Praça São Francisco, São Cristovão- SE

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Praça São Francisco, São Cristovão-SE. Patrimônio da Humanidade

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

O Nordeste na crise

Ricardo Lacerda
O roteiro da crise em termos espaciais não era exatamente inesperado. A recessão inicialmente bateria de forma mais intensa na atividade industrial e se concentraria, por conseguinte, nos estados e regiões mais industrializados. Em seguida, a retração do nível de atividade se estenderia para o setor de serviços e se agravaria a deterioração no mercado de trabalho, alcançando com força os estados e regiões mais pobres e com mercados de trabalho mais frágeis. A seca e/ou a queda nas cotações internacionais cuidaram para que as áreas dedicadas aos modernos agronegócios também não fossem poupadas.

Regiões
No momento a economia do Nordeste continua prostrada, enquanto o nível de atividade em algumas regiões já ensaia a retomada de um certo crescimento, que pode ser sustentável ou não. A economia do Nordeste vem sendo atingida pela conjunção da forte retração do nível de atividade no segmento de serviços, pelo colapso da construção civil, pela forte deterioração das finanças públicas nas esferas estaduais e municipais e, mais recentemente, pelos efeitos da estiagem sobre a produção de grãos, inclusive nas áreas de fronteira agrícolas dedicadas aos agronegócios.
Se a crise econômica foi menos dura no Nordeste nos primeiros estágios do ciclo descendente o inverso está acontecendo no período mais recente.
Na comparação com dezembro de 2014, o Índice de Atividade Regional do Banco Central (IBC-R) do Nordeste de julho de 2016, no acumulado em doze meses, se situava 9,2%, frente aos 4,5% abaixo na região Norte e aos 2,9% na região Sudeste (ver Gráfico 1).
A região Centro-Oeste, que em 2015 havia sido favorecida pelos efeitos da depreciação da moeda sobre o setor exportador, viu despencar o nível de atividade ao longo de 2016, em grande parte por conta da estiagem. O  IBC-R do Centro-Oeste em doze meses, que chegou a se situar 8,2% acima do resultado de dezembro de 2014, recuou para 99,2% nos doze meses encerrados em julho de 2016, portanto 0,8% abaixo.
A crise no setor agropecuário também não poupou a região Sul, que em julho de 2016 apresentava o acumulado de doze meses do IBC-R de 93,8, portanto 6,2% abaixo do resultado de dezembro de 2014.


Fonte: Banco Central do Brasil

Bola da vez
Em meados de 2015, a crise já havia se instalado em todas as regiões do país. No segundo trimestre de 2015, o nível de atividade da economia da região Nordeste havia recuado 1,1%, em relação ao 1º trimestre, na série livre de efeitos sazonais, a menor queda entre as cinco regiões. A retração do nível de atividade econômica se agudizou muito no último trimestre de 2015, com o IBC-R caindo 2,3%, a mesma taxa de recuo da média nacional e já mais acentuada do que as quedas registradas nas regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste (ver Gráfico 2).
Ao longo de 2016, o nível de atividade da economia brasileira manteve-se prostrado, arrastando-se em direção ao ainda não alcançado fundo do poço, mas os comportamentos das regionais foram muito distintos entre si. No primeiro trimestre do ano, as regiões Norte, Sul e Centro-Oeste apresentaram crescimento, mesmo que a taxas modestas, enquanto as regiões Nordeste e Sudeste continuaram em trajetória descendente.
No segundo trimestre de 2016 e no primeiro resultado trimestral da segunda metade do ano, referente ao período maio-julho, as regiões Norte e Sudeste, em que as atividades industriais têm maior peso no PIB, já haviam invertido a trajetória de queda, enquanto o nível de atividade na economia do Nordeste se manteve estável em relação ao trimestre anterior (-0,1%) e as regiões Centro-Oeste e Sul foram duramente atingidas pela crise do setor agropecuário.
Entre a recuperação do nível de atividade e o incremento na ocupação e na remuneração média decorre um certo tempo. Se os indicadores do mercado de trabalho nas regiões que já apresentam algum crescimento continuam se deteriorando, a situação do trabalho no Nordeste ainda pode se agravar muito antes de começar a reagir.



