Praça São Francisco, São Cristovão- SE

Praça São Francisco, São Cristovão- SE
Praça São Francisco, São Cristovão-SE. Patrimônio da Humanidade

domingo, 29 de agosto de 2010

Nível de atividade econômica e consumo de energia em Sergipe

Ricardo Lacerda

Os principais indicadores utilizados para medir a temperatura da economia do país, mês a mês, procuram aferir a situação do mercado de trabalho, das vendas do comércio, da produção industrial, do nível de utilização da capacidade produtiva da indústria, do volume de produção agrícola e do saldo de empréstimos na economia, procurando dimensionar o comportamento dos setores agrícola, industrial, serviços e comércio, além de indicadores de relação com o setor externo da economia.

Consideram-se, também, os indicadores produzidos pelas sondagens das expectativas de consumidores e de empresários que informam o grau de otimismo e a disposição de dispêndio desses segmentos para os próximos meses. Com base nesses indicadores, dentre outros, o Conselho de Política Monetária- Copom, do Banco Central, decide, a cada 45 dias, qual deve ser a taxa de juros básica que ajusta o nível de atividade econômica às metas de inflação para o ano.

Indicadores

Os indicadores do nível de atividade são importantes para a tomada de decisão não apenas por parte das autoridades monetárias. Empresários dos segmentos da indústria, do comércio, de prestação de serviços e produtores agrícolas encontram nesses indicadores, ao lado da percepção sobre o andamento dos seus próprios empreendimentos e do mercado em que atuam, as informações que os subsidiam tanto nas atividades mais rotineiras relativas ao volume de insumos e de mercadorias que devem adquirir, quanto nas decisões mais estratégicas referentes à expansão dos negócios em direção ao aumento de produção, abertura de filiais e diversificação da produção.

É sentindo o pulso da economia que se pode planejar, adotando em algumas ocasiões uma postura defensiva e, em outras, aproveitando as oportunidades de expansão. Para os cidadãos, o acompanhamento desses indicadores também é importante, para que possam se posicionar em relação às medidas de política econômica e para definir suas estratégias de inserção no mercado de trabalho e em suas decisões de compra e de endividamento.

Muitos desses indicadores não estão disponíveis em escalas espaciais menores, como região e estado, ou, alguns deles, estão disponíveis apenas para alguns estados. A Pesquisa Industrial Mensal e a Pesquisa Mensal do Emprego, ambas do IBGE, por exemplo, não são realizadas ou não produzem indicador desagregado para a maioria dos estados da federação, inclusive Sergipe. No início de 2009, para suprir essa demanda de indicadores mais localizados de nível de atividade, equipe técnica do Banco Central desenvolveu, em projeto piloto, o Índice de Atividade Econômica Regional do Rio Grande do Sul, o IBCR-RS, a partir de indicadores que permitem inferir a evolução mensal daquela economia.

Sergipe

Para avaliar o comportamento do nível de atividade da economia sergipana estão disponíveis alguns indicadores que, em conjunto, permitem formar um quadro geral da situação presente e das perspectivas para os próximos meses. Boa parte desses indicadores circula semanalmente no boletim Sergipe Econômico, elaborado pela Federação das Indústrias do Estado de Sergipe- FIES em parceria com a Universidade Federal de Sergipe. Ver em http://www.sergipeeconomico.com.

Especialmente representativos são os indicadores sobre a evolução do nível de emprego, volume de vendas do comércio, operações de crédito, produção de petróleo e gás, arrecadação do ICMS e do IPI. Para avaliar o grau de confiança do empresariado local sobre a situação presente e nos rumos da economia nos meses seguintes, a Fies elabora, mensalmente, a Sondagem Industrial.

O consumo de energia

O consumo de energia elétrica guarda uma relação técnica com o volume de produção física da indústria. No gráfico a seguir é apresentada a soma do consumo mensal de energia elétrica do setor industrial e do consumo do mercado livre na área da Energisa. A chamada Demanda dos Consumidores Livre refere-se ao consumo de grandes empresas que contratam no mercado livre de energia, de acordo com a melhor oferta de preço disponível. São, em geral, grandes consumidores, tanto no setor industrial quanto no de serviços.
Entre janeiro e julho de 2010, o consumo industrial e a demanda dos consumidores livre da área da Energisa somaram 556,7 GWh, 12% acima dos 496,4 GWh do mesmo período de 2009. Em julho de 2010, o consumo de energia desse agregado alcançou 80,3 GWh, frente a 70,4 GWh de julho de 2009, um incremento de 22,4%, um aumento muito substancial.










Fonte: Energisa

Esse indicador, ao lado de outros, como o nível de emprego da indústria, informa a intensidade da recuperação do nível de atividade da indústria sergipana depois do impacto ocorrido durante o período mais duro da crise financeira internacional, entre o final de 2008 e os primeiros meses de 2009. Desde novembro de 2009, a soma do consumo de energia elétrica do setor industrial e da demanda livre na área da Energisa tem, em todos os meses, superado o resultado de igual mês do ano anterior. Em julho de 2010, especificamente, verificou-se uma forte aceleração do consumo e um maior distanciamento em relação ao resultado de 2009.
A construção de indicadores de nível de atividade concorre para qualificar o debate econômico nos âmbitos nacional e local. Seguindo exemplo do que foi realizado pela equipe do Banco Central no Rio Grande do Sul, a construção de um indicador síntese que represente o nível de atividade da economia sergipana se somaria aos indicadores já disponíveis. Nesse sentido, estão sendo iniciados os estudos para elaborar, ainda em 2010, o Índice do Nível de Atividade Econômica de Sergipe, o INA-SE, em mais uma parceria da FIES com a UFS.

* Professor do Departamento de Economia da UFS e Assessor Econômico do Governo de Sergipe.

Publicado no Jornal da Cidade em 29 de agosto de 2010

A expansão da pecuária de leite em Sergipe

A Pesquisa Pecuária Municipal- PPM do IBGE tem revelado dados surpreendentes sobre a expansão da pecuária de leite em Sergipe. A produção anual de leite de Sergipe passou de 115 milhões de litros, em 2000, para 260 milhões de litros, em 2008, incremento de 126%. Nesse último ano, o Estado já respondia por 8% do leite produzido na região Nordeste, o que é um resultado digno de destaque, tendo em vista a sua reduzida dimensão territorial.

