Oeste e Sul
apresentam desempenhos relativamente mais robustos.
Fonte: IBGE. PNADCT
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