Fonte: Banco Central do Brasil: Obs: Série livre de efeitos sazonais.

Publicado no Jornal da Cidade, em 25/09/2016


segunda-feira, 5 de setembro de 2016

O PIB do 2º trimestre de 2016


Ricardo Lacerda
Apesar de a maior parte dos índices de confiança disponíveis registrar elevação, emergiu entre os especialistas um sentimento de ceticismo sobre as possibilidades de crescimento no curto prazo do nível de atividade da economia brasileira.  As publicações na semana passada dos resultados do PIB do 2º trimestre e da produção industrial de julho não concorreram para aliviar as preocupações.
A evolução do PIB no segundo trimestre de 2016 não apresentou desaceleração do ritmo de queda em relação ao trimestre anterior, como vinha ocorrendo desde o terceiro trimestre de 2015. Depois de registrar retração de 1,3% no último trimestre de 2015 e de 0,4% no 1º trimestre de 2016, o PIB no segundo trimestre recuou 0,6%.
O volume da produção industrial de julho também decepcionou, com incremento de apenas 0,1%, que pode ser interpretado como estabilização, depois de quatro meses de incremento, ainda que modestos. Em julho, um número menor de atividades industriais apresentou crescimento do que na edição de junho. E na comparação com o mesmo mês do ano anterior a produção física da indústria caiu 6,6%, mais do que os 5,8% que havia recuado no mês de junho.
Mercado de trabalho e consumo
São duas as observações que merecem ser destacadas em relação à continuidade da queda do PIB brasileiro no segundo trimestre de 2016, em uma série que completa seis resultados negativos sucessivos: a principal é que a acelerada deterioração do mercado de trabalho impacta muito fortemente os componentes principais do PIB, tanto da ótica da produção setorial quanto do lado da demanda agregada.
A segunda observação é a de que a evolução do setor externo no segundo trimestre inverteu a tendência recente e passou a contribuir negativamente para o crescimento do PIB. Enquanto as exportações de bens e serviços perderam o impulso, as importações de bens e serviços voltaram a crescer, na comparação com o trimestre imediatamente anterior.
Há ainda uma terceira observação que merece destaque relativa ao efeito da estiagem sobre a produção do setor agropecuário, que tem apresentado comportamento ruim desde o início do ano e recuou 2% no segundo trimestre.
Os resultados recente do nível de atividade econômica sinalizam a necessidade urgente de interromper o mais rápido possível a espiral descendente do consumo e estancar a deterioração do mercado de trabalho. A redução dos juros e o destravamento do crédito são medidas óbvias, mas podem não ser suficientes.
Produção
Do ponto de vista da produção, além da referida queda de 2% na produção agropecuária o setor serviços, que representa mais de 70% da produção da riqueza do país, registrou a sexta queda trimestral sucessiva e não sinalizou ainda a interrupção do seu declínio, enquanto a atividade industrial apresentou um desempenho relativamente modesto, invertendo a queda de 0,3% no 1º trimestre para um incremento de 0,3% no segundo (ver Gráfico 1). Os piores desempenhos entre as atividades de serviço foram os dos segmentos de atividades de transporte e armazenagem, de outros serviços e de intermediação financeira.


Fonte: IBGE- CNT


Demanda

Do ponto de vista da demanda agregada, o desempenho de todos os componentes no segundo trimestre foram muito ruins, ainda que a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), a partir de uma base de comparação muito rebaixada, tenha deixado de cair.  Especialmente preocupante foi o desempenho do consumo das famílias que responde por mais de 60% do dispêndio global e não dá sinais de estabilização, já registrando seis trimestres consecutivos de quedas muito acentuadas.

Cabe também assinalar que o setor externo da economia também concorreu para o declínio do nível de atividade, em parte por conta do refluxo do impulso exportador, em parte porque a importação de bens e serviços parou de encolher. A grande incógnita é qual vai ser a resposta do governo não apenas para estancar a espiral descendente no mercado de trabalho mas sobretudo para reanimar o nível de atividade econômica.

Fonte: IBGE- CNT


Publicado no Jornal da Cidade, em 04/09/2016