Apenas para comparar, no mesmo período o vizinho estado de Alagoas, que possui uma bacia leiteira mais tradicional, aumentou a produção de leite em apenas 10%. Segundo a PPM, em 2000, a produção de leite de Sergipe equivalia a 52% da produção alagoana e, em 2008, já superava a produção do estado vizinho em 8%. A expansão da bacia leiteira sergipana tem aberto oportunidade para a implantação de novos empreendimentos de beneficiamento e de produção de derivados de leite no interior no Estado e aponta para um novo patamar dessa atividade. O crescimento registrado é extraordinário e revela um novo cenário para a atividade. No presente artigo, examinam-se algumas características da bacia leiteira de Sergipe em termos de sua distribuição geográfica e de sua estrutura de produção.

Geografia do leite

A pecuária é uma atividade de grande importância em Sergipe. O Censo Agropecuário informou que, em 2006, 943 mil hectares foram ocupados com pastagens no Estado, correspondentes 64% do total das terras utilizadas.



















Gráfico 1. Sergipe. Produção Anual de Leite dos Principais Municípios. 2008. (Em mil litros)
Fonte: IBGE-Pesquisa Pecuária Municipal de 2008.

Um fato curioso é que a bacia leiteira vem se concentrando na parte de cima do mapa de Sergipe, notadamente no Alto Sertão e, em degrau um pouco abaixo, no Médio Sertão e no Baixo São Francisco. Os seis principais municípios produtores se localizam no território do Alto Sertão: Nossa Senhora da Glória, Porto da Folha, Poço Redondo, Canindé do São Francisco, Gararu e Monte Alegre. Chama a atenção, também, como a produção leiteira tem se expandido em direção ao Baixo São Francisco, especialmente no município de Japoatã, e ao Médio Sertão, em Aquidabã, Feira Nova, Cumbe e Itabi. No gráfico 1 são apresentadas as produções anuais dos 15 principais municípios produtores de Sergipe, em 2008. Nessa lista, apenas um município, Lagarto, situa-se fora da área delimitada mais ao Norte.

Produtores

Um aspecto importante da produção leiteira de Sergipe é o de que ela se constitui uma importante fonte de renda para a agricultura familiar. Segundo o Censo Agropecuário de 2006, cerca de 2/3 dos estabelecimentos produtores de leite do Estado possuem até 19 cabeças de gado, sendo que 18% têm até 4 animais e 23%, entre 5 e 9 animais. No outro extremo, os proprietários de mais de 500 cabeças de gado são apenas 57, correspondentes a 0,3% dos mais de 16 mil produtores de leite de Sergipe, e os produtores com mais de 100 animais e menos de 500, representam 4%. Ver gráfico 2. A produtividade dos pequenos produtores não se diferencia muito da média da atividade. Com 32% do total de vacas ordenhadas em Sergipe, os produtores com até 19 cabeças respondiam, em 2006, por 30% do leite produzido. Cerca de 1/3 do leite é produzido em estabelecimentos com menos de 20 hectares e 58%, em estabelecimentos com até 50 hectares.












Gráfico 2. Sergipe. Distribuição da Produção de Leite segundo Faixa de Número de Cabeças de Gado dos Estabelecimentos (%).2006.
Fonte: IBGE-Censo Agropecuário de 2006.

Pode-se afirmar que está se formando uma nova geografia do leite em Sergipe. Novos municípios e novos produtores têm encontrado na atividade uma importante alternativa de obtenção de renda e ocupação. Essa expansão tem sido percebida como uma oportunidade para atrair novas unidades industriais de beneficiamento do produto. Como se sabe, persistem no segmento importantes carências econômicas e tecnológicas, mas os dados parecem apontar que Sergipe está pronto para dar um salto em direção à consolidação de sua cadeia produtiva do Leite.

Ricardo Lacerda
Professor do Departamento de Economia da UFS e Assessor Econômico do Governo de Sergipe.
Publicado no Jornal da Cidade, em 05 de junho de 2010.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

O Censo, a PNAD e o acesso a bens e serviços

Ricardo Lacerda*

Não é possível superestimar a importância do Censo Populacional para o planejamento das políticas públicas. Através do Censo, como assinala o IBGE, o poder público pode identificar as necessidades de investimentos em saúde, educação, habitação, saneamento básico, transporte, energia, programas de assistência à infância e à velhice. O setor privado também faz uso das informações obtidas para o planejamento de suas decisões de investimento e de entrada em novos mercados.

Nos anos não censitários, o IBGE realiza uma coleta mais restrita de informações econômicas e sociais por meio da Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar- PNAD. A última PNAD publicada é a de 2008, em que foram pesquisados cerca de 150 mil domicílios em todas as Unidades da Federação. Os resultados gerados pela PNAD são representativos para os estados e para as capitais, mas, diferentemente dos censos, não podem ser desagregados à esfera dos municípios.

Acesso a bens

Na seção dedicada aos domicílios, o Censo e a PNAD coletam informações sobre o tipo de construção, número de moradores, número de cômodos e sobre a existência de alguns bens duráveis e de serviços públicos, como coleta de lixo, saneamento, entre outras. A seguir, são apresentados alguns resultados sobre o acesso a bens duráveis nos domicílios sergipanos, com base na PNAD de 2008, comparativamente ao ano de 2001 ou 2003.













Fonte: PNAD- IBGE

Em 2008, a PNAD constatou que bens como geladeira, televisão, fogão e rádios encontravam-se fortemente disseminados nos domicílios sergipanos: 88% dos domicílios possuíam geladeira; 96%, televisão; 98,4%, fogão e 86,7%, aparelhos de rádio. Os filtros de água eram encontrados em 44,1% dos domicílios e as maquinas de lavar roupa, em 20,3%. Itens como geladeira, televisão e maquina de lavar roupa registraram aumento importante de presença nos lares dos sergipanos entre 2001 e 2008. Ver gráfico 1. Com a expansão do emprego e do crédito em 2009 e 2010, certamente as futuras pesquisas constatarão participações ainda mais elevadas desses bens nas residências.

Um dado que diz muito da situação diferenciada de Sergipe em relação aos demais estados da região Nordeste é o ranking dos estados nesse indicador. Dos seis itens analisados, Sergipe contava, entre os estados nordestinos, com a maior participação de domicílios onde os bens estão presentes nos casos de geladeira, televisão e fogão; se situava na segunda posição nas participações de máquina de lavar e aparelho de rádio nos domicílios, e quarto lugar, na de filtros de água. Um aspecto interessante é que nenhum outro estado da região se posicionou em primeiro lugar em mais de um item.

