Assista acessando pelo link abaixo
Retomada da Política Keynesiana e Reconstrução do Estado Bem- Estar Social
Ricardo Lacerda*
Uma das definições centrais
do governo Biden é o entendimento de que é imperativo para os EUA retomarem a
liderança dos investimentos nos setores estratégicos, aqueles de elevados
conteúdos tecnológicos e que deverão nortear a expansão da economia mundial nas
próximas décadas. Dois segmentos de atividades receberam atenção especial no American
Job Plan, o plano de desenvolvimento econômico e social para os próximos
oito anos: a produção de veículos elétricos, atividade em que o país teria
acumulado defasagem significativa em relação à indústria chinesa; e, aquilo que
o documento chama de tecnologias críticas para competitividade futura e para a
segurança nacional, abrangendo as novas tecnologias de inteligência artificial,
a biotecnologia e a computação, mais especificamente a produção de
semicondutores e as tecnologias de comunicação avançada (5G e 6G) que constituirão
as estradas futuras do tráfego de informações em todo mundo.
Made in América
O American Job
Plan almeja não apenas que os EUA liderem o desenvolvimento dessas novas
tecnologias como entende ser necessário manufaturar no território norte
americano, ou no máximo em países que são tradicionais parceiros da aliança
ocidental, aqueles bens que formam os elos essenciais das cadeias de suprimento
dessas atividades.
A atenção dada no
plano para a fabricação interna, o recorrente apelo para o Made in America,
assume papel central na estratégia de desenvolvimento e significa uma
importante virada na compreensão sobre o papel crucial da indústria
manufatureira, tanto para impulsionar o crescimento econômico de longo prazo,
quanto para gerar internamente os empregos de qualidade que foram perdidos com
a migração da atividade manufatureira para o leste asiático, desde os anos
noventa do século passado.
Retomada do Estado
de Bem-Estar Social
Está explícito no American
Job Plan o objetivo de retomar, ainda que em versão atualizada, a economia
do bem-estar social dos trinta anos gloriosos (1945-1975), que foi desmontada
ao longo das décadas de globalização desregulada e da hegemonia da ideologia
neoliberal. Disseminou-se em amplos setores da sociedade norte americana a
percepção de que a economia neoliberal fracassou rotundamente em promover
crescimento econômico relativamente estável, sustentável em termos ambientais e
inclusivo em termos sociais. Pelo contrário, de forma célere, as desigualdades
de renda se ampliaram nos anos de hegemonia neoliberal e os mecanismos de
solidariedade social foram fragilizados.
A versão
contemporânea do estado de bem social é apresentada como o Green New Deal,
um novo contrato social em que as questões ambientais assumem papel central,
mas que é herdeira inequívoca dos programas sociais da era Roosevelt (New
Deal) -Eisenhower e da Great Society, de Lyndon
Johnson.
Perda da liderança
industrial
Desde os anos
noventa do século passado, a China vem ganhando participação em ritmo acelerado
na produção mundial da indústria manufatureira. Segundo estimativa da UNIDO-
Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial, a participação
da China no valor adicionado da indústria manufatureira saltou de 4%, em 1990,
para 31,7%, em 2020, enquanto a indústria manufatureira dos EUA viu sua
participação se retrair no período de 21,8% para 16% (Ver Gráfico).
A perda de
participação norte americana na produção mundial de manufaturas, em processo
similar ao que se verificou nas maiores economias ocidentais, não decorreu tão
somente do crescimento mais acelerado do PIB da China e de outros países do
leste asiático. Refletiu também a perda da participação da indústria
manufatureira na própria economia norte americana, recuando, segundo estimativa
da OCDE, de 16,7% do valor adicionado, em 1997, para 11,3%, em 2019. Ou seja,
nos trinta e dois anos que separam 1997 e 2019, a indústria manufatureira norte
americana perdeu cerca de 1/3 de sua participação na riqueza nacional.
O incentivo à
retomada da produção interna da indústria manufatureira é componente
fundamental na estratégia do Governo Biden para construir o novo estado de
bem-estar social. O ponto central parece ser refazer os vínculos, que foram
debilitados nos anos de hegemonia de economia desregulada, entre crescimento da
produtividade econômica, geração de bons empregos, aumento da arrecadação
tributária e ampliação do estado de bem-estar social. O desafio se situa em
compatibilizar tais objetivos com o papel disruptivo das novas tecnologias de
informação e comunicação.
