Praça São Francisco, São Cristovão- SE

Praça São Francisco, São Cristovão- SE
Praça São Francisco, São Cristovão-SE. Patrimônio da Humanidade

segunda-feira, 31 de março de 2014

O encolhimento do saldo comercial brasileiro – Parte 3




Ricardo Lacerda e Thiago Souza

Como vimos nos dois artigos anteriores, o encolhimento do saldo comercial brasileiro em 2012 e 2013 se deveu em grande parte à inversão abrupta da trajetória das exportações. A tese central é que as exportações brasileiras, depois de apresentarem uma forte aceleração entre 2002 e 2008, ainda lograram manter taxas de crescimento elevadas entre 2008 e 2011, mesmo que em ritmo menos acentuado do que no período anterior.

A continuidade do crescimento das exportações, após o início da crise internacional, exigiu a reorientação das vendas externas para os mercados emergentes, com destaque para os mercados os asiáticos. Tal reorientação favoreceu o crescimento das exportações de produtos básicos e de menor intensidade tecnológica. Assim, a crise propiciou que a mudança que já vinha ocorrendo na pauta exportadora e nos mercados de destinos das exportações brasileiras fosse acentuada.

Todavia, quando a economia mundial entrou no segundo mergulho da grande recessão, a partir de meados de 2011, os mercados emergentes sofreram, com alguma defasagem temporal, impacto intenso. O Brasil já não contava com a válvula de escape exportar para os emergentes. Entre 2011 e 2013, as exportações brasileiras recuaram. Como efeito colateral da interrupção do crescimento das exportações, as mudanças no perfil da pauta e do destino se tornaram foram menos acentuadas.

Destinos

A mudança da pauta exportadora mostrou-se fortemente associada ao perfil dos parceiros comerciais. À medida em que as vendas para China e para o conjunto do bloco asiático ganharam participação, os produtos industrializados e, dentre eles, os produtos de alta e média alta intensidades tecnológicas, reduziram seus pesos no total, enquanto os produtos não industrializados e os industrializados de baixa e média-baixa intensidade tecnológica aumentaram suas participações.

No extremo oposto, as exportações para a economia americana, que já vinham apresentando desempenho bem inferior à média dos destinos no período de intenso crescimento das exportações brasileiras, entre 2002 e 2008, simplesmente pararam de crescer após o início da crise financeira internacional, concorrendo para reduzir o peso das exportações industrializadas e de intensidade tecnológica mais favorável.
  
Industrializados e não industrializados

É importante destacar que a classificação segundo intensidade tecnológica considera apenas os produtos industrializados, que representavam, em 2013, 62,4% do total exportado pelo país, cerca de três em cada cinco dólares exportados. Em 2013, esse grupo respondia por 80,6%, ou cerca de quatro em cada cinco dólares exportados.

O Gráfico 1 mostra que a redução na participação das exportações não industrializadas se acentua a partir de 2008, mas mostra também que ela deixou de ser ampliada nos últimos dois anos.


Fonte: MDIC/SECEX, vários anos.

Intensidade tecnológica

A mudança na pauta exportadora, associada à mudança no perfil de destino e à reversão na trajetória do crescimento pós-2011, pode ser captada também no perfil das exportações dos produtos industrializados segundo a intensidade tecnológica. O movimento não foi linear, com exceção da participação dos produtos de alta tecnologia que declinou durante todo o período 2002-2013.

Os produtos da indústria de alta tecnologia, que representavam 9,8% das exportações totais, em 2002, perderam mais de cinco pontos percentuais de participação e, em 2013, representavam apenas 4,1%. As exportações de média-alta tecnologia, com destaque para veículos automotivos, apresentaram bom desempenho até 2008 e tiveram dificuldades nos anos seguintes (ver Tabela). 

Por sua vez, os produtos de média-baixa tecnologia ganharam participação até 2008, têm um rebaixamento importante, em 2009 e 2010, e apresentaram tendência de recuperação de participação nos anos seguintes, trajetória inversa a da participação dos produtos de baixa tecnologia.

Notável mesmo é o desempenho das exportações não industriais, que resistiram à ao agravamento do cenário externo até 2011, recuando, todavia, nos dois anos seguintes.


Tabela. Brasil. Exportações segundo o grau de intensidade tecnológica. 2002-2013
Intensidade tecnológica
2002
2008
2009
2010
2011
2012
2013
US$ bilhões
Total das exportações
60,4
197,9
153,0
201,9
256,0
242,6
242,2
Produtos industriais
48,7
141,9
104,6
128,4
153,2
149,5
151,2
Alta tecnologia
5,9
11,5
9,0
9,3
9,7
10,2
9,8
Média-alta tecnologia
12,9
40,1
27,2
36,3
42,6
40,5
39,9
Média-baixa tecnologia
10,7
38,9
24,7
29,4
39,1
38,8
41,4
Baixa tecnologia
19,1
51,4
43,6
53,3
61,8
60,0
60,0
Produtos não industriais
11,7
56,1
48,4
73,6
102,9
93,1
91,0

Participação  (%)
Total exportações
100
100
100
100
100
100
100
Produtos industriais
80,6
71,7
68,4
63,6
59,8
61,6
62,4
Alta tecnologia
9,8
5,8
5,9
4,6
3,8
4,2
4,1
Média-alta tecnologia
21,4
20,3
17,8
18,0
16,6
16,7
16,5
Média-baixa tecnologia
17,6
19,6
16,2
14,6
15,3
16,0
17,1
Baixa tecnologia
31,7
26,0
28,5
26,4
24,1
24,7
24,8
Produtos não industriais
19,4
28,3
31,6
36,4
40,2
38,4
37,6
Fonte: MDIC/SECEX, vários anos.


Na etapa mais recente (2011-2013), de dificuldades mais acentuadas no comércio exterior brasileiro, o único grupo que aumentou as exportações foi o de média-baixa tecnologia, enquanto as exportações de alta tecnologia, de média-alta tecnologia  e de baixa tecnologia e de produtos não industriais apresentaram quedas muito expressivas.  

Publicado no Jornal da Cidade, em 30/03/2014