Telefones e computadores

A partir de 2003, a PNAD passou a pesquisar a existência de computadores e telefones nas residências dos brasileiros. A disseminação da telefonia, especialmente da telefonia móvel, tem sido exponencial desde então. Em 2003, 45% dos lares sergipanos contavam com linha telefônica, participação que aumentou para 82,9% em 2008.














Fonte: PNAD- IBGE




Seja em 2003, seja em 2008, a participação dos domicílios sergipanos com linha telefônica é substancialmente superior à média da região Nordeste. Ver gráfico 2. Os computadores também estão mais presentes nos lares sergipanos, ainda que a desejada universalização permaneça muito longe de ser alcançada. Em 2008, 22,1%, pouco mais de 1 em cada 5, domicílios sergipanos possuíam computador, frente a 8,6%, aproximadamente 1 em cada 11 domicílios, em 2003.

O acesso domiciliar à internet é mais restrito. Em 2008, apenas 6,3% dos domicílios sergipanos contavam com computadores conectados. Nesses três indicadores, domicílios com telefone, computador e computador com internet, Sergipe se situava, em 2008, em primeiro lugar entre os estados nordestinos.

O Censo Populacional e as PNADs propiciam um conhecimento detalhado da situação social e econômica dos domicílios e das pessoas. Os resultados de 2008, por exemplo, recomendam a adoção de programas robustos de financiamento subsidiado para aquisição de computadores e ações voltadas para o acesso público à internet. Com a coleta de informações de Censo Populacional de 2010, será possível conhecer, município, por município, a situação do acesso a bens e serviços.


* Professor do Departamento de Economia da UFS
Publicado no Jornal da Cidade em 22 de agosto de 2010

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Guerra fiscal, reforma tributária e desenvolvimento regional

Publicado no Valor Econômico em 12/02/2008. Não é preciso dizer que a reforma tributária não foi aprovada até o momento. Fazemos votos de que o próximo governo a coloque novamente em pauta.

Ricardo Lacerda e Sudanês Pereira

A utilização de incentivos fiscais, subsídios e outros atrativos tributários tem sido comum entre os governos estaduais no Brasil. A chamada Guerra Fiscal entre as unidades da federação surgiu em um contexto de abandono de políticas e de instrumentos de desenvolvimento nacional e regional e a extinção das agências federais de desenvolvimento. Essas decisões provocaram a descentralização de ações de desenvolvimento regional.

Os Estados passaram a adotar políticas de incentivos, com o intuito de atrair investimentos industriais para o seu território, sem a interferência do governo federal. O principal atrativo tem sido a renúncia do ICMS. É necessário reconhecer que, frente à tendência dos novos investimentos concentrarem-se nas áreas mais desenvolvidas do país reforçando desigualdades, a Guerra Fiscal foi uma tentativa de atrair investimentos para fora do núcleo industrial mais moderno do território brasileiro.

A disputa fiscal entre os Estados por novos investimentos prejudica as finanças estaduais bem como a provisão pública de bens e serviços. A Guerra Fiscal representa um "jogo não-cooperativo" do tipo soma zero, em que a atração de um investimento para um Estado corresponde à perda efetiva ou potencial de outro e cuja resultante é o prejuízo fiscal para cada um deles e para o conjunto do país. Uma vez em curso a Guerra Fiscal, todos os Estados são induzidos a participar dela, correndo o risco, se não o fizerem, de perder para outros Estados que concedem tais benefícios fiscais, as indústrias implantadas em seu território.

Além do prejuízo às finanças públicas, a Guerra Fiscal gera distorções no setor produtivo criando uma competição desleal em favor a) das grandes empresas contra as pequenas; b) das empresas com maior relação capital/trabalho; c) das empresas novas que recebem incentivos contra as já estabelecidas no mercado. O mais grave é que as firmas escolhem sua localização baseadas nesses incentivos e, freqüentemente, não estabelecem relações com a base produtiva estadual.

A reforma tributária é uma necessidade para a retomada do desenvolvimento brasileiro de forma sustentada. A dificuldade maior reside em criar instrumentos justos de atração de investimentos, bem como construir os mecanismos de transição para o novo marco institucional.

O projeto de reforma tributário coordenado pelo governo federal está assentado na substituição dos tributos sobre bens e serviços (ICMS, IPI, PIS, Cofins, Cide-Combustíveis) por dois impostos sobre o valor adicionado: O Imposto sobre Valor Agregado - Estadual (IVA-E) e o Imposto Sobre Valor Agregado - Federal (IVA-F). Como o IVA-E observaria o princípio do destino, ou seja, seriam arrecadados pelos Estados onde os produtos seriam consumidos (ou utilizados no processo de produção), o principal mecanismo da Guerra Fiscal seria desativado.

A solução passa por uma distribuição equilibrada dos fatores estratégicos, que determinarão o futuro das regiões no nosso país.Algum potencial de Guerra Fiscal ainda restaria, ainda que substancialmente menor do que a que vigora hoje, através de políticas que desonerassem não mais, como a redução ou isenção do ICMS, os produtos elaborados, mas reduzindo a alíquota de insumos utilizados pelas indústrias localizadas no Estado. A migração da incidência da tributação da origem para o destino seria paulatina.

Caberia construir um sistema de compensação em que não houvesse perdedores.
Porém, o ponto central é que a eliminação dos incentivos estaduais deve ter como contrapartida a adoção de medidas efetivas por parte do governo federal voltadas para a redução dos desequilíbrios regionais.

Novos modelos de desenvolvimento têm sido registrados pela literatura especializada, enfatizando como algumas localidades (regiões e cidades) estão transformando as suas estruturas produtivas. Os novos processos de desenvolvimento combinam a atração de investimentos significativos com a ativação das potencialidades socioeconômicas locais. O fundamental é a implantação nas regiões/Estados e localidades das condições sistêmicas para tornar competitivos os investimentos ali realizados. O poder de atração de novos investimentos estaria associado a fatores que confiram competitividade ao sistema produtivo.

Como a constituição desses fatores não acontece da "noite para o dia", é necessária a instituição concertada entre unidades da federação e o poder central, por um tempo determinado, de incentivos fiscais e financeiros, além de outros mecanismos de indução dos investimentos para as áreas menos desenvolvidas do país, em uma estratégia de desenvolvimento nacional.