A aposta parece
estar em mais e não em menos regulamentação das relações de trabalho e na
organização da produção por parte do estado. Os anos de supremacia das finanças
em relação à produção parecem ter ensinado que a atividade industrial importa e
que ela cumpre papel central na articulação entre o incremento da
produtividade, geração de bons empregos e fortalecimento do estado de
bem-estar.
Professor do programa de mestrado de economia da UFS e integrante da ABED- Associação Brasileira de Economistas pela Democracia
Ricardo Lacerda
Os
analistas econômicos ao redor do mundo acompanham com enormes expectativas os
desdobramentos do plano de investimentos de longo prazo submetido pelo governo
do presidente Biden ao congresso dos EUA. Intitulado American Job Plan,
caso aprovado integralmente pelo parlamento daquele país, vai adicionar em oito
anos cerca de US$ 2,3 trilhões em investimentos de caráter estruturante ao já
aprovado pacote emergencial de US$ 1,9 bilhões, o American Rescue Plan.
As expectativas do mundo em relação ao plano proposto decorrem em parte da
magnitude dos recursos envolvidos, mas sua importância é ainda maior por conta
da mudança de rota a que se propõe em termos da concepção da atuação que o
estado deve ter na economia e da centralidade que a questão ambiental assume, particularmente
da mitigação dos efeitos das mudanças climáticas, na estratégia de
desenvolvimento que foi elaborada.
O
American Job Plan é apresentado como sendo uma oportunidade de
reimaginar e reconstruir uma nova economia, em que o investimento público
retomaria parcialmente o espaço perdido enquanto parcela do PIB, desde o apogeu
da era keynesiana de bem-estar social nos anos sessenta do século passado. O
plano se fundamenta na constatação de que a economia norte americana, a maior
do mundo, vê sua liderança ameaçada por décadas de desinvestimentos em
infraestrutura econômica, em estradas, saneamento, energia e telecomunicações,
ao tempo que perdeu a capacidade de gerar internamente bons empregos, ou seja,
empregos de qualidade com remunerações compatíveis e direitos assegurados. O
vínculo explícito entre a retomada do poderio industrial (enfraquecido nas
últimas décadas), a expansão dos investimentos nos setores estratégicos, em que
a questão da mudança climática aparece como desafio e oportunidade, e a geração
de emprego de qualidade é uma das bases de sustentação do plano de
desenvolvimento.
Competição
com a China
A
sombra da perda de competitividade em relação à China percorre o diagnóstico American
Job Plan do início ao fim. Está expressa, entre outras passagens, quando o
documento constata que a economia norte americana vem perdendo posições em
relação às principais economias concorrentes em dimensões tão cruciais quanto Pesquisa
& Desenvolvimento (P&D), manufatura e recursos humanos. Ver a versão
integral do plano em https://www.whitehouse.gov/briefing-room/statements-releases/2021/03/31/fact-sheet-the-american-jobs-plan/.
A
mudança de rota de desenvolvimento presente na proposta assume importância
especial quando o documento reconhece explicitamente que as forças de mercado
(de oferta e demanda) não têm se mostrado capazes de fazer o redirecionamento dos
investimentos para que a economia norte americana recupere o atraso em relação
aos principais países concorrentes.
Falha
de mercado e o investimento público
Em
entrevista postada em podcast de 09 de abril do colunista Ezra Klein, do jornal
New York Times, o principal conselheiro econômico do presidente Biden, Brian
Deese, elenca razões práticas para
defender a liderança dos investimentos públicos como ferramenta necessária para
retomar a competitividade da economia dos EUA. Sua argumentação se assemelha às
abordagens de falhas de mercado, especificamente do problema da coordenação dos
investimentos. Brian Deese argumenta em determinada passagem da entrevista que
o setor privado não tem, por si só, como alavancar os investimentos necessários
para instalar uma rede ampla de estações de recarga de veículos elétricos nas
rodovias do país. Neste, e em outros casos, o investimento público teria que
partir na frente para sinalizar e, assim, debloquear as oportunidades para o
setor privado. De forma similar, os investimentos públicos são imprescindíveis para
reduzir a vulnerabilidade e a dependência de importações de semicondutores e em
outros segmentos estratégicos para retomada do poderio industrial.