No momento, está sendo proposta a constituição do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR), cujos recursos poderiam ser alocados em investimentos estruturantes, no financiamento ao setor produtivo e em incentivos fiscais que seriam geridos pelas superintendências de desenvolvimento regional recriadas. O montante de recursos e o impacto dessa medida ainda não estão claramente definidos.

O desenvolvimento regional equilibrado e em bases sustentáveis requer ações voltadas para reforçar fatores que reduzam as desvantagens locacionais das áreas mais pobres, definindo uma melhor distribuição de ativos estratégicos no território brasileiro, tais como: infraestrutura física; escolarização e qualificação da mão-de-obra; acesso a crédito; capacidade de investimento do setor público em suas três esferas; sistemas locais de inovação; capacitação em pesquisa e desenvolvimento; desenvolvimento institucional; sustentabilidade ambiental e o fortalecimento das cadeias produtivas e dos arranjos produtivos locais.

O novo ciclo de desenvolvimento brasileiro que ensaia os seus primeiros passos e os avanços institucionais recentes indicam que estão postas as condições para inaugurar uma nova geração de políticas de desenvolvimento regional no Brasil. A longevidade da
Guerra Fiscal por si já demonstra a dificuldade para encontrar novos mecanismos que permitam a adoção de políticas mais racionais e sustentáveis de desenvolvimento regional. O caminho da solução passa por uma distribuição mais equilibrada dos fatores estratégicos que determinarão o futuro das regiões no nosso país.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

A expansão do varejo sergipano no 1º semestre

Ricardo Lacerda*

Durante a semana, os jornais noticiaram, quase simultaneamente, a desaceleração do crescimento econômico e a expansão recorde das vendas no varejo brasileiro. Em relação a junho de 2009, o volume de vendas no varejo brasileiro registrou alta de 11,3%. No acumulado do 1 º semestre, o volume de vendas avançou 11,5% na comparação com igual período do ano passado. O resultado do semestre é o melhor de toda a série histórica, iniciada em 2001.

Setorial

A expansão do varejo reflete o momento especial da economia brasileira, marcado pelo aumento do poder de compra da população. As vendas de um amplo setor do varejo, que inclui hipermercados, supermercados, alimentos, bebidas e fumo, cresceram 10,39% no 1º semestre de 2010, em relação ao 1º semestre de 2009.
Os setores de maior crescimento no período foram os de materiais e equipamentos de escritório, informática e comunicação, com impressionantes 25,8% de incremento, e o de móveis e eletrodomésticos, com 20,6%. Em ambos os setores, o nível de vendas já supera, com ampla margem, o patamar anterior à crise financeira internacional. São setores cujos desempenhos das vendas refletem, não apenas o aumento da renda dos consumidores, como também a expansão do crédito. O setor de medicamento e cosméticos registrou aumento de 12,2% e o de vestuário e calçados 10,2%, taxas também expressivas.

Regional

Um aspecto importante da expansão do comércio varejista no 1º semestre foi sua distribuição regional. Entre os 15 estados que apresentaram as maiores taxas de expansão do volume de vendas no 1º semestre de 2010, em relação ao mesmo período de 2009, nenhum pertencia às regiões Sul ou Sudeste. Os estados das regiões Norte, Centro-Oeste e Nordeste registravam os maiores incrementos.
Quando se observa o crescimento do volume de vendas nos últimos 12 meses encerrados em junho, os estados do Norte e Nordeste continuam se destacando. Nessa série, Sergipe foi o 4º estado de maior crescimento no comércio varejista, com expansão de 14,79% nos últimos 12 meses, frente à média nacional de 9,6%, também muito elevada. Entre os estados das regiões Sudeste e Sul, São Paulo apresentou melhor desempenho, 9,96%. Ver gráfico 1.






















Fonte: IBGE- Pesquisa Mensal do Comércio

Desaceleração

A diferença entre o indicador do nível de atividade e o do volume de vendas do varejo pode ser atribuída, em grande parte, aos seus períodos de referência. O noticiário, em relação ao nível de atividade, comparou o 2º trimestre de 2010 com o 1º trimestre de 2010; e em relação às vendas no varejo, são feitas comparações entre o 1º semestre de 2010 e o 1º semestre de 2009. Na verdade, tanto o nível de atividade quanto o volume de vendas vão apresentar resultados muito favoráveis em 2010, mas ambos tiveram desaceleração no 2º trimestre de 2010.
A aparente contradição entre o nível de atividade econômica e o volume de vendas se desfaz quando é observada a evolução da média móvel trimestral do volume de vendas, já livre de efeitos sazonais. A média móvel trimestral mostra, em junho, quanto o volume de vendas do trimestre abr-jun cresceu em relação ao trimestre mar-mai.

No trimestre encerrado em junho de 2010, o volume de vendas no comércio varejista no Brasil se apresentou estabilizado em relação aos trimestres anteriores. Desde o trimestre terminado em março de 2010 que a curva de vendas deixou de subir, na série livre de efeitos sazonais. Ver gráfico 2.

A curva do volume de vendas do varejo de Sergipe em 2010, na media móvel trimestral, tem trajetória próxima a do Brasil, ainda que se posicione um pouco acima do desempenho médio do País. Além disso, em junho o volume de vendas de Sergipe apresentou pequeno incremento no trimestre encerrado naquele mês, enquanto no Brasil esse indicador se manteve estabilizado.














Fonte: IBGE- Pesquisa Mensal do Comércio

Os resultados do comércio varejista no Brasil e em Sergipe, referentes ao 1º semestre, são muito bons e devem ser comemorados. A desaceleração do crescimento não vai embotar a expansão do comércio varejista em 2010, que deve fechar o ano em torno de 10%, e acima desse patamar no caso de Sergipe. Mas convém não olvidar que, nos últimos meses, as vendas do comércio jaó não crescem tanto como vinham crescendo no inicio do ano.

* Professor do Departamento de Economia da UFS
Publicado no Jornal da Cidade em 15 de agosto de 2010

O “Grau de Abertura” da economia sergipana

Uma questão nem sempre colocada de forma devida no debate econômico brasileiro é o peso do comércio exterior no desenvolvimento dos estados. O clima de euforia vigente nos anos noventa em relação à abertura comercial e à globalização concorreu para disseminar a idéia de que a evolução das vendas internacionais cumpriria papel determinante também para o crescimento das economias estaduais.

Bem, esse não é o caso para a maioria das unidades da federação, ainda que se deva reconhecer que alguns dos estados dentre os que têm apresentado maiores taxas de crescimento, a exemplo, do Mato Grosso, Maranhão e do Espírito Santo, encontraram no comércio externo uma importante fonte de expansão. O fato é que as unidades da federação têm diferentes tipos de articulação comercial com o exterior e com os demais estados e esse é um aspecto importante para entender as suas dinâmicas de crescimento.

Tomando por base o ano de 2007, o último para o qual estão disponíveis as estimativas de PIBs estaduais, o coeficiente de comércio exterior da economia brasileira se situa em 19,6%, o que significa que a soma das exportações e das importações daquele ano correspondia a cerca de 1/5 da riqueza gerada no país. Esse coeficiente é tido como representativo do grau de abertura externa de uma economia. Naquele mesmo ano de 2007, o grau de abertura da economia chinesa atingia o extraordinário índice de 61,7%, o que bem diz do papel do comércio internacional na sua expansão econômica. Já o coeficiente de exportações, que relaciona o montante das exportações com o PIB, em 2007, era de 10,9% para o Brasil. Esse coeficiente já foi bem inferior entre os anos sessenta e oitenta, quando a economia brasileira se mantinha mais fechada em relação ao comércio mundial.

Estados

Para alguns estados brasileiros, o comércio exterior tem grande significado na geração da riqueza em função de contarem com perfil produtivo orientado para exportações e/ou se constituírem em portas de entrada de mercadorias importadas para o país. O Espírito Santo é o campeão brasileiro em termos de grau de abertura. Em 2007, o fluxo comercial externo daquele estado correspondia a 40,6% do seu PIB. O estado do Amazonas, por conta da Zona Franca de Manaus, o Pará e o Maranhão, pelas exportações de minérios, e alguns estados com importantes complexos agroexportadores, como Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Paraná, registravam os mais elevados coeficientes do país. Entre os estados nordestinos, apenas o Maranhão (26,0) e a Bahia (21,2) contavam com grau de abertura superior a 20% do PIB em 2007.

Em relação ao coeficiente de exportações, os estados especializados na produção de grãos ou de minérios de ferro/siderurgia são aqueles que se apresentam mais orientados para os mercados externos, a exemplo do Pará, Mato Grosso, Espírito Santo e Rio Grande do Sul. Estado de grande densidade produtiva, como São Paulo, e/ou de forte base minero/metalúrgica, como Minas Gerais, contam com coeficientes de exportações acima da média brasileira.

Sergipe

A situação de Sergipe é bem diversa. Os setores industriais e agrícolas mais expressivos da economia sergipana foram estruturados para atender a demanda interna, seja o mercado da própria região, seja o mercado do conjunto do país. A produção de petróleo e gás, de fertilizantes, e a mesmo a fabricação de cimento e das tradicionais indústrias de tecido têm no mercado interno brasileiro o seu destino principal.

Na verdade, alguns desses empreendimentos foram implementados com o objetivo de ocupar o lugar de produtos importados no abastecimento do mercado nacional, como os casos de produção de fertilizantes e de petróleo. O mercado externo tem sido prioritário em Sergipe para as atividades de produção de sucos concentrados e de alguns produtos metalúrgicos, além de ter importante significado, é importante reconhecer, para as indústrias do açúcar, cimento, calçados e tecidos.
Em 2007, o fluxo de comercio exterior sergipano correspondia a 3,1% do PIB e as exportações se limitavam a 1,55%. Esses indicadores confirmam que o comércio exterior não tem se constituído no motor do desenvolvimento sergipano, o que não tem impedido o PIB de Sergipe crescer, sistematicamente, acima das médias brasileira e nordestina.

O baixo grau de abertura externa, todavia, não significa que a economia sergipana sofra de problema de introspecção ou de isolamento. Estudo do BNDES em cooperação com o Departamento de Economia da Universidade Federal de Sergipe, ainda inédito, auxilia a iluminar essa questão. No ano de 2006, dos fluxos comerciais da economia sergipana com agentes de fora do Estado, 97,6% eram realizados com os demais estados da federação e tão somente 2,4% com o exterior. As proporções das vendas e das compras efetuadas pelas empresas sergipanas mantinham perfis semelhantes, em termos agregados. As compras interestaduais de Sergipe representavam 97,4% do total e as vendas interestaduais, 97,8%, cabendo tão somente 2,6% e 2,2%, respectivamente, para as transações externas. (Ver Gráfico).

O estudo revela ainda que a integração de Sergipe com a economia do Nordeste é intensa. Em 2006, 53,4% das compras interestaduais e 55,9% das vendas interestaduais de Sergipe foram efetuadas com os demais estados da região. Individualmente, os maiores parceiros sergipanos são a Bahia, São Paulo, Pernambuco e Alagoas, ainda que Minas Gerais, Rio de Janeiro e Goiás apresentem participações expressivas.













Fonte: BNDES.

O processo histórico, através do qual se estruturou a economia sergipana, condiciona a sua atual forma de articulação externa e interna. Em si, essa forma de articulação não é boa nem má. Tampouco é um círculo de ferro que a aprisione. Ela foi diferente no passado e pode ser alterada, mas isso depende de mudanças estruturais de longo prazo. Por outro lado, indicadores agregados como grau de abertura ou coeficiente de exportações não devem impressionar as empresas que buscam uma maior inserção externa. Alcançar maior participação no mercado exterior é uma meta desejável e deve ser perseguida por que abre novas oportunidades de expansão de negócios e de aprendizagem tecnológica e comercial para as empresas sergipanas.

Ricardo Lacerda
Professor do Departamento de Economia da UFS e Assessor Econômico do Governo de Sergipe
Publicado no Jornal da Cidade em 04 de abril de 2010.

domingo, 8 de agosto de 2010

A desaceleração do PIB no 2º trimestre e a taxa de juros

Ricardo Lacerda*

No inicio de 2009, em resposta à crise de confiança que se estabelecia e ameaçava paralisar a economia brasileira, o Conselho de Política Monetária- Copom, do Banco Central, deu inicio a uma série de cinco reduções da taxa de juros básica da economia, a Taxa Selic, trazendo-a do patamar de 13,75%, em que se posicionava desde setembro de 2008, até atingir a taxa de 8,75%, o menor nível desde que foi instituído o regime de metas de inflação no País.