Na
entrevista, o principal conselheiro econômico de Joe Biden deixa clara a
necessidade de ser pragmático e, assim, se libertar das amarras ideológicas
vinculadas à suposta supremacia das economias de livre mercado. Em determinada passagem ele reconhece que a
economia chinesa, que não opera com base no livre mercado, vem enfrentando os desafios
em diversos dos segmentos mais importantes da atividade econômica com maior
competência do que os EUA: está liderando a construção de trens de alta
velocidade, enquanto os EUA ainda estão patinando nessa área; está aumentando os investimentos em P&D em
setores estratégicos como parcela do PIB; e, finalmente, a China vem planejando
meticulosamente esses investimentos há mais de uma década, enquanto os EUA
viram sua infraestrutura se deteriorar progressiva e perigosamente.
Ecossistema
produtivo e inovativo
Deese
conclui, em linha com as abordagens econômicas mais pragmáticas (e heterodoxas),
que o fundamental é fazer o máximo possível em termos de fortalecer um
ecossistema de inovação nos setores estratégicos, tarefa que não pode ser
deixada ao encargo da iniciativa privada, sempre destacando a complementaridade
entre os investimentos públicos e os investimentos ao encargo das empresas, na perspectiva
de que é necessário o governo fazer o investimento inicial estratégico e lançar
os alicerces dessa transformação para desbloquear o potencial do capital
privado. O áudio e a transcrição da entrevista estão acessíveis em https://www.nytimes.com/2021/04/09/opinion/ezra-klein-podcast-brian-deese.html.
O
mais importante na proposição do American Job Plan para nós brasileiros
são as implicações que a sua implantação deverá ter em termos de concepção do
papel dos investimentos públicos e da centralidade das questões ambientais nas
políticas de desenvolvimento mundo afora. Para além das especificidades dos
problemas nacionais, caso o plano não seja bloqueado ou esvaziado pela oposição,
ele significará uma mudança de grande magnitude nas estratégias de
desenvolvimento. Diante da falta de perspectivas que vive o Brasil nos dias de
hoje, sem dúvida, o seu êxito traria um grande alento, um sopro de esperança de
que dias melhores virão.
*Ricardo Lacerda
Professor do programa de mestrado
de economia da UFS. Assessor Econômico da Secretaria Geral de Governo de
Sergipe e integrante da ABED- Associação Brasileira de Economistas pela
Democracia
Ricardo Lacerda
O debate econômico atual no Hemisfério Norte não deixa margem à dúvida, está em pleno andamento uma importante virada sobre a compreensão do papel do estado no desenvolvimento econômico e social que poderia ser sintetizada na seguinte ordem do dia: o keynesianismo está de volta. Depois de 40 anos de hegemonia sufocante da perspectiva neoliberal, os fracassos reiterados do sistema de mercados crescentemente desregulados em entregar as promessas de promover crescimento econômico sustentado, estável, inclusivo em termos socais e expansivo em direção a novas áreas do globo terrestre exauriram as suas possibilidades.
A agonia do sistema
de mercados desregulados se iniciou ainda em 2008 com o espocar da crise
financeira em que naufragou a economia mundial. Todavia, naquele momento, as
lideranças políticas dos países ricos e os dirigentes das agências
multilaterais de desenvolvimento titubearam em realizar as mudanças necessárias
em direção a uma nova etapa de maior regulação da economia mundial e sucumbiram
mais uma vez à ideologia neoliberal e aos interesses dos detentores da riqueza
financeira. Economistas notáveis como Joseph Stiglitz e Paul Krugman, ambos
premiados pelo Prêmio Nobel, que apontavam incansavelmente os fracassos da
globalização desregulada em promover crescimento justo socialmente e sustentado
econômica e ambientalmente, eram vozes minoritárias e suas mensagens não
ultrapassavam os muros das universidades ou dos limites dos movimentos
populares mais engajados socialmente.
As insatisfações
com o sistema neoliberal foram se acumulando com a deterioração crescente do
mercado de trabalho nos países centrais, que se expressava no incremento
exponencial das relações de trabalho precarizadas, no crescimento do número de
pessoas imersas na situação de pobreza e no imenso contingente de pessoas residindo
nas ruas que se formou nos principais centros urbanos dos países ricos, muito
especialmente naquele país que simbolizava e liderava ideologicamente a
propagação mundial das políticas neoliberais. O debate sobre as crescentes
desigualdades de renda entre ricos e pobres, que emergiu a partir dos trabalhos
do economista francês Thomas Piketty, foram essenciais para assentar nas mesas
acadêmicas e na mente da população a injustiça crescente do sistema de mercados
desregulados.