Ao lado de outras medidas importantes, como a expansão dos empréstimos dos bancos oficiais, redução do depósito compulsório dos bancos, isenção de IPI para bens de consumo duráveis, manutenção da política de elevação do salário mínimo, entre outras, logrou-se reverter, em relativamente pouco tempo, o cenário de uma situação de pânico para uma rápida recuperação da economia. No segundo trimestre de 2009, o nível de atividade interna já ensaiava os primeiros passos da recuperação econômica, o que culminou com o excepcional resultado do PIB do 1º trimestre de 2010. Em crises agudas, não se pode esperar por sintonia fina. O remédio tem que ser forte.

A pressão de demanda

Com o aquecimento da economia, inverteu-se a preocupação das autoridades econômicas. A elevação do IPCA no inicio do ano, em grande parte por fatores climáticos associados às chuvas no Sudeste, e diversas indicações de pressão de demanda, levaram o Copom a promover três elevações sucessivas da taxa básica da economia, 0,75 pontos percentuais em abril, 0,75 pp, em junho, e 0,50 pp na última reunião, em julho, elevando a taxa básica para os atuais 10,75%. Ver gráfico 1.


O aumento de 2,7% do PIB brasileiro do 1º trimestre de 2010, na comparação com o 4º trimestre de 2009, na série livre dos efeitos sazonais, apontando para um crescimento anualizado acima de 10%, fez acender o sinal de alerta das autoridades econômicas. Com a supressão dos incentivos ao consumo e as sucessivas elevações das taxas de juros básicas, a economia brasileira perdeu ritmo no 2º trimestre. As projeções atuais são de crescimento em torno de 0.5%, também na série livre de efeitos sazonais. Não há motivo para alarme. Na verdade, trata-se de um ajuste de trajetória frente a uma expansão excessiva do 1º trimestre. Quando o mercado está muito aquecido, manter o mesmo nível de atividade, em um patamar elevado, não é, em algumas situações, um mau resultado.

Alguns analistas prevêem estabilização do nível de atividade, descontando os efeitos sazonais de aquecimento normais da segunda metade do ano, também no 3º trimestre, com a retomada do crescimento acontecendo apenas no último trimestre do ano. Com isso, o PIB de 2010 deverá crescer em torno de 7%, um pouco mais, um pouco menos.

Alguns indicadores são curiosos. O IEDI, Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial, assinala que o movimento de veículos pesados nas estradas brasileiras, considerado um indicador abrangente do nível de atividade, caiu 0,4%, na comparação entre o segundo e o primeiro trimestre, com dados dessazonalizados.

Atividade regional

A desaceleração da atividade econômica não tem sido uniforme para todas as regiões. O Boletim Regional do Banco Central de julho de 2010, publicada nessa semana, revela que a economia nordestina manteve crescimento acelerado no trimestre março a maio de 2010. (Ver em http://www.bcb.gov.br/pec/boletimregional/port/2010/07/br201007c6p.pdf).
O relatório do Banco Central assinala que a desaceleração da economia a partir do 2º trimestre atingiu todas as regiões do país, com a exceção do Nordeste. No trimestre referente aos meses de março a maio de 2010, o Índice de Atividade do Banco Central- IBC registrou crescimento de 1,4% para o a economia brasileira, frente aos 3,2% no período de dezembro de 2009 a fevereiro de 2010. Enquanto o IBC de junho não se torna disponível, análises internas do Ministério da Fazenda apontam para um crescimento de 0,7% no segundo trimestre (abr-jun), em relação ao 1º trimestre.

A economia do Nordeste, por sua vez, manteve-se aquecida no trimestre mar-mai, com crescimento de 3,3% em relação ao trimestre anterior. As demais regiões desaceleraram fortemente. A economia da região sul cresceu 1,8%; o Centro-Oeste, 1,4%; o Norte, 1,6% e o Sudeste 1,3%. Ver gráfico 2. O relatório do BC lembra que o dinamismo da economia nordestina se traduziu no crescimento de 12,7% nos últimos doze meses encerrados em maio em relação a igual período anterior, de acordo com o IBC.


Um dos fatores da desaceleração da economia brasileira no trimestre mar-mai foi o comportamento do consumo doméstico, que havia registrado crescimento 2,9% no trimestre anterior e retraiu-se para 2,4% no último período.
A elevação da Selic e a retirada dos incentivos ao consumo adotados no auge da crise já estão se fazendo sentir na desaceleração do nível de atividade econômica com indicações de reduzido crescimento no segundo e no terceiro trimestres. Ainda que a elevação do PIB de 2010 em torno de 7% já esteja assegurada é importante sinalizar positivamente para que consumidores e empresários mantenham a confiança em relação à continuidade do crescimento. Já não seria a hora de parar com a elevação da taxa de juros? Não é hora da sintonia fina funcionar?
* Professor do Departamento de Economia da UFS e Assessor Econômico do Governo de Sergipe.
Publicado no Jornal da Cidade em 08 de agosto de 2010

O Nordeste no Atual Ciclo Industrial

Um aspecto significativo em relação aos efeitos da crise econômica recente sobre o Nordeste decorre do grau de integração da economia da região ao restante da economia nacional, que faz com que a evolução econômica regional esteja fortemente associada à dinâmica de crescimento da economia brasileira.
No ciclo atual, tanto na fase da crise quanto na de recuperação, a economia do Nordeste acompanhou de perto a trajetória do conjunto da economia nacional. Enquanto as taxas de crescimento dos países ditos em desenvolvimento, como Brasil, Índia e China, até certo ponto, “descolaram” da forte queda de 2009 e da débil recuperação das economias avançadas em 2010, nas relações internas, as taxas de crescimento das regiões mantiveram certo grau de alinhamento.

Soldagem

Para o economista Leonardo Guimarães Neto, nos últimos 40 anos operou-se uma “soldagem” da economia nordestina ao centro econômico brasileiro que ajustou a dinâmica da região aos movimentos cíclicos da economia nacional. O caráter solidário da trajetória da economia nordestina ao conjunto do país é particularmente forte nas atividades industriais. Vale a pena passar uma vista no gráfico abaixo, que retrata as taxas de crescimento da produção da indústria de transformação do Brasil (linha contínua simples), de São Paulo (linha tracejada) e do Nordeste (linha continua dupla), desde janeiro de 2002. Não é difícil perceber que seguem uma trajetória muito semelhante.

Uma característica persistente em quase todo o período é a de que os ciclos de expansão e retração da economia nordestina são mais atenuados (ou menos agudos) do que os da média da economia brasileira ou os do Estado de São Paulo. Assim, a produção industrial do Nordeste, representada no gráfico pela linha contínua dupla, apresentou taxas acima da média brasileira (e da taxa de São Paulo) quando o Brasil estava desacelerando o seu crescimento, e abaixo dessas taxas quando o Brasil voltava a expandir em termos anuais a taxa de crescimento da produção industrial. A exceção são alguns meses do ano de 2003, durante um mini-ciclo expansivo, quando a taxa de crescimento da produção industrial do Nordeste situou-se acima da média brasileira.

O ciclo atual

A produção da indústria de transformação brasileira iniciou nos primeiros meses de 2004, uma etapa relativamente longa de expansão que, apesar de alguma oscilação, perdurou até o estouro da crise financeira internacional em setembro de 2008. Com o advento da crise internacional, a produção industrial brasileira declinou rapidamente e, apesar de diferentes respostas de cada um dos setores, o conjunto da indústria de transformação somente iniciou uma retomada consistente a partir do segundo semestre de 2009, observando-se a comparação com igual mês do ano anterior.
A produção indústria nordestina entrou em crise no mesmo momento que o conjunto da economia brasileira, impactada que foi pela reversão abrupta do cenário mundial e pela instalação da crise de confiança no país. O movimento declinante da produção industrial nordestina, todavia, foi bem mais atenuado do que o da média da economia brasileira e o de São Paulo. No ponto mais baixo da curva de crescimento, a produção industrial anualizada do Nordeste havia se retraído 7,56% (setembro de 2009), enquanto o conjunto da produção industrial brasileira, na mesma série, chegou a recuar 10,49%, e a de São Paulo, 11,1% (ambas em outubro de 2009).
Na etapa atual, de rápida aceleração do crescimento da produção industrial, as taxas do Brasil e de São Paulo voltam a se apresentar mais elevadas do que a do Nordeste, confirmando a prevalecência desse tipo de relação.
A crise atingiu todos os segmentos da indústria, ainda que os impactos sobre os setores de bens intermediários e de consumo duráveis como produtos químicos e materiais e equipamentos elétricos tenham sido mais acentuados. Em dezembro de 2008, a produção física da indústria de transformação nordestina havia caído 10,17% na comparação com dezembro de 2007. Os setores químicos, de materiais e equipamentos elétricos e Têxtil sofreram as maiores retração nesse momento. Em junho de 2009, o recuo da indústria de transformação, na comparação com o mesmo mês de 2008, se limitava a 2,9%, em fevereiro de 2010, a produção industrial do Nordeste já se situava 11,61% do resultado de fevereiro de 2009, mostrando a força de sua recuperação.
O grau de integração econômica do Nordeste ao centro dinâmico economia brasileira tem oscilado ao longo do tempo e se deve muito ao predomínio do mercado interno na economia nacional. Na crise atual, o Nordeste conheceu um mergulho menos profundo e de menor duração. Na retomada, a distribuição dos projetos estruturantes no território nacional e a continuidade das políticas sociais compensatórias é que vão definir se a região poderá reduzir de forma consistente o hiato de desenvolvimento em relação aos pólos mais ricos e crescer acima da média do país.

Ricardo Lacerda
Professor do Departamento de Economia da UFS e Assessor Econômico do Governo de Sergipe.
Publicado no Jornal da Cidade em 09 de maio 2010

domingo, 1 de agosto de 2010

Parte 2- A geração de emprego na economia sergipana em 2010

Ricardo Lacerda*

Em março, estudo do IPEA estimou para 2010 a criação de 14.993 empregos formais na economia sergipana ao longo do ano. Para o setor industrial, incluindo a indústria extrativa mineral e a indústria de transformação, a projeção do IPEA era de geração de 2.966 novas vagas no mercado formal.
A estimativa do IPEA foi feita com base na relação entre PIB e emprego entre 2004 e 2008 e supunha, para 2010, um incremento do PIB de 5,5%. A estimativa, se confirmada, já configuraria resultados recordes para Sergipe, tanto na criação do emprego total, quanto no emprego industrial. (Ver em http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/comunicado/100310_comunicadoipea41.pdf).
Com a aceleração do crescimento econômico no Brasil no 1º trimestre de 2010, foram refeitas as estimativas de expansão do PIB para 2010, hoje projetada para um pouco acima de 7%. Com isso, os números, já muito favoráveis da análise do IPEA para a geração do emprego formal em Sergipe e certamente para outros estados da federação, se mostraram defasados. No período de 12 meses (jul/09 a jun/10) foram criados 18.860 empregos formais na economia sergipana, 25,8% acima da estimativa do IPEA.

Emprego Industrial

Os resultados do emprego industrial de Sergipe vêm superando com larga margem a projeção do IPEA. Entre julho de 2009 e junho de 2010, foram criados 4.282 empregos formais na indústria de transformação, além das 250 vagas na indústria extrativa mineral.
Assim, os resultados dos últimos 12 meses já se revelaram 52,8% superiores à estimativa para o agregado chamado de Indústria Geral. Como já foi assinalado no artigo anterior, nesse período, o emprego da indústria de transformação de Sergipe cresceu 12,42%, a mais elevada taxa de expansão entre os estados brasileiros. No gráfico 1, é possível observar a força da retomada na geração de emprego industrial de Sergipe, depois do momento mais difícil da crise financeira internacional.

A partir de junho de 2009, a série anualizada assumiu uma trajetória fortemente ascendente até culminar com os 4.282 empregos criados nos 12 meses encerrados em junho de 2010.

Subsetores

A expansão do emprego formal na indústria sergipana tem sido motivada por um conjunto de fatores, dentre os quais três se destacam: forte ciclo expansivo da economia brasileira, o crescimento diferenciado da economia do Nordeste em função da incorporação de novas faixas da população ao mercado de consumo e a instalação de novas indústrias no Estado, atraídas pela expansão do mercado regional e local.
Um dos aspectos mais favoráveis do crescimento do emprego do setor industrial de Sergipe nos últimos 12 meses tem sido a sua disseminação nos vários subsetores da atividade, estendendo-se, inclusive, a alguns segmentos que enfrentaram dificuldades no passado recente, como a cadeia têxtil-confecção que, no período, criou 597 novos postos de trabalho. Entre os 12 subsetores abrangidos, apenas o de papel e editorial não teve saldo positivo. Todos os 11 demais segmentos apresentaram taxas de crescimento de 7% ou mais nos últimos 12 meses, registrando, portanto, taxas superiores à media da indústria brasileira no período, de 6,7%. Ver gráfico 2.