Se a insatisfação
crescente com a globalização financeira propiciou a emergência de líderes
populistas de extrema direita nos diversos continentes, tendo o presidente
norte americano Donald Trump como representante maior, esse ciclo político, aparentemente,
começou a se esgotar.
Plano Biden
A manifestação mais
consistente e robusta da virada keynesiana foi, sem sombra de dúvidas, o
recente pacote de estímulos do presidente Joe Biden, dos EUA, que alcançou a
notável soma de dois trilhões de dólares já aprovados pelo congresso para ações
emergenciais e mais US$ 2,25 trilhões, em oito anos, voltados para mudanças
estruturais. Antes de sua submissão ao congresso o conjunto de medidas emergenciais
sofreu ataques diversos, com destaque para as manifestações incisivas do
economista Lawrence Summers, exatamente aquele assessor econômico que fez o
então presidente Obama titubear em adotar medidas mais duras de enfrentamento
ao poderio do setor financeiro. Dessa vez, todavia, o presidente recém-empossado,
Joe Biden, não se deixou impressionar pela mensagem alarmista do economista de
que um pacote tão robusto teria impactos inflacionários desestabilizadores da
economia. A secretária do tesouro americano, a experimentada economista Janet
Yellen, presidente do Banco Central (Federal Reserve) na administração Obama,
descartou recuar e afirmou sem rodeios que, dessa vez, se o governo tivesse que
errar seria para mais e não para menos, como aconteceu em 2008.
O novo pacote
voltado para o longo prazo contempla investimentos de US$ 750 bilhões em
infraestrutura produtiva em estradas, ferrovias e transmissão de energia, US$
189 bilhões em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) tecnológico, avança em
direção ao estímulo a setores industriais considerados estratégicos e mais US$
100 bilhões em infraestrutura de internet de banda larga. Aproximando-se da
plataforma dos ambientalistas, contempla investimentos em energias renováveis,
veículos elétricos e saneamento básico em uma revirada ambiciosa em termos de
atuação do governo na área econômica. Como até mesmo lideranças do setor
financeiro e de empresas da mídia corporativa que costumam se alinhar a esse
segmento reconhecem, as novas medidas anunciadas pela administração Biden
significam uma virada de grande alcance na política econômica, não apenas
porque enfrentam os postulados das medidas fiscalistas que colocavam a
austeridade fiscal no altar da sacralidade, como desenham um conjunto de linhas
de ação que reposiciona o papel do estado no desenvolvimento econômico e social
do país.
Efeito demonstração
Não haverá como
evitar os impactos políticos do efeito demonstração da iniciativa norte
americana sobre a orientação política econômica dos países ricos e mesmo dos
países em desenvolvimento como o nosso, apesar dos mugidos e do aparente pouco
caso de economistas brasileiros vinculados ao mercado financeiro e de seus
porta vozes na mídia corporativa, como retratado entre nós no editorial do
jornal Folha de São Paulo, de 04 de abril de 2021. O referido editorial, apesar
de reconhecer que o Megapacote de Biden visa revigorar o capitalismo dos EUA,
em seguida vaticina que o Brasil não teria a oportunidade de seguir caminho
similar.
Do ponto de vista
brasileiro, a virada keynesiana que se apresenta no Hemisfério Norte abre uma
senda de luta interna para se contrapor não apenas ao desmonte do estado
promovido pelas políticas neoliberais que foi retomado em ritmo acelerado
depois do golpe parlamentar de 2016. A possibilidade aberta pela virada
na política econômica nos EUA vai além disso, cria condições concretas para a
construção de um novo pacto político e social em favor de uma nova etapa de
desenvolvimento de forte conteúdo desenvolvimentista e de inclusão social, em
linha com as novas demandas da sociedade, de afirmação do país interna e
externamente. Essa afirmação deve contemplar não apenas o desenvolvimento produtivo,
por meio da capacitação tecnológica, científica e empresarial, como a
construção de uma sociedade mais homogênea, menos desigual, em uma nova
perspectiva na relação com os recursos naturais e um aprofundamento interno nas
relações democráticas. Sim, Keynes está de volta na política econômica e social
e chegará ao Brasil. Sim, retornará para a felicidade geral da nação..