O grande destaque, tanto em termos do número de empregos criados quanto da taxa de crescimento, foi a indústria de calçados que nos últimos 12 meses encerrados em junho, gerou 1.618 empregos, taxa de crescimento de 50,2%. Hoje Sergipe já conta com um polo calçadista expressivo, com unidades fabris em várias cidades do interior.

A expansão foi expressiva também na indústria de alimentos e bebidas, 690 novos empregos; minerais não metálicos, que inclui as cerâmicas e as fábricas de cimento, 320 empregos; química, farmacêuticos e plásticos, 300 empregos; couros, borracha e fumo, 199 empregos; indústrias mecânicas, 198 empregos; madeira e mobiliário, 189 empregos; e metalúrgicas, 130 empregos, além dos segmentos têxtil e de confecção, que viram a instalação de novas empresas no Estado. Ver gráfico 2.

A aceleração do crescimento industrial em Sergipe tem aberto novas oportunidades de criação de empregos, mas aumenta proporcionalmente os desafios de formação profissional para a indústria, em 2010 e nos próximos anos.

* Professor do Departamento de Economia da UFS
** Publicado no Jornal da Cidade em 01 de agosto de 2010

O PIB do 1º trimestre e a retomada dos investimentos

Ricardo Lacerda*

O IEDI é o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial, uma instituição dedicada à análise e à elaboração de propostas para o desenvolvimento industrial do País. (www.iedi.org.br). Em sua carta de 11 de junho, o IEDI destacou que “o ponto mais positivo da retomada em curso é, sem dúvida, a expansão da FBCF”. A FBCF é a sigla para Formação Bruta de Capital Fixo, os investimentos em máquina, equipamentos e edificações realizados tanto pelo setor privado quanto pelo governo. A evolução favorável dos investimentos é fundamental para que o país tenha um crescimento sustentado, ampliando a capacidade produtiva existente de forma a atender a expansão que estamos vivenciando no mercado consumidor.
No presente artigo se examina como os investimentos evoluíram nos últimos anos, destacando o seu papel no ciclo expansivo que a economia brasileira vem conhecendo desde o final do ano de 2003 e o impacto que sofreu no momento mais crítico da crise financeira internacional.

Sob a ótica da despesa, o item mais importante na formação do PIB do Brasil é o consumo das famílias que respondeu, em 2009, por 62,8 % de todos os gastos da economia. O consumo da administração pública somou 20,8 % e os investimentos em capital fixo representaram 16,7% do total. Esses números são importantes e ajudam a entender como o estímulo ao consumo durante o auge da crise de confiança no final de 2008 foi a decisão mais acertada para impedir que a economia naufragasse. Em 2007, antes da crise, o consumo das famílias respondeu por 59,9% dos dispêndios.

O Ciclo

O atual ciclo de expansão da economia brasileira teve inicio ainda no 3º trimestre de 2003. O gráfico 1 apresenta a evolução trimestral do PIB pela ótica das despesas desde então até o 1º trimestre de 2010, na serie livre de efeitos sazonais.

Nesse período, o consumo da família cresceu 43%. O consumo da administração pública, 24%. Os investimentos, medidos pela Formação Bruta de Capital Fixo- FBCF aumentaram 77% e o PIB a preço de mercado, 35%. Ou seja, o consumo da família e a FBCF cresceram mais do que o PIB do período, enquanto o consumo do governo evoluiu abaixo. O gráfico mostra também que as exportações de bens e serviços, que vinham contribuindo significativamente para o crescimento do PIB até o 4º trimestre de 200, reduziram sua contribuição a partir desse momento, muito em função da valorização da nossa moeda e, em menor parte, em função do redirecionamento da produção para o mercado interno. Esses mesmos fatores, por outro lado, têm provocado uma forte aceleração nas importações de bens e serviços que, no período, cresceram 129%, na série livre de efeitos sazonais.



No momento mais crítico da crise financeira, o último trimestre de 2008 e o primeiro de 2009, marcado pela forte instabilidade e pela crise de confiança, as empresas paralisaram os investimentos e reduziram parcela de suas compras. Com isso, a FBCF e as importações tiveram recuo acentuado. No 4º trimestre de 2008, quando o PIB recuou 3,3%, os investimentos caíram em 9,7%, as importações 6,8% e as exportações, 3,3%. No primeiro trimestre de 2009, os investimentos, as exportações e as importações continuaram despencando, enquanto o consumo das famílias se estabilizou e o governo ampliou fortemente seus gastos, em 4,5%, com as políticas anticíclicas. Foram essas últimas variáveis que impediram que a economia mergulhasse na crise e que propiciaram um rápido processo de retomada do crescimento.

O investimento

No 1º trimestre de 2010, em que a economia cresceu 2,7% em relação ao período anterior e 9% na comparação com o 1º trimestre de 2009, os investimentos representaram 18% do PIB. Não é ainda um resultado fantástico, mas indica a recuperação da confiança das empresas no futuro da economia brasileira. O gráfico 2 apresenta a participação dos investimentos (FBCF) nos PIBs trimestrais, desde o início do ciclo expansivo no segundo semestre de 2003.



Até o final de 2006, a participação dos investimentos no PIB oscilou em torno de uma taxa de 16%, considerada baixa para assegurar um crescimento sustentado da economia em torno de 5%. A partir do inicio de 2007, todavia, a participação dos investimentos no PIB se tornou crescente, mudando para um patamar de 18%, tendo atingido, mesmo, imediatamente antes da crise, 20,1%. O gráfico 2 mostra também que, desde o segundo semestre de 2009, os investimentos reiniciaram sua trajetória de crescimento enquanto parcela do PIB, alcançando a já citada participação de 18% no 1º trimestre de 2010.

Os dados parecem mostrar que, impulsionados pelo crescimento do mercado interno, os investimentos estão voltando com força na economia brasileira. Não vai ser tão difícil retornar a participação de 20%, o que habilita um crescimento sustentável de 5% do PIB. A dificuldade maior, mostram os dados, tem sido o comportamento do comercio exterior.

*Professor do Departamento de Economia da UFS
**Publicado no Jornal da Cidade de 20 de junho de 2010