Ricardo Lacerda
O curso de Ciências
Econômicas da Universidade Federal de Sergipe não tem rival no que se refere à
sua contribuição para o desenvolvimento institucional, econômico e social de
Sergipe. A Faculdade de Ciências Econômicas, fundada em 1948, inaugurou o
ensino superior em nosso estado no ano de 1950, juntamente com o curso de
química. Em 1961, reuniu-se às também isoladas Escola de Química, Faculdade de
Direito, Faculdade Católica de Filosofia, Escola de Serviço Social e Faculdade
de Ciências Médicas para pleitear a criação da Universidade Federal de Sergipe,
o que veio a se concretizar em 15 de maio de 1968.
A construção da cidade
Universitária, no município de São Cristóvão, teve por liderança o professor
José Aloisio de Campos, reitor entre 1976-1980, que posteriormente veio dar
nome ao campus. O economista José Aloísio de Campos foi, desde os anos 1960, a
principal liderança intelectual de Sergipe nos debates travados em favor da
industrialização do estado e da exploração das nossas riquezas minerais. Presidiu
o histórico Conselho de Desenvolvimento Econômico de Sergipe (CONDESE), que
cumpriu papel decisivo na elaboração e execução das políticas voltadas para o
desenvolvimento das chamadas indústria de base de Sergipe nos anos 1970 e 1980.
Nesse momento da história, o curso de economia da Universidade Federal
de Sergipe foi peça determinante na formação de recursos humanos e no
amadurecimento das reflexões sobre as questões mais relevantes para o
desenvolvimento do estado de Sergipe, em suas diversas dimensões.
A fundação da UFS coincidiu com outras grandes transformações de nosso
estado: a exploração intensiva das riquezas minerais, com a produção de
petróleo e gás natural pela Petrobras e com a instalação de unidades de
produção de amônia e ureia e de produção de potássio, que viriam impactar
profundamente a estrutura ocupacional e de renda e acelerar o ritmo de
crescimento econômico; o intenso processo de urbanização e a modernização da
máquina administrativa pública; o florescimento de Aracaju como uma cidade
moderna, com oferta diversificada de bens e serviços. Em todas essas dimensões,
os economistas formados pela UFS tiveram participações decisivas.
Esse conjunto de transformações correspondia ao movimento intenso de
modernização do Brasil, com baixa inclusão social, cujas referências centrais
foram os períodos de intenso crescimento do Milagre Econômico e dos Planos
Nacionais de Desenvolvimento, nos anos sessenta e setenta, em um regime
político fechado.
Três professores honraram
o departamento de economia em suas passagens pela reitoria da Universidade
Federal de Sergipe. Além de José Aloísio de Campos, os professores Gilson
Cajueiro de Holanda (1980-1984) e Josué Modesto dos Passos Subrinho, esse
último por dois mandatos conferidos em eleições diretas pela comunidade
universitária (2004-2008 e
2008-2012). O professor Gilson Cajueiro de Holanda, com larga experiência
administrativa, foi fundamental para a conclusão dos investimentos no
recém inaugurado campus universitário, nesse momento de consolidação do ensino superior no Brasil e em Sergipe
O sistema universitário público somente voltou a apresentar um novo
ciclo de expansão de grande magnitude nos anos 2000, agora já em plena vigência
do regime democrático, quando a melhoria nas finanças e a decisão de ampliar a
rede federal viabilizaram os recursos necessários. A redemocratização inseriu
definitivamente na agenda do Brasil a preocupação com o progresso social da
população brasileira que não poderia mais ser aparteado da perspectiva do
desenvolvimento econômico.
Foi nessas circunstâncias que a gestão do Prof. Josué Modesto dos Passos
Subrinho (2004-2012) empreendeu um novo grande salto da Universidade
Federal de Sergipe, com o estabelecimento, pela primeira vez, de um
sistema robusto de pesquisa e de pós-graduação, e de uma grade de cursos de
graduação muito ampla, contemplando as mais importantes áreas de conhecimento e
de formação profissional, fundamentais para o presente e para o futuro de
Sergipe.
Ao longo desse período, o
departamento de economia também passou por importantes mudanças. Inicialmente contou
com um corpo docente composto por técnicos do governo do estado dedicados em
tempo parcial ao curso de economia e, como era típico da época, em boa parte
com formação em cursos de pós-graduação lato sensu promovidos pela Comissão
Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL). Com a expansão do sistema de
pós-graduação brasileiro, a partir do final dos anos setenta, o departamento de
economia passou a assumir uma feição propriamente acadêmica nos anos oitenta,
com a chegada de professores formados em cursos de pós-graduação stricto sensu.
É o início de um processo que mesclou a chegada de docentes de fora do estado
com a participação do(a)s melhores aluno(a)s egresso(a)s do curso local e que
buscaram qualificação em alguns dos mais renomados centros de pós-graduação de
economia do Brasil.
O enfoque do curso também
tem passado por importantes mudanças, em consonância com o que vem ocorrendo na
disciplina. Com o rápido avanço dos métodos quantitativos nas chamadas ciências
econômicas, potencializado pelos efeitos da radical transformação das
tecnologias de informação sobre os métodos estatísticos e econométricos, o curso
de economia da UFS mais recentemente buscou conjugar uma formação teórica
sólida e plural, abrangendo os principais paradigmas das chamadas ciências
econômicas, com o instrumental técnico propiciado pelas novas tecnologias. Faz
isso sem se afastar do seu compromisso fundamental, que vem norteando suas
ações desde sua longínqua criação em 1948, o compromisso com o desenvolvimento
econômico e social de Sergipe.
Publicado no Jornal da Cidade, em 21/03/2021
LINK DAS AULAS
- TEORIA DOS LUGARES CENTRAIS
Assista acessando pelo link abaixo
Retomada da Política Keynesiana e Reconstrução do Estado Bem- Estar Social
Ricardo Lacerda de Melo
O ano de 2020 foi guiado
pelos impactos da pandemia do Covid-19 sobre a produção e circulação de bens e
serviços e pelas respostas dos governos nacionais a fim de atenuar os efeitos
de desestruturação econômica e social causada pela disseminação do vírus entre
a população global. A Organização Mundial de Saúde reconheceu em 11 março de
2020 a situação de pandemia da doença do Covid- 19. Até o início do dia 25 de fevereiro
de 2021, a instituição registrava 111.999.954 casos confirmados de pessoas
infectadas pelo vírus da covid-19, com 2.486.679 mortes, distribuídas por todos
os continentes.
O Brasil é o terceiro
país em número de pessoas com casos confirmados, 10.257.875, abaixo apenas dos
EUA e da Índia, mas até a 1ª quinzena de abril o número de casos confirmados no
nosso país deverá superar o do Índia, galgando a 2ª posição. Haviam sido
registradas no Brasil, até aquela data, 248.529 pessoas mortas pelo Covid-19,
número inferior apenas às 499.019 pessoas mortas nos EUA. Desde o início de
novembro de 2020, a doença enfrenta uma segunda onda de contaminação no país,
voltando a se expandir em ritmo acelerado em parte expressiva do território
nacional, atingindo média semanal superior a mil casos diários em meados de
fevereiro, sem perspectivas de refluir.
Nos países centrais, a
vacinação ampla contra a doença do Covid-19 ganhou impulso a partir do final de
2020, mas não deverá lograr a imunização de parcela significativa da população
mundial antes do segundo semestre de 2021. A consequência desse fato é que os
impactos da pandemia continuarão marcando a evolução da economia em escala
global ao longo do corrente ano e, possivelmente, do ano de 2022. No Brasil, o início da vacinação foi
postergado para o mês de janeiro de 2021, com o agravante de que a o ritmo de
vacinação se mantém muito insatisfatório, por conta da falta de uma política
clara de aquisição dos insumos no exterior, que persiste até o momento. Salta
aos olhos a descoordenação que impera na implementação do programa de
vacinação.
Impactos econômicos e
sociais
Os impactos econômicos e
sociais da pandemia têm sido terríveis. Em meados de dezembro de 2020, o
balanço preliminar da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL),
órgão integrante das Nações Unidas, estimou contração média de 7,7% do PIB do
subcontinente latino-americano em 2020, queda sem paralelo desde que as
estatísticas começaram a ser registradas. Para aquela instituição, o
encerramento temporário de muitas atividades e a perda de rendimentos das
pessoas provocaram uma contração acentuada do nível de ocupação em todos os
países da região. Em uma estimativa para o segundo trimestre de 2020,
abrangendo catorze países da América Latina e Caribe, a Organização Internacional
do Trabalho (OIT) indicou queda de 10 pontos percentuais na taxa de ocupação,
na comparação com igual período do 2019, correspondentes a uma perda de 47
milhões de postos de trabalho.
No início de janeiro de
2021, o relatório Panorama Econômico Mundial, do Banco Mundial, estimou em 6,9%
a retração do PIB na América Latina e Caribe e projetou para 2021uma retomada
parcial do crescimento na região, com elevação de 3,7% no seu PIB.
O Relatório de Inflação
do Banco Central do Brasil assinalou no início de dezembro que a recuperação da
economia mundial dependerá principalmente da evolução do Covid-19. O relatório
alerta que a ressurgência da pandemia entre algumas das principais economias
mundiais poderia interromper ou mesmo reverter, por algum tempo, a recuperação
parcial do nível da atividade econômica mundial registrada no terceiro
trimestre de 2020, o que veio a se confirmar no início de 2021.
As políticas
contracíclicas
As respostas dadas pelos
governos nacionais para atenuar os impactos da pandemia sobre a ocupação e os
rendimentos das famílias, e assim se contraporem à espiral descendente do poder
de compra, assumiram grandes proporções. As medidas implementadas envolveram um
leque variado de instrumentos, contemplando políticas monetárias agressivas de
adoção de taxas de juros negativas, montantes inéditos de transferência de
renda para as famílias que, de uma hora para outra, perderam suas fontes de
ganhos e políticas creditícias e de suplementação de salários dos empregados
para as empresas em dificuldades, configurando uma das mais abrangentes
experiências históricas de políticas anticíclicas e de caráter humanitário.
No Brasil, as medidas
contracíclicas alcançaram grande monta, abrangendo, além dos instrumentos
citados acima, volumosas transferências federais para os entes subnacionais
(estados e municípios), a fim de compensar as abruptas perdas na arrecadação,
sem as quais os serviços públicos mantidos por essas esferas de governo teriam
entrado em colapso.
Indefinição angustiante
Os governos dos países
centrais e as agências multilaterais de desenvolvimento têm expressado
enfaticamente a necessidade da continuidade dos estímulos de renda, tanto do
ponto de vista humanitário, quanto do ponto de vista da retomada da economia. O
recém empossado presidente Biden, dos EUA, anunciou um robusto pacote de
estímulo que deve alcançar entre US$ 1,4 e US$ 1,9 trilhão.
O Brasil inicia o ano de
2021 em um ambiente de profunda incerteza, diante do encerramento do período
estipulado para a vigência dos diversos programas contracíclicos. Com mais de
50 dias de interregno, o governo federal ainda não foi capaz de aprovar um
programa robusto de amparo à população desassistida e que venha se contrapor ao
refluxo da demanda. Apegadas a uma retórica de austeridade desconectada com a
gravidade da situação econômica e social, as autoridades econômicas retardam a
definição das novas medidas de socorro à população sem renda, que venham suprir
o vazio de políticas que vige desde o final do ano passado. É importante
destacar que, depois da modesta retomada verificada no 3º trimestre de 2020,
graças ao vigor dos estímulos concedidos, a economia brasileira já vem perdendo
fôlego nos últimos meses.
O citado Relatório da
Inflação, do Banco Central constatava em dezembro que as perspectivas sobre o
ritmo de crescimento da economia brasileira continuavam muito incertas, diante
da redução do volume de transferências de rendas para as famílias (auxílios
emergenciais) já nos últimos meses de 2020.
Para 2021, reina a
indefinição e as medidas atualmente em discussão são completamente
insuficientes. Do ponto de vista social, a proposta do novo auxílio emergencial
encaminhada ao congresso nacional, em quatro parcelas de R$ 250, não atende
minimamente as necessidades de sobrevivência das famílias empobrecidas pela
pandemia e chega a ser inexpressiva do ponto de vista de impulso da demanda. Ao
fim e ao cabo, famílias empobrecidas, empresas fragilizadas e entes
subnacionais iniciam o ano de 2021 sem perspectivas definidas em relação ao
futuro